40 Anos – Terra de sonhos e de trabalho
O mês de outubro guarda um marco histórico para Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, pois neste mês, 40 anos atrás, foi oficializada a divisão dos dois estados. Escrever um artigo relatando como acompanhei a evolução de nosso Mato Grosso nesses 40 anos, foi o desafio que recebi do colega de profissão, jornalista Eduardo Gomes de Andrade, na manhã de sexta-feira, 6 de outubro, dia em que meu neto mais velho completou 11 anos de idade.
Debrucei-me para escrever o tal artigo e os pensamentos viajaram no tempo. As lembranças me levaram de volta ao Rio Grande do Sul, a infância na roça, a vida difícil de humildes agricultores que tiravam de um pequeno pedaço de terra o sustento da família, mas nunca deixavam de sonhar com um futuro melhor para os filhos.
Eu era apenas uma garota que “amava os Beatles e os Rolling Stones” quando ouvi falar em Mato Grosso pela primeira vez. Mato Grosso do Sul ainda não existia quando pequenos agricultores e pequenos empresários da região de Frederico Westphalen, norte do Rio Grande do Sul, começaram suas incursões para a região de Dourados. Eles carregavam o sonho de melhorar de vida e a bagagem recheada de amor e entusiasmo pelo trabalho, além de muita fé e esperança. Numa destas levas estavam alguns irmãos de minha mãe, e eu recordo a preocupação dos familiares com os que decidiram embarcar naquela viagem incerta para um mundo estranho e distante.
Era outubro de 1977 quando, no dia 11, o presidente Ernesto Geisel assinou a Lei Complementar nº 31 dividindo Mato Grosso e criando o estado de Mato Grosso do Sul. Nesta época, eu cursava o “Segundo Grau” e acompanhei a história da divisão com o interesse da estudante que já decidira que cursaria jornalismo, mas acompanhei também pelos relatos otimistas dos parentes radicados no novo estado, que receberam a divisão como um fator primordial para impulsionar o desenvolvimento.
Durante bastante tempo, o sentimento reinante em boa parte da população do ‘velho’ estado foi o de que para Mato Grosso restava o atraso, enquanto Mato Grosso do Sul exaltava sua pujança e perspectiva de crescimento.
Em novembro de 1981, eu já estava cursando Comunicação Social – Jornalismo, na Unisinos, em São Leopoldo (RS), e acompanhei pelos jornais e pela televisão a transferência das primeiras famílias do acampamento de Encruzilhada Natalino, em Ronda Alta (RS), para o Projeto Especial de Assentamento Lucas do Rio Verde. Para calar um problema social oriundo de conflito agrário, o governo federal, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), criou o projeto de assentamento no longínquo Mato Grosso. Lembro-me do comentário do meu pai ao assistir ao embarque das famílias pela televisão: “Para onde estão levando esses coitados!?”
Em 1984, meu pai seguiu a trilha dos “coitados” e migrou com a família – minha mãe, meus dois irmãos e minhas duas irmãs – para Lucas do Rio Verde. Em 1985, meu marido e eu seguimos a mesma trilha. Lembro que, ao chegarmos a Lucas do Rio Verde, o que encontramos foi um lugarejo de casinhas feias, que dava as costas para a BR-163. Ao descermos do ônibus, que chegou 12 horas depois do horário previsto, atolamos os pés nas poças de lama, pois era dezembro, chovia torrencialmente e as ruas eram de terra. Mesmo assim, nos encantamos pelo lugar, que respirava perspectiva de vida. Voltamos para o Rio Grande do Sul buscar a mudança e nos enraizamos em Lucas do Rio Verde, onde nasceram nossas três filhas, onde já nasceram três netos e onde concebemos, criamos e difundimos o Jornal Folha Verde, que já completou 31 anos de circulação em maio deste ano.
Voltando às lembranças do que era Lucas do Rio Verde: nos meses de seca, os pés afundavam na terra, e nas tardes de vento forte que formavam redemoinhos, o vilarejo ficava encoberto em espessa nuvem de poeira. Não havia energia elétrica, a água precisava ser retirada de poço com balde e corda e a comunicação com parentes se dava por meio de um posto telefônico em que se chegava a ficar 15 horas na fila aguardando completar uma ligação. Mas havia entre os moradores daquele lugarejo um sentimento que misturava fé, coragem, entusiasmo, determinação, e unia todos em torno de um desejo comum: construir um lugar bom para se viver.
E assim construiu-se Lucas do Rio Verde, sem muita ajuda de governos e políticos, mas com a força, trabalho, organização e participação de sua gente, liderada por empreendedores e gestores de visão.
Lucas do Rio Verde é hoje, sem dúvida, um dos melhores exemplos da evolução e desenvolvimento que Mato Grosso pode testemunhar nesses 40 anos. A divisão do estado impulsionou o desenvolvimento com a criação de uma nova fronteira agrícola que avançou rumo ao norte, dando origem a cidades prósperas no eixo e no entorno da BR-163.
Ainda há muito que se avançar, especialmente no tocante à infraestrutura e logística nessas regiões cuja produção agropecuária poderia gerar ainda mais riquezas. Há muitos desafios que Mato Grosso precisa vencer, na saúde, na educação, na segurança pública e mesmo na organização social e política. Mas estamos avançando. E a minha bela Lucas do Rio Verde, assim como Nova Mutum, Sorriso e tantas outras cidades desta vasta e promissora região do Nortão, estão, com certeza, dando suas contribuições a esses avanços.
Vera Terezinha Faccin Carpenedo – bacharel em Comunicação Social – Jornalismo, Especialista em Educação Popular, pós-graduada em Comunicação e Marketing, diretora do Jornal Folha Verde em Lucas do Rio Verde; autora do livro Gotas de Orvalho – Poesias e Crônicas; escreveu os livros De assentamento a um polo de desenvolvimento – uma história de cooperação, Sicredi Ouro Verde – 25 anos de cooperação, e Sicredi Norte MT/PA, 25 anos – uma epopeia cooperativista.
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