Série TRANSPARÊNCIA (24) – Professora cuiabana negra, Edna quer disputar o governo
Michel Temer presidente da República é golpe de Estado com apoio da mídia direitista, do baronato do agronegócio e a conivência do Judiciário. Lula é preso político. O PT deve procurar aliados de esquerda. As alianças petistas no passado, em Mato Grosso, que o colocaram nos governos de Blairo Maggi e Silval Barbosa não significa que o partido “era a noiva da vez”. Quem pensa assim é a professora da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) no campus de Cáceres, militante do Partido dos Trabalhadores há 30 anos e pré-candidata a governadora Edna Sampaio, que sente orgulho em dizer que é cuiabana “de ‘tchapa’ e ‘cruix’”, negra e que tem três filhos.
Pré-candidatura é um passo para disputar o governo, mas nenhum companheiro petista sabe qual rumo o partido tomará nas eleições em outubro, por conta de uma divisão interna que bota alguns, de um lado, defendendo coligação com o senador republicano Wellington Fagundes para governador, e outros que preferem candidatura partidária, se possível no mesmo palanque com o PCdoB.
Edna integra a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), que em tese deveria apoiar seu nome ao governo e que em sua essência tem professores ligados ao Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público (Sintep). Porém, nessa mesma esfera interna petista a cúpula “é Wellington desde criancinha”, a começar pelo deputado federal Ságuas Moraes, que politicamente é o principal nome do PT mato-grossense.
No próximo dia 28 os delegados do PT definirão qual rumo seguir. Até lá, as costuras continuarão, como acontece há algum tempo. Essas conversações também evidenciam a cara da divergência interna petista, mas não chegarão ao conhecimento público por serem travadas entre quatro paredes.
Verdadeiro exercício da articulação. Esse é bom rótulo para as conversações dos petistas. Edna revelou que na quarta-feira, 19, discutiu com a ex-reitora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Maria Lúcia Cavalli (PCdoB) a retomada da aliança tradicional que os manteve juntos nas últimas eleições mato-grossenses; a petista acrescentou que sua colega professora não bateu o martelo, mas que continua aberta ao diálogo. O quê da questão é que a mesma Maria Lúcia é cortejada eleitoralmente por Wellington (com as bênçãos de Ságuas) para que seja candidata ao Senado coligada com o PR que lançará seu senador ao governo.
Em política tudo se resolve depois de resolvido – sem redundância. Antes, nada vai além da especulação, mas Wellington participou do lançamento da pré-candidatura de Maria Lúcia ao Senado e propaga aos quatro cantos que estarão juntos em outubro. À fala do senador juntam-se vozes comunistas. O casório político do PR com o PCdoB está em vigor desde 2014, quando o professor universitário aposentado Manoel Motta foi eleito segundo suplente de Wellington. Não é preciso muito conhecimento político para se entender que em caso de eleição do senador ao governo, os comunistas subiriam da segunda para a primeira suplência no Senado.
Discurso afinado
Edna tem um discurso afinado com a CNB. Tive a oportunidade de entrevistá-la (foi quando a conheci) na quarta-feira, 19, no programa “Amplo, geral e irrestrito”, da TV Cuiabá canal 47 (ao vivo das 17 às 18 horas, de segunda a sexta-feira), ao lado de seu apresentador, Enock Cavalcanti – antigo militante petista. Avalio que seja dela a melhor oratória entre todos os pré-candidatos a cargos majoritários, não considerando seu conteúdo, mas somente a forma natural como se expressa.
O mundo de Edna choca com a tradição política mato-grossense e fere de morte seu principal pilar econômico, o agronegócio. Ela é crítica feroz daquilo que chama de ‘baronato’. Ácida contra a política de incentivos fiscais e a distribuição de renda, a pré-candidata petista, no entanto, não teve resposta ao questionamento que lhe fiz sobre a Lei Kandir, que desonera commodities agrícolas. Perguntei por que os presidentes Lula e Dilma não botaram o dedo naquela lei; Lula presidiu com ampla maioria no Congresso; e Dilma, até cair em desgraça (ou sofrer o golpe como sustenta Edna) também nadou de braçada entre senadores e deputados federais.
Os governantes e parlamentares mato-grossenses nos últimos anos são duramente criticados por Edna, que, no entanto, exclui Ságuas – segundo ela, o companheiro votou contra todos os projetos que prejudicariam ou tomariam direitos dos trabalhadores. Sua dura acusação contra tais políticos é quase genérica, mas nem tanto: Alexandre Cesar (exercendo mandato de deputado estadual petista) filmado recebendo pacotes de dinheiro de Sílvio Corrêa, então chefe de Gabinete do à época governador Silval Barbosa (2010/14), foi poupado. Alegando que não é ‘juíza’, ela preferiu transferir o caso ao Conselho de Ética petista, que até o momento não se pronunciou. As imagens de Alexandre foram exibidas pela Rede Globo em agosto de 2017 e ele aparece em situação idêntica a de outros parlamentares à época, dentre eles Ezequiel Fonseca (PP agora deputado federal), Emanuel Pinheiro (MDB e prefeito de Cuiabá), Luciane Bezerra (PV e prefeita de Juara), José Domingos Fraga (PSD), Hermínio Barreto (falecido) e outras figuras menores. Esse episódio é uma das páginas mais sujas da política mato-grossense. Silval em delação ao Ministério Público homologada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, sustentou que se tratava de pagamento de propina para que as obras dos projetos da Copa do Mundo e do programa rodoviário MT Integrado não fossem fiscalizadas pelos parlamentares.
Um dos principais dirigentes do PT, o médico Lúdio Cabral apoia o nome de Edna ao governo. Lúdio em 2012 disputou a prefeitura de Cuiabá numa chapa com o PMDB e o PR, tendo Teté Bezerra (PMDB, agora rebatizado MDB) de vice.
Além do nome de Edna ao governo, o partido também poderá concorrer ao Senado, uma vez que a professora aposentada da UFMT Enelinda Scala luta para ser homologada em convenção para essa disputa.
Ativo administrativo e social
Caso seja candidata, Edna terá um bom ativo administrativo e social petista para apresentar ao mato-grossense. Nos governos Lula e Dilma, criaram-se os programas “Minha Casa, Minha Vida” e “Luz para Todos”. Mato Grosso foi contemplado com um campus da UFMT em Sinop e a construção de unidades do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, além de escolas técnicas. O programa de transferência de renda
Esse ativo certamente estaria no discurso de Edna, mas muito além dele, sua grande meta é afastar de seu partido a pecha de criminalizado, em razão de acontecimentos envolvendo algumas de suas principais lideranças ou que estão presas ou à espera de julgamento. A pré-candidata lamenta essa situação observando que figuras de praticamente todos os partidos estão envolvidas em escândalos, sem que a mídia acuse o partido por eventuais crimes praticados por filiados, ao passo que sobre o PT são lançados os erros ou supostos erros de petistas.
PT em Mato Grosso
A estrutura do PT em Mato Grosso é modesta. O partido tem o deputado Ságuas Moraes na bancada federal e ocupa uma cadeira na Assembleia com Valdir Barranco, que tem base eleitoral em Nova Bandeirantes, onde foi prefeito. Sua principal prefeitura é a de Juína, no Chapadão do Parecis, que é administrada por Altir Peruzzo. Não há vereador pelo PT em Cuiabá.
Até recentemente o PT tinha duas cadeiras na Assembleia, mas Allan Kardec migrou para o PDT. Kardec chegou ao cargo no começo de janeiro de 2017 ocupando a cadeira de Emanuel Pinheiro (MDB), que em outubro do ano anterior foi eleito prefeito de Cuiabá. A posse de Kardec somente foi possível graças à coligação do Partido dos Trabalhadores com o MDB e o PR. Emanuel, o deputado sucedido, foi um dos filmados ao lado de Alexandre Cesar recebendo dinheiro do esquema Silval. Ainda sobre Emanuel, ao embolsar pacotes de dinheiro, um deles caiu do bolso de seu paletó, o que levou a sabedoria popular a apelidá-lo de ‘Paletó’.
Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes
FOTOS:
1- Eduardo Gomes
2 – Agência Brasil
3 – Sobre imagem da TV Globo
PS – Este é o 24º capítulo da Série TRANSPARÊNCIA sobre a disputa majoritária em Mato Grosso
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