Boa Midia

De duas vezes

Cidades arrasadas, Hiroshima e Nagasaki pulverizadas por ataques nucleares. Em 1945 a fome ronda o Japão. Governo distribui rações alimentares aos abrigos sociais. Ancião que perdeu toda a família na guerra, o abrigado senhor Yamada devolve parte de sua cota, para que o imperador a coma e tenha mais força para reerguer o Império do Sol Nascente. Aqui, se o mandatário não ficar esperto, alguém come a parte que lhe toca.

O exemplo de Yamada contrasta com o coletivo da cidadania brasileira. Somos o país dos direitos, mas desqualificamos deveres. Somos a terra da crítica, porém escamoteamos nossos erros. Com esse espírito, vamos às urnas caminhando sobre a terra que precisa das mudanças que se fazem necessárias e saltam aos nossos olhos.

Somos a nação de inflamados discursos contra a violência, cujos desabafos costumam ganhar a imprensa em textos comoventes, assinados por pai probo (ou zelosa mãe) que esconde a dependência da droga que dilacera seu filho e espalha rastros de sangue nas ruas e no campo.

Somos o povo crítico pelas mamatas do auxílio-moradia, do salário que não respeita teto constitucional e o acúmulo de aposentadorias. Ao mesmo tempo somos berço do empreguismo (nas câmaras, prefeituras, assembleias, governos, Congresso e tribunais) que incha a máquina pública e cria legiões de párias sociais engravatados ou com vestidos de grife, que nada fazem a não ser receber mensalmente com as bênçãos da Lei de Gerson.

Somos a base territorial do “Sindicato do Fulano” ou do “Fulano do Sindicato Tal”, da federação inútil, da cooperativa do golpe, da empresa de fachada. Também somos jurisdicionados da morosidade, da Justiça Eleitoral lenta e cara.

Somos dentes de uma engrenagem capitalista voraz na cobrança de impostos e que não assegura direito de propriedade. Somos peças do desmonte familiar do politicamente correto, da libertinagem que sufoca valores.

Somos reais vítimas do “suposto assassino” ou do assaltante contumaz que alegremente deixa o fórum após a audiência de custódia mantendo sua gloriosa tornozeleira eletrônica paga por nós.

Somos o povo crítico que reelegerá deputados flagrados recebendo propina, processados, com bens bloqueados. Somos a espécie humana que vê virtude no condenado Lula e no fútil Bolsonaro.

Somos assim, mas podemos mudar. Por isso tomo como exemplos o refrão do Hino da Proclamação da República: “Liberdade! Liberdade! /Abra as asas sobre nós…” e figuradamente a grandeza de Yamada. Peço a Deus que a mudança aconteça intimamente quebrando a corrente da falta de cidadania na amplitude de seu sentido, e externamente exorcizando os que erram duas vezes: no campo pessoal e na vida pública.

Eduardo Gomes de Andrade é jornalista

eduardogomes.ega@gmail.com

 

Também em:

 

midianews.com.br (CUIABÁ)

http://www.midianews.com.br/opiniao/de-duas-vezes/327090

 

diariodecuiaba.com.br (CUIABÁ)

http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=515991

 

Jornal Diário de Cuiabá edição 16 junho 2018 Pág.A2

 

folhamax.com.br (CUIABÁ)

http://www.folhamax.com/opiniao/de-duas-vezes/168606

 

1 comentário
  1. Eli Diz

    Show meu amigo Brigadeiro

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