Conversa com Selma, José Medeiros e Nelson Barbudo

Depois de um longo período de costas para a Bolívia, da qual se aproximava somente no campo ideológico por interesse dos governantes dos dois lados da fronteira, o Brasil ganha a oportunidade de se reaproximar daquele país. Para tanto, bastaria a criação de um Corredor Bioceânico ligando Santos ao Pacífico cruzando os territórios mato-grossense e boliviano.
Num pronunciamento neste sábado, 23, em Santiago, o presidente Sebastián Piñera ao lado do colega Jair Bolsonaro comemorou a integração de seu país com o Brasil pelo Corredor Bioceânico Atlântico-Pacífico que cruza Mato Grosso do Sul, Paraguai e Argentina. É preciso cobrar abertamente aos congressistas Selma Arruda (senadora), e José Medeiros e Nelson Barbudo (ambos deputados federais) um vigoroso posicionamento em defesa da materialização de idêntico Corredor, via Mato Grosso, em nome da integração continental por uma rota de interesse econômico mato-grossense.
O Corredor via Paraguai e Argentina é interessante para a economia do Sul, Sudeste e Mato Grosso do Sul. País quase continental o Brasil tem que ampliar seu sistema de transporte terrestre, fluvial e aéreo de modo a contemplar suas regiões. Mato Grosso por sua localização geográfica no centro da América do Sul enfrenta o contratempo do índice de continentalidade – indicador que mede a distância da lavoura ao porto. Em função disso, sua economia tem que encontrar saídas regionais, a exemplo de Itaituba, que contempla o Nortão; São Luís, que interessa ao Araguaia; Rumo ALL que escoa boa parte da safra do polo de Rondonópolis para o porto de Santos; Sapezal que é a referência do pool que embarca grãos para o sistema rodo-hidroviário para Itacoatiara; e a BR-163 no sentido Sul, que desemboca no porto de Paranaguá. A região da fronteira, que tem Cáceres por referência, conta com a Hidrovia do Mercosul, com 3.342 quilômetros até Nueva Palmira, no litoral, mas é desprovida de um porto compatível com a demanda da exportação de commodities; a bicentenária Cáceres tem ainda o Corredor Bioceânico, para chegar ao Pacífico, mas falta a conclusão de sua pavimentação na Bolívia e desembaraços de reserva de mercado naquele país com o qual Mato Grosso tem 983 quilômetros de fronteira.
Por que conversar com a senadora e os dois deputados sobre a necessidade de se concluir, o mais rápido possível, o Corredor Bioceânico por Mato Grosso? Além de congressistas que nos representam os três carregam o DNA das urnas do presidente da República. Em 2018 o mato-grossense queria eleger Bolsonaro, de tal modo, que essa manifestação refletia positivamente nos candidatos que compunham sua aliança política. Nelson Barbudo literalmente viralizou na internet com seu discurso bolsonariano e disparou na votação – sem Bolsonaro não teria a mínima chance de ser deputado. José Medeiros rompeu politicamente com o governador Pedro Taques, do qual herdou a vaga no Senado na condição de seu suplente; sobrou para ele o discurso de fidelidade ao Capitão e essa identificação o levou para a Câmara. Selma teria até condições de ser eleita, por seu desempenho na magistratura, mas nas urnas virou fenômeno e sua chapa foi a mais votada para o cargo. Três congressistas com essa identificação com o presidente são suficientemente fortes para convencê-lo a determinar ao BNDES que financie na Bolívia a obra de pavimentação necessária ao Corredor.
Na Bolívia há opção de rotas para o Corredor. O Brasil não deve sugerir e muito menos impor traçado. O governo boliviano certamente optará pelo que melhor lhe convier, pois além de atender interesses brasileiros, chilenos e peruanos, essa ligação continental tem que contemplar os hermanos bolivianos.
Os ex-presidentes Lula e Dilma colocaram o BNDES a serviço ideológico de governos com os quais comungavam propósitos. Bolsonaro precisa superar ideologias e vê na Bolívia um dos bons caminhos ao desenvolvimento de parte de Mato Grosso.
Costurada a pavimentação do lado boliviano, num trecho que independentemente da opção de rota será sempre inferior a 500 quilômetros, o Corredor dará importante passo. Na sequência ou paralelamente a obra, é preciso alinhavar um acordo para que a COB – a central operária deles, nos moldes da CUT – abra mão da reserva de mercado do volante para bolivianos, para que motoristas de todas as nações possam cruzar a Bolívia nos dois sentidos.
O Corredor por Mato Grosso será o caminho natural para commodites mato-grossenses da região de Cáceres chegarem aos portos do Norte chileno e do Sul peruano, o que encurta consideravelmente a distância a importadores asiáticos e africanos. Não se trata de rota de sentido único. Em direção oposta há uma gama de produtos que podem ser trazidos. Além disso, ao longo do Corredor há um grande mercado vocacionado à espera de colchões, refrigerantes, equipamentos agrícolas, cerveja, esquadrias, móveis, frutas tropicais, arroz, feijão, milho, óleo de soja, carne suína e bovina, aves congeladas e outros itens industriais e agrícolas.
Pelo caminho, no Corredor, os povos da América por ele contemplado terão ingredientes de sobra para o fortalecimento de seus laços culturais e aproveitamento de seus roteiros turísticos no Lago Titicaca, no rio Paraguai e em tantos outros pontos.
Aos três congressistas é importante acrescentar que o Corredor não seria somente uma rota para commodites em escala. Há oportunidade de negócios por onde se olhe nessa rota sul-americana. Em Tacna, Ilo e Arequipa, no Peru, e em Iquique, Arica e Chacalluta, no Chile, avicultores enfrentam sério problema: as aves para o abate são alimentadas com ração de pescado do Pacífico – e ficam impregnadas com cheiro de peixe. Esse segmento sonha acordado com o milho brasileiro, no caso, mato-grossense ou mais ainda, do polo de Cáceres, para substituir o trato em seus aviários.
O clima de lua de mel diplomática de Santiago e Brasília tem que irradiar sentimento de unidade continental aos bolivianos liderado por Evo Morales. O Brasil tem interessante ferramenta em mãos para cativar La Paz: pavimentar um bom trecho de carretera em seu território.
Amizade é o grande identificador dos mato-grossenses que vivem na fronteira e seus vizinhos bolivianos. Dois dois lados há famílias ecléticas de brasilianos e bolivieiros – a fusão dos povos. O Corredor fortaleceria ainda mais esse elo e o interiorizaria em ambos os países.
Além do fator econômico e do apelo social, o Corredor seria interessante forma de aumentar a presença do Estado nos dois lados da fronteira, o que reduziria a atuação dos crimes transnacionais ligados ao narcotráfico.
Finalmente, aos três congressistas: Mato Grosso tem dois políticos muito respeitados na Bolívia e ambos residem em Cáceres. São os irmãos Lacerda – Márcio e José, o Zezinho; o primeiro foi deputado estadual, deputado federal, senador e vice-governador, e o outro, vice-prefeito de Cáceres, deputado estadual e secretário de Estado. Ambos gozam de prestigio no país vizinho, a tal ponto, que a rodovia que liga San Matias a fronteira com o Brasil, em Corixa, município de Cáceres, recebeu o nome de Tramo Hermanos Lacerda. Seria interessante a participação dos Lacerda nas negociações com La Paz.
Que a senadora Selma e os deputados Nelson Barbudo e José Medeiros reflitam sobre esse texto. Os três podem prestar relevante serviço a Mato Grosso com o Corredor e antecipar a chegada do desenvolvimento a região de Cáceres, cidade que desde seus primórdios sempre se caracterizou por suas ligações internacionais feitas pelo rio Paraguai, que banha a Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai.
Eduardo Gomes – editor de blogdoeduardogomes
FOTO: Agência Brasil
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