Selma Arruda, Nelson Barbudo e o Duque de Wellington

Nenhuma eleição mato-grossense foi isenta do tristemente famoso caixa 2. A mistura da safadeza de políticos e eleitores resulta no mercado da compra de votos. Durante décadas a dentadura foi dos símbolos dessa vergonha, mas esse crime aperfeiçoou de tal forma que hoje permeia relação de empreiteiras com o poder, nomeações para cargos dourados etc. Estamos diante das cadeiras ainda quentes do pleno do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), que em 10 deste abril cassou a chapa partidária encabeçada pela juíza aposentada Selma Rosane de Arruda (PSL), que venceu a eleição ao Senado em 2018. O começo do calvário judicial eleitoral de Selma Arruda e sua suplência nos remete a duas situações: o por fora e a batalha de Waterloo.
Em decisão unânime e até certo ponto entusiasmada o TRE cassou a chapa de Selma Arruda pelos crimes de caixa 2 e abuso de poder econômico condenando-a, também a inelegibilidade por oito anos. O entusiasmo não foi colegiado, é bom que se registre em respeito ao Tribunal: foi monocrático, pois o relator da ação, desembargador Pedro Sakamoto, propôs que o terceiro candidato mais votado ao cargo – os dois primeiros foram eleitos – Carlos Fávaro (PSD) assumisse o Senado até a realização de eleição suplementar, diplomação e posse do eleito.

Abro parêntese para destacar que Sakamoto tentou criar a figura do senador interino. Até então, por Mato Grosso, tivemos senadores eleitos e biônicos.
Fechado o parêntese voltemos aos dois temas centrais.
A cassação de Selma Arruda terá desdobramento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) onde a mesma poderá se defender sem atropelo processual e sem aquilo que ela em outras palavra definiu como fuzilamento premeditado.
Não entro no mérito da decisão colegiada do TRE, mas entendo e avalio que se ao longo da campanha a Justiça Eleitoral tivesse fiscalizado os pontos nevrálgicos dos gastos eleitorais, dificilmente os integrantes da bancada federal eleita e o a chapa do governador Mauro Mendes (DEM) seriam diplomados. blogdoeduardogomes denunciou e alertou várias vezes o festival dos voos transportando candidatos, as agendas casadas do governador Pedro Taques (PSDB) com sua candidatura à releição etc.
Morto rei, viva o rei. Essa máxima boçal é bem Mato Grosso. Estamos na fase embrionária da ação que pede a cassação da chapa de Selma Arruda, e ao mesmo tempo vendo o alvoroço de Carlos Fávaro (DEM), Nilson Leitão (PSDB), Júlio Campos (DEM), Adilton Sachetti (PRB), Nelson Barbudo (PSL) e figuras do baixo clero em busca da cadeira no Senado, que é ocupada legitimamente por sua titular, campeã nas urnas em 2018.
Ver a manifestação de Fávaro, Leitão, Júlio Campos e Adilton não é algo surpreendente. Os quatro são profissionais da política; Fávaro, antes de seu único mandato eletivo, de vice-governador, foi sindicalista patronal, que em tese e por analogia também é exercício político. O diferente nesse contexto é ouvir o deputado federal Nelson Barbudo (PSL) empunhar a bandeira de sua candidatura ao Senado. Barbudo foi o candidato mais votado ao seu cargo em 2018, não por mérito, qualidade ou desempenho político: nunca exerceu cargo eletivo – gravitou na sombra de Jair Bolsonaro, como figura folclórica nas redes sociais. Antes dele, tivemos votos de protesto para o Cacareco, o Macaco Tião etc.

O profissionalismo político não respeita ética. Barbudo, que nem profissional político é, fere a ética partidária, finge desconhecer que o mandato caiu em seu colo graças a Bolsonaro. O deputado da bancada situacionista sequer parou para avaliar que ao contrário dele, na campanha, Selma Arruda tinha luz própria, carregava o DNA da magistrada honrada que mandou para a cadeia boa parte da corja corrupta mato-grossense. É preciso reconhecer que Bolsonaro influenciou na eleição da juíza aposentada, mas é bom que se tenha em mente que o Capitão – como seus liderados o chamam – foi químico ao transformar o anônimo chapeludo em depurado federal.
De Mato Grosso no agora para a Béligica em 18 de junho de 1814, mais precisamente na grande batalha de Waterloo: Napoleão Bonaparte ficou ao alcance da arma do britânico Arthur Wellesley, o Duque de Wellington. Um oficial mostrou ao nobre que o líder francês estava na sua linha de tiro e pediu: “mata, mata, mata“. A resposta mostrou a grandeza do inimigo de Napoleão, “general não atira em general“.
Derrotado, Napoleão foi exilado na ilha de Santa Helena, onde morreu em 1821.
Na aridez moral, política, cidadã e partidária em Mato Grosso é preciso que se faça uma ressalva: Taques, derrotado na tentativa de reeleição e nome natural do tucanato para uma eventual eleição suplementar ao Senado, não se deixou medir pela régua de Fávaro, Leitão, Júlio Campos, Adilton e – principalmente, Nelson Barbudo. Questionado sobre disputa ao Senado, Taques foi taxativo – “não me cabe discutir herança de pessoa viva“.
Em síntese: o tempo passa e nele o ser humano tem oportunidade de optar entre a dignidade e ser indigno, tanto em Waterloo quanto em Mato Grosso.
Eduardo Gomes de Andrade – editor de blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – Agência Senado
2 – Youtube
3 – Internet
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