Boa Midia

Um questionável santuário de elefantes

Memória de elefante não é um simples ditado popular, pois o pesadão paquiderme de origem africana e asiática jamais esquece. E o que deve passar nesse momento pelas cabeças de Maia e Rana, confinadas ao largo no Santuário de Elefantes Brasil (SEB), na mística Chapada dos Guimarães. Claro que se soubessem falar, gritariam: estamos livres dos maus-tratos, mas aqui não é o lugar ideal para nós!

Lugar calmo, com área de 1.540 hectares – ou como os ecologistas gostam de dizer: do tamanho de 1.540 campos de futebol. Assim é a área do SEB, uma organização não governamental sem fim lucrativo – é meio redundante, mas é assim sua apresentação. Essa ONG é controlada pela Global Sanctuary for Elephants (GSE) e a Elephants Voices instaladas nos Estados Unidos e presidida pelo americano especialista em elefantes Scott Blais, secundado por sua mulher e veterinária Keith.

Insistindo que se os elefantes falassem, as duas ocupantes do SEB diriam que saíram do inferno nos circos, onde eram submetidas a maus-tratos, e que se encontram num lugar de desconforto, que não é seu habitat natural.

As duas são asiáticas e ao invés de serem levadas para Chapada, deveriam ter sido enviadas para a Ásia, de onde foram levadas para cativeiro em circos. Naquele continente há santuários para elefantes, que são muito próximos da vida na selva. Na Tailândia, em 2002, a rainha Sirikit criou a Elephant Reintroduction Foundation, que devolve à natureza elefantes resgatados de cativeiros, a exemplo de Maia e Rana.

O custeio do SEB, ora com dois exemplares, é elevado e a ONG se sustenta com doações internacionais e de brasileiros. Ao invés do santuário em Chapada, o ideal seria resgatar elefantes na América do Sul (objetivo do SEB) e enviá-los diretamente para seus lugares de origem na Ásia e África. O custo seria somente o transporte e a logística para a transferência.

O SEB foi criado em 2017, tem capacidade para 50 animais.  O ambiente é muito melhor do que o cativeiro circense, mas a vegetação, o clima e as demais espécies animais são diferentes da Ásia e da África. A situação de  Maia e Rana transportada para o ser humano inocente, numa ampla visão sobre liberdade, seria algo como retirar o prisioneiro de uma cela minúscula e insalubre, e mantê-lo preso numa estrutura carcerária mais ampla, mas sem perspectiva de livrá-lo da unidade prisional.

A intenção da ONG dos elefantes em Chapada pode ser a melhor possível, mas sua prática é questionável e deveria ser objeto de análise aprofundada pelo Ministério Público, Assembleia Legislativa, Governo de Mato Grosso e a prefeitura do município.

Certamente se soubessem falar e se fossem perguntadas, Maia e Rana concordariam de imediato com a proposta de levá-las ao seu lugar de origem.

A gigantesca Ramba
A gigantesca Ramba

MAIS UMA – Em 18 de outubro o SEB ganhou nova moradora: Ramba, que acumulou  sofrimento de picadeiro em picadeiro, no Chile, onde por último atuou no Circo Los Tachuelas – o maioral daquele país andino – até ser resgatada pelo Serviço Agrícola e Pecuário chileno.

Ramba sofria de problemas renais e morreu em 26 deste dezembro. No SEB permanecem Maia e Rana.

Ramba foi trazida de voo para o Aeroporto Internacional Viracopos, em  Campinas (SP). De caminhão chegou ao seu desstino numa viagem tranquila. Mas, para seu desembarque primeiro foi preciso vencer aa voracidade tributária do Governo de Mauro Mendes (DEM), que por pouco não criou um embaraço sem tamanho. O Estado queria lançar R$ 50 mil em Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre sua entrada em Mato Grosso. A sede tributária foi contida graças a uma liminar concedida ao SBE pelo juiz da 1ª Vara Cível de Chapada dos Guimarães, Leonísio Salles de Abreu Júnior.

GUIDA – Confinada antiga no SEB, desde outubro de 2016, quando ali chegou,  a elefanta Guida dividia espaço com Maia e Rana. Em 24 de junho, ela morreu. Quase quatro meses depois as duas remanescentes ganharam a companhia de Ramba, que agora também as deixou.

Sem Guida e Ramba, agora Maia e Rana,  juntas, permanecem mantidas num ambiente natural diferente daquele onde nasceram. Trata-se de um custo elevado mantê-las naquele universo que sofre interferência com as estranhas habitantes. Está na hora de agir. Foi muito bom tirá-las dos circos, mas isso não basta. É imprescindível lhes conceder liberdade plena, muito além daquela do picadeiro ampliado onde estão confinadas.

Eduardo Gomes de Andrade – editor de blogdoeduardogomes

eduardogomes.ega@gmail.com

FOTO:

1 – Ilustrativa da série

2 – Reuters distribuída pela Agência Brasil em página de domínio público

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