De curva do tempo

Imaginem a população de uma cidade do tamanho de Tangará da Serra (103.750 habitantes) dizimada em pouco tempo, sem sequer ter direito a sepultamento digno. Essa, por enquanto, é a dimensão universal da pandemia do novo coronavírus, que começou no final de 2019, na China. Nessa Sexta-feira da Paixão, 10 de abril, o número de mortos pelo vírus chegou a 101.399 com 1.635.713 infectados. Nesse cenário 1.057 vítimas fatais são brasileiras sendo duas mato-grossenses.
A taxa de letalidade entre os brasileiros é de 5,4% e 19.638 testaram positivo para a doença, mas há milhares de exames à espera de resultado, o que pode elevar esse número a um patamar assustador.
Em Mato Grosso há 118 casos confirmados e duas mortes sendo uma em Lucas do Rio Verde e outra em Cáceres.
Os pacientes residem em 16 dos 141 municípios mato-grossenses: Cuiabá (60). Rondonópolis (12), Sinop (11), Várzea Grande (6), Tangará da Serra (5), Cáceres e Aripuanã (2 cada) e União do Sul, Primavera do Leste, Nova Mutum, Nova Monte Verde, Lucas do Rio Verde, Lambari D’Oeste, Canarana, Campo Novo do Parecis e Alta Floresta, com um caso cada; há três infectados residentes em outros estados, que testaram positivo em exames feitos em Rondonópolis, Chapada dos Guimarães e Pontes e Lacerda.
Tanto nacionalmente quanto em Mato Grosso as autoridades de saúde sustentam que o pico da doença acontecerá entre o final deste abril e começo de maio.

COMPARATIVO – O Brasil lutou na Segunda Guerra Mundial contra o nazismo. A Força Expedicionária Brasileira (FEB) enviou 25.700 homens e mulheres do Exército e Aeronáutica para os campos de batalha na Itália. Desse efetivo expedicionário, 471 não voltaram – deixaram seu sangue no solo em defesa dos ideais de liberdade; dentre esses heróis, seis eram mato-grossenses. O heroísmo febeano escrito com patriotismo e bravura foi escrito entre os anos de 1944 e 1945 enfrentando o poderoso Exército de Alemanha.
Os mato-grossenses que participaram da campanha na Itália viveram entre nós. Um a um foram se despedindo, vencidos pelo implácavel relógio biológico, Tive a felicidade de entrevistar vários heróis da FEB e, dentre eles, Feliciano Moreira da Costa, Gabriel de Souza Guimarães, Joaquim Sérgio dos Santos, Gabriel Ferreira de Jesus, Lício Gomes Ferreira Mendes, Samuel Infantino, Davino Leopoldino de França, Armindo Santana Dias. Rafael Fortunato de Campos, Mário Pinho de Arruda e Aleixo Marcelo Campos. Humildes, mas cientes do papel que desempenharam, todos se orgulhavam de seu passado.
Transcorridos mais de 74 anos dos feitos expedicionários na Segunda Guerra Mundial o Brasil presencia seu povo morrer vítima de um vírus, que em menos de três meses matou mais que o dobro dos nossos combatentes febeanos que tombaram na Itália. Esse número impressionante de mortes e de infectados ainda não conseguiu sensibilizar todos cidadãos – alguns, inclusive, teimam de desqualificar a pandemia.
Ontem, o inimigo foi vencido por conta da coragem dos pracinhas que saíram de suas casas para enfrentá-lo. Agora, em outro campo de batalha, sem armas e munição – segundo a comunidade médica internacional – o único meio de vencer a guerra em curso é sair do imaginário campo de batalha pela sobrevivência, no trabalho ou em busca dele, e se recolher – ficar em casa até que a tempestade cesse e novos ventos soprados por Deus nos devolvam a liberdade do ir e vir, sem risco
Em Mato Grosso, onde não há leitos nem unidades de terapia intensiva suficientes para atendimento em caso de aumento da doença; onde não há nem mesmo médico em algumas cidades; onde vários municípios não contam com hospitais; e onde faltam equipamentos de proteção individual, o comportamento social é muito semelhante ao que se vê Brasil afora – a irreverência sobre a situação.
O que nos espera na curva do tempo, com tanta indiferença social ao risco do novo coronavírus?
Eduardo Gomes de Andrade – jornalista
eduardogomes.ega@gmail.com
FOTOS:
1 – Prefeitura de Tangará da Serra – divulgaçã
2 – Geraldo Tavares
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