Boa Midia

Tresoitão mudou regra do pênalti

“É pênalti, sim, mas com barreira…” – essa foi a genial saída que o árbitro Ivan Marrekus encontrou num repente diante de um “trêsoitão” embalado, ao apitar um amistoso entre Cruzeiro e Ponte Preta, na comunidade rural de Bezerro Branco, habitada por migrantes de Minas Gerais e Espírito Santo, encravada nas furnas das serras das Araras e do Rio Paraguai entre Cáceres e  Barra do Bugres. As terras da área começaram a ser ocupadas em 1950, na administração do governador Fernando Correa da Costa.
Sem opções de lazer e diversão, a população de Bezerro Branco decidiu fundar um time de futebol para animar as tardes de domingo da comunidade. E criou de cara três categorias – infanto juvenil, amador e veteranos. A criação de três categorias era para garantir que a população não ficasse sem futebol nas domingueiras, feriados e dias santos. Com predominância da mineirada na área, o nome escolhido para o representante da “currutela” no futebol foi Cruzeiro, talvez por influência do timão mineiro das décadas de 1960/1970, integrado por jogadores do nível de Wilson Piazza, Raul, Dirceu, Zé Carlos, Natal, Tostão, Palhinha…
Depois de muito tempo ensaiando, na primavera de 1967 o Cruzeiro decidiu desafiar a poderosa Ponte Preta, de Cáceres, para um amistoso em Bezerro Branco. Apesar do poderio da “Macaca” cacerense, o Cruzeiro depositava muita esperança no futebol requintado dos irmãos Allan Kardec e Dênis, além de Tim e do goleiro Domingos Bozerudo. Contava também com o desgaste físico dos adversários, que teriam que viajar 45 quilômetros na carroceria do caminhão do sr. Elias Aguilera.
Afinal, chegou o esperado dia, com o campo marcado com palha de arroz. Nem bem começou o jogo e a Ponte Preta percebeu que o Cruzeiro seria um adversário muito duro de ser batido em seus domínios. E através de alguns de seus jogadores começou a induzir, disfarçadamente, o juiz Ivan Marrekus,  auxiliado por Lulu Três Nariz e Mané Taturana a marcar uma penalidade contra o time da casa.
E o árbitro marcou mesmo o pênalti contra o Cruzeiro. Aí começou uma grande confusão, com os jogadores do time da casa, pressionando o juiz e impedindo a cobrança da penalidade máxima. Chamaram então o filho caçula de seu Florêncio Paraguaio para ir ao boteco do seu pai, ali perto, para lhe comunicar o que estava acontecendo. Naquela hora estava no boteco tomando umas pingas um líder rural da região, conhecido como seu Ferreira, a quem o menino deu ciência também da confusão no campo.
Segundo o jornalista cacerense João de Arruda, Ferreira terminou de tomar a sua dose  da cachaça Providência, pediu mais uma, deu uma cuspida bem longe, temperou a garganta e saiu para resolver a polêmica sobre o pênalti. Entrou no campo e foi direto falar com Marrekus. Com o revólver 38 embalado na mão, Ferreira perguntou ao juiz: “Foi mesmo penalidade?…”
Tremendo de medo, Marrekus, sem alternativas, confirmou: ”Foi pênalti, sim, mas com barreira…”
Ferreira olhou imediatamente para o banco de reservas e chamou todo mundo para reforçar a barreira do Cruzeiro…
Em seguida, Ferreira convocou o capitão da Ponte Preta, Balãozinho, para uma conversinha particular. Na volta do papinho, ali mesmo, Balãozinho apontou Germano Maninho para cobrar a penalidade.
Enquanto Maninho preparava-se para cobrar o pênalti, Ferreira fez uma advertência: “Se a bola tocar em um dos nossos jogadores, ninguém da Ponte Preta sai vivo de campo…”
Cobrada a falta, a bola foi parar no cemitério da comunidade rural, bem longe dali…
Bezerro Branco não existe mais, pois sua população, predominantemente católica, resolveu mudar o nome da localidade para Vila Aparecida, em homenagem a Nossa Senhora Aparecida. Com o novo  nome, Vila  Aparecida virou distrito…
(Matéria do livro do volume 2 do livro Casos de todos os tempos   Folclore da bola, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino, já em fase de edição).

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