Tanto passo errado…
Dia desses, andando a pé à noite pelo centro da capital – coisa muito comum para mim -, voltei a ouvir, vindos de um bar tipo risca-faca, os acordes tão conhecidos, e queridos, de uma canção anos 70/80: “Tanto passo errado que eu dei na vida / tantas flores que eu pisei em meu caminho / todo mal que um dia eu fiz a quem me amava / estou pagando agora…”.
Era Demetrius, craque da gravadora RCA Victor e que emplacou sucessos como ‘O ritmo da chuva’ e ‘Nas voltas do mundo’.
“O passo mais errado da minha vida” é o tipo da canção popular que machuca porque, a exemplo de tantas obviedades da vida humana, infelizmente diz a verdade, sem meias-verdades, sobre alguns aspectos da vida de homens e mulheres, sobretudo quando mais jovens.
Claro que lembranças como “todo mal que um dia eu fiz a quem me amava” são sentenças um tanto bregas, carregadas de melodrama, mas é fato que muitas vezes magoamos os outros, sim, embora sejam coisas que a gente faz não por maldade, evidentemente, mas por inconsequência ou, até bem mais, por desconhecimento de causa. No limite, como no meu caso, até por essa boba noção que muitos jovens têm de estar vivendo provisoriamente, com certezas escassas, às vezes nenhuma, quanto a perspectivas de futuro. Se nem o presente nos parecia certo, então, o que pensar do futuro, então? Que futuro?!
Tudo passa tão rápido. Tanto passo errado…
E, dias depois de ouvir a canção no centro, conversando com o amigo Ivens Cuiabano Scaff sobre literatura e outros ‘que tais’, o assunto veio de novo à tona. Falávamos do quase constante desconforto que vivemos com nosso corpo, nossa própria condição humana. Disse a ele que hoje até que vivo um pouco melhor, bem mais confortável comigo mesmo que na juventude, muito mais que na infância, quando a barra era muito, mas muito, mais pesada… E ele: “eu também hoje estou muito mais harmonizado com minha pessoa que quando mais jovem”.
Mas que bom, enfim, que a gente vai aprendendo as manhas do viver, a desenvolver artimanhas para escapar das armadilhas da vida em cada idade, nesse lance de perceber o tempo passando e que com ele a gente vai mudando, vai aprendendo a viver melhor.
Não, obviamente, para não dar mais passos errados, mas para que eles sejam menores, bem mais espaçados e que machuquem menos a nós mesmos e aos outros.
MARINALDO CUSTÓDIO, escritor, é mestre em Literatura Brasileira pela UFFmcmarinaldo@hotmail.com
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