Riva é culpado, sim. E os demais?

Delatou?
– Sim, delatou.
Homologou?
– Sim, homologou, na quinta-feira, 20.
– E agora Cuiabá?
– E agora Mato Grosso?
– A Imprensa e as redes sociais despejarão críticas e pedirão somente a cabeça de Riva?
O silêncio sepulcral que sempre mimou os poderosos apontará o dedo acusador sobre eles diante da verdade estampada na delação premiada de Riva, que joga no meio da fogueira cabeças coroadas do poder mato-grossense?
A delação premiada do ex-presidente e controlador da Assembleia Legislativa por 20 anos (de 1995 a 2014), José Riva, ao Ministério Público Estadual foi homologada nesta quinta-feira, 20, pelo desembargador do Tribunal de Justiça, Marcos Machado.

O ex-deputado sustentou apresentando vídeos, documentos e dados que no período teriam sido desviados R$ 175 milhões para pagamento de propina a deputados e relacionou 38 nomes dos supostos beneficiados.
Como parte do acordo, Riva recebeu pena branda de quatro anos em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, mas já havia permanecido preso por dois anos, o que reduz sua sentença à metade. Ele também devolverá R$ 94 milhões, mas anteriormente entregou um avião de sua propriedade, avaliado em R$ 2 milhões, o que baixa o montante para R$ 92 milhões.
No jargão político e jornalístico, Riva é cachorro morto. No entanto, alguns figurões delatados exercem mandatos eletivos e função pública? Qual será a reação popular e política pelo afastamento dos mesmos enquanto esperam por julgamento?

Riva foi o político mais cortejado em Mato Grosso nas últimas décadas. Controlava a Assembleia ora a presidindo ora enquanto primeiro-secretário. Tinha forte influência sobre o governo. Dava as cartas na Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM) e na União das Câmaras Municipais (UCMMAT). Não faltava quem o julgasse uma Instituição, algo suprapartidário – afinal ele tinha a mania de ser cacique no seu e em outros partidos. Foi ele quem liderou a criação do PSD em Mato Grosso.

Cuiabá tem tradição governista; Mato Grosso, também. Levar para a Imprensa e as redes sociais somente o papel de Riva é cômodo. Mas qual será o comportamento social sobre a abrangência de delação Como agirão a Assembleia Legislativa? A Câmara Municipal de Cuiabá? O Tribunal de Contas do Estado (TCE)? A Procuradoria-Geral do Estado (PGE)?
Antes da homologação a mídia revelou uma lista com nomes de 38 deputados estaduais e ex-deputados estaduais que teriam mamado na Assembleia. Estranhamente, após a delação a mídia se concentra em Riva deixando de lado tais figuras.
Na lista ora escamoteada consta o nome do prefeito de Cuiabá Emanuel Pinheiro (MDB), que foi deputado estadual. Emanuel além de delatado por Riva, também foi igualmente delatado pelo ex-governador Silval Barbosa, que inclusive entregou à TV Globo um vídeo onde o agora prefeito aparece recebendo pacotes de dinheiro de Sílvio Corrêa, então chefe de gabinete do governador. Ao receber uma pacoteira Emanuel a deixou cair do bolso do paletó que resultou no apelido de Paletó, que lhe foi dado pela sabedoria popular.

Na Câmara em Cuiabá está em curso o pedido de cassação do vereador Abílio Jùnior (PSC), por suposta quebra de decoro parlamentar. Abílio teria se exaltado ao fiscalizar a área de saúde, onde uma investigação aponta desvios milionários.
Imprensa e redes sociais vão se calar mais uma vez sobre Emanuel? Nesse espisódio de agora as pedras somente serão atiradas em Riva?
O presidente do TCE e ex-deputado estadual Guilherme Maluf figura na lista de Riva na condição de recebedor de R$ 5,12 milhões. Haverá silêncio sobre Maluf? Observem que cinco conselheiros estão afastados do TCE por decisão do Superior Tribunal de Justiça após Silval tê-los delatados em 2017, por suposto recebimento de R$ 53 milhões em propina ou mensalinho, como queiram. São eles: Valter Albano, Waldir Teis, José Carlos Novelli, Antônio Joaquim e Sérgio Ricardo. Esse mesmo Sérgio Ricardo consta na lista de Riva como recebedor de R$ 10,88 milhões.

O afastamento de Maluf seria análogo ao dos outros cinco conselheiros. Mato Grosso permanecerá calado?
Alexandre César, procurador do Estado, foi deputado pelo PT e, segundo Riva, teria abocanhado R$ 1,66 milhão. Alexandre permanece na função. Haverá silêncio sobre Alexandre?
A Assembleia Legislativa deve satisfação legal, moral e política a Mato Grosso pela roubalheira que aconteceu em suas entranhas e que envolve ou envolveria ex e atuais deputados. Qual será a postura do presidente Eduardo Botelho (DEM)? Botelho fingirá que não sabe, não viu nem ouviu?

A Assembleia tem que se manifestar tanto quanto a Imprensa e as mídias sociais. Da legislatura em curso cinco nomes remanescentes enquanto titulares ou suplentes de composições anteriores, figuram na lista. O campeão, segundo Riva, seria Sebastião Rezende (PSC), com R$ 7,5 milhões sendo o que o suplente em exercício Romoaldo Júnior (MDB) figura em segundo lugar, com R$ 5,6 milhões.
Uma relação com 38 deputados e ex-deputados envolvidos com corrupção ou apontados enquanto envolvidos é algo grave. Trata-se de uma lista com valores diferenciados, a exemplo daquilo que teria sido o recebimento por parte do deputado Carlos Avallone (PSDB), R$ 266 mil. Nessa lista, dentre outros figuram os irmãos Dilceu e Dilmar Dal’Bosco (ambos do DEM), o primeiro ex, e o outro, deputado; os ex-vices-prefeitos de Cuiabá, Chico Galindo e João Malheiros; o ex-prefeito e pré-candidato a prefeito de Várzea Grande, Walace Guimarães (PV); o conselheiro precocemente aposentado do TCE, Humberto Bosaipo, que foi deputado; Silval, que presidiu a Assembleia; os ex-deputados federais Ezequiel Fonseca (PP) e Teté Bezerra (MDB); e os falecidos ex-deputados Walter Rabello e Jota Barreto. Antes da homologação todos os delatados negaram envolvimento com Riva; depois não houve manifestação, pois o teor do documento não foi liberado à Imprensa.
Mato Grosso tem que ir muito além de Riva. É preciso desencadear forte pressão popular contra quem está no poder. Não é compreensível lançar toda a chama da satanização sobre Riva deixando ao largo um grupo quase tão numeroso quanto os 40 ladrões da fábula de Ali Babá.
Eduardo Gomes de Andrade – Editor de blogdoeduardogomes
FOTOS:
1,2, 3, 4 e 7 – Arquivo do site público da Assembleia Legislativa
5 – Flickr de campanha de Walace Guimarães em 2014
6 – Sobre imagem da TV Globo
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