Pum causa contusão

Na maior algazarra, lá ia a delegação do Araguaia Esporte Clube para jogar em Rio Verde, em Goiás. Como sempre, naqueles idos da década de 60, a viagem era feita sobre a carroceria de um velho caminhão, coberta com uma lona, para proteger os viajores do sol, chuva, poeira…
De repente, alguém que nunca foi identificado, apesar das acusações mútuas entre todos os jogadores, soltou um pum daqueles de fazer urubu sair voando a 200 quilômetros por hora.
Desesperado com a fedentina, o atacante Wilsinho levantou-se do seu lugar para erguer a lona para o vento arejar o ambiente. Mas nisso, o caminhão deu uma sacolejada e o jogador, completamente desequilibrado, bateu o cóccix – o último ossinho da coluna vertebral – numa quina da carroceria do caminhão.
Wilsinho não deu bola para a dorzinha que sentiu na hora e conti-nuou a atormentá-lo de vez em quando no lugar em que levou a pancada por culpa do pum…
O jogo do “Pantera do Leste” foi contra o Corinthians. Jogo ardua¬mente disputado, que terminou empatado por 1×1. O Araguaia abriu o placar, feito que foi festejado com foguetório pela torcida do Goiaszinho, o maior rival dos corintianos em Rio Verde.
A delegação do AEC só retornaria na segunda-feira para Alto Araguaia. À noite, depois do jogo, dirigentes do Goiaszinho foram procurar os do “Pantera do Leste” para propor a realização de um jogo na segunda-feira. Alguns minutos de conversa e o amistoso estava acertado.
Depois do suado empate, alguns jogadores do clube de Alto Araguaia saíram para dar umas voltas pela cidade. Só que as horas avançavam e nada de alguns deles, que não sabiam do jogo no dia seguinte, aparecerem no hotel.
O primeiro lugar onde alguns jogadores foram procurados foi na ZBM (zona do baixo meretrício) da cidade. Numa das casas mais fuleiras do lupanar, onde a luz era de lamparina e a música tocada numa das daquelas ve¬lhas vitrolas de corda, encontraram Viadinho e Ica bebendo e dançando agar¬radinhos com as mulheres que arrumaram no bordel…
Ica, para quem não sabe, sempre foi o apelido de Otair da Cruz Bandeira, considerado um dos mais cultos desembargadores que já passaram pela presidência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso…
Mesmo com muitos jogadores tendo ficado na farra até altas horas da noite e ainda cansados do amistoso do dia anterior, o Araguaia venceu o Goiaszinho por 3×1. Ao contrário do foguetório dos torcedores do Goiaszinho, os do Corinthians comemoravam nas ruas os gols do “Pantera do Leste” com tiros de revólveres e de outras armas para o alto…
De volta para Alto Araguaia, Wilsinho começou a sentir fortes dores na região do cóccix. E foi procurar um médico num hospital da cidade em busca de cura.
– Você tem que operar, só isso, Wilsinho… – foi o diagnóstico do médico.
A resposta de Wilsinho foi um não. Por um motivo bem justificado: na sexta-feira daquela semana, uma orquestra do Rio de Janeiro ia animar um baile da cidade para defender uma graninha para chegar a Cuiabá, onde ia tocar. E Wilsinho, como de resto toda a população altoaraguaiense, não queria perder o bailão por nada…
– A hora que você quiser fazer a cirurgia é só aparecer, Wilsinho!… – disse o médico com jeito meio irônico…
Não demorou muito, Wilsinho estava de novo no hospital para ser submetido a cirurgia no cóccix. O bailão tão esperado ficou para outra oportunidade. Tudo por causa de um pum…
PS – Reproduzido do livro Casos de todos os tempos Folclore do futebol de Mato Grosso, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino
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