Boa Midia

O governo sob o ângulo do fatiamento do poder

Mauro Mendes, aqui pedindo voto para governador
Mauro Mendes, aqui pedindo voto para governador

Mato Grosso não pode mais permanecer atolado no lodaçal político que dita as regras da composição do governo e administrativas, a cada quatro anos, com a mudança do governante. ou a cada oito anos em caso de reeleição. Acompanhamos a distribuição do poder entre partidos e forças sociais que agem na penumbra (igrejas, federações, grupos empresariais patrocinadores de políticos etc.), mas não vemos a real preocupação com a forma correta, objetiva e republicana da condução do Estado. Pelo discurso até agora apresentado, o  governador diplomado Mauro Mendes (DEM) não é exceção, mas ele deveria deixar de olhar o governo pelo ângulo do fatiamento do poder.

Recentemente Mauro anunciou a extinção ou fusão de pelo menos cinco empresas públicas. Esse grupo é formado pela Companhia Mato-grossense de Gás (MT Gás), Companhia Mato-grossense de Mineração (Metamat), Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso (Desenvolve MT), Empresa Mato-grossense de Tecnologia da Informação (MTI) e Central de Abastecimento do Estado de Mato Grosso (Ceasa).

A estratificação das cinco empresas resultaria num texto muito grande.  Concentremos em uma, a título de exemplo: a Metamat.

Mauro é minerador. Portanto, tem o duplo dever de saber sobre a realidade da cadeia mineral mato-grossense: enquanto governador diplomado e na condição de empresário no setor. No entanto, sua fala sobre aquela empresa nos passa a impressão de que ele não a conhece ou mesmo conhecedor, prefere sair pela tangente, evitando assim, enfrentar as forças que fazem da Metamat um cabide de emprego, reduzem sua capacidade operacional e – muito grave isso – impedem a criação de política mineral.

No campo institucional Mato Grosso é vergonha mineral, a começar pela gestão da Metamat – não confundir com sua atuação prática. Cabidão de emprego, aquela empresa tem mais de 80 servidores comissionados e menos de 10 geólogos – todos a um passo da aposentadoria. O inchaço da Metamat passa pelo fatiamento do poder. Seus quadros são permeados por burocratas indicados por deputados estaduais e outras figuras influentes, que continuarão no poder com Mauro. Dois exemplos de sua presidência: os ex-presidentes João Justino Paes Barros e Elias Santos; o primeiro é réu confesso ao assumir que comprava ouro para o então secretário de sua área, Pedro Nadaf – com dinheiro da origem mais duvidosa que se possa imaginar; o outro chegou ao cargo para fazer política. Justino é sobrinho do ex-deputado estadual João Malheiros; Elias é irmão do deputado estadual reeleito Wilson Santos.

A Metamat tem receita anual superior a R$ 32 milhões, provenientes de impostos de recursos minerais, mas não consegue levar adiante pesquisas nem ganhar capilaridade nos municípios, por conta do inchaço de seus quadros apadrinhados.

Mato Grosso está no centro das atenções de grupos mineradores mundiais e de empresas interessadas em minérios de sua reserva. A fabricante de baterias ACDelco planeja investir milhões de reais na pesquisa do alumínio – boa parte em municípios mato-grossenses, em busca de alumínio para fabricação de baterias da futura frota automotiva elétrica nos quatro cantos do mundo. Não temos política mineral para atrair tais investimentos.

No ano de 2012, em Cuiabá, num seminário sobre mineralogia promovido em parceria pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e a Metamat, o presidente da IMS Engenharia Mineral, de Minas Gerais, Juvenil Tibúrcio Félix, detalhou sobre o depósito mato-grossense de minério de ferro. Citou que Juara tem 3 bilhões de toneladas desse minério. Nenhuma autoridade se interessou por isso.

A falta de política mineral não permite que o governo estadual conheça as reservas de polimetálicos, o que as torna menos atrativas para o empresariado que investe no setor. Mesmo capenga, com o governo quase totalmente ausente, Mato Grosso conseguiu exportar em 2015 US$ 77 milhões (FOB) em barras de ouro.

Política mineral não há, mas o governador Pedro Taques,  agora em fim de mandato, ensaiou o lançamento de uma, por meio do Programa de Desenvolvimento da Mineração em Mato Grosso (Pró-Mineração), que não saiu do papel. Taques lançou o Pró-Mineração em 23 de março de 2017 e o então secretário de Desenvolvimento Econômico, Ricardo Tomczyk, explicou que o mesmo estava alinhavado em três eixos: legislaçãomeio ambiente e de enquadramento às normas do DNPM, que é vinculado ao Ministério de Minas e Energia.

Após o lançamento o Pró-Mineração tomou Doril. O mesmo fez Tomczyk, que entregou o cargo a Taques, que nomeou Carlos Avalone para substituí-lo. Avalone engavetou o programa e depois saiu da secretaria para disputar sem sucesso uma cadeira de deputado estadual pelo PSDB.

Essa é a realidade. Falta política mineral e sem ela não há como a Metamat deslanchar. Mauro precisa serenidade para decidir. Ao invés de se concentrar no fatiamento do poder para acomodar forças políticas deveria se dedicar a planejar o governo. Para tanto deveria ouvir servidores, técnicos, segmentos econômicos, comunidade científica e instituições representativas – abrir um leque de consultas. Não se pede ao governador diplomado que rompa com os grupos políticos que o elegeram. Pede-se apenas bom senso, lucidez e que o mesmo faça valer sua autoridade para tomar decisões corretas, independentemente que as mesmas desagradem os políticos que há décadas fazem de Mato Grosso feudo, como é o caso da Metamat.

Eduardo Gomes de Andrade – editor de blogdoeduardogomes

eduardogomes.ega@gmail.com

FOTO: Flickr da campanha de Mauro Mendes ao governo

1 comentário
  1. Antonio João Paes de Barros Diz

    A questão da mineração em Mato Grosso é complexa, e carece de reflexões e conhecimentos mais aprofundados. De qualquer forma é oportuna a reportagem do editor.
    Existem inúmeras outras causas para o “aparente” insucesso da mineração no Mato Grosso, além do aparelhamento político dos órgãos públicos, que não comportam, expor, em um simples comentário.
    Entretanto, vou reportar apenas três casos, para uma breve sinapse do processo histórico.
    i) há cerca de 40 anos atrás, já se vislumbrava a possibilidade de Mato Grosso se tornar um celeiro agrícola. Esse esforço tem como marco a passagem de Maçao Tadano, pelo cargo de Secretário de Indústria, Comércio e Turismo, durante o governo de José Garcia Neto (1975-1979), quando impôs a METAMAT a missão de pesquisar e montar a primeira indústria produtora de calcário em Mato Grosso. Sem insumos a preços competitivos não se tem uma agricultura sustentável. Hoje Mato Grosso importa cerca de 1 bilhão de dólares/ano, em insumos, basicamente, de sais de potássio e fosforo.

    ii) Mato Grosso, é um importante produtor de ouro, com três destacadas províncias auríferas: Baixada Cuiabana, Guaporé e Alta Floresta. Esse ouro, fundamentalmente, produzido através do regime de garimpagem (PLG), vinha sendo explorado por décadas de forma clandestina. A partir da década de 1990, ocorreu um esforço das agências estaduais (METAMAT e SEMA) no sentido de promover a regularização dos garimpos. O que ocorreu inicialmente em Poconé (Baixada Cuiabana), cujas primeiras licenças ambientais foram emitidas em 1995. Em 2007, através de iniciativa da METAMAT, enfrentou-se a questão da garimpagem clandestina na região de Peixoto de Azevedo (Província Aurífera de Alta Floresta), e após 10 anos, essa região se tornou a maior produtora de ouro legal de Mato Grosso, com uma cooperativa de garimpeiros que tem mais de 5 mil associados, e que mais produz ouro legal no Brasil (COOGAVEPE). Este trabalho contribuiu ainda para equacionar conflitos entre garimpeiros e empresas mineradoras, criando um ambiente de prosperidade e sinergia, com crescente geração de conhecimentos, sobretudo, através de pesquisas aplicadas, envolvendo universidades (UNICAMP, UnB, UFMT, UERJ, UFPR, UNEMAT, UNESP, USP, etc.) e centros de pesquisa (CETEM/CNPq e CPRM). Neste ano de 2017, em plena crise, estima-se que os garimpeiros produziram, nesta província, mais de 7 toneladas de ouro, enquanto, as empresas mineradoras investiram cerca de 40 milhões de Reais em pesquisa.

    iii) Mato Grosso, também é, historicamente, um importante produtor de diamantes, e por mais de três décadas, sempre se posicionou como o maior produtor de diamantes do Brasil, isto até o ano de 2015. Em 2016, com a entrada em produção do kimberlito Braúna, o Estado da Bahia passou a ocupar esta posição. Este é o primeiro kimberlito que oficialmente é explorado no Brasil, entretanto, se conhece a existência de 117 kimberlitos em Mato Grosso, sendo alguns de Juína, já reconhecidamente férteis, e incipientemente, lavrados através de garimpagem. No primeiro ano de produção (2016), o kimberlito Braúna produziu 190 mil ct, ou seja, nove vezes a produção de MT, deste mesmo ano. Os diamantes de MT por serem, sobretudo, industriais, oriundos de Juína, resultaram em cerca de dois milhões de dólares, em exportação, enquanto, os exportados pela Bahia (Braúna), em 2016, resultaram em valores superiores a 40 milhões de dólares. O estado do Mato Grosso tem o maior número de corpos kimberlíticos conhecidos da região Amazônica.

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