Matsubara, o homem que amansou o cerrado
Louco e sem juízo foram adjetivos que alguns moradores no eixo da Rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163) na região onde mais tarde surgiriam as cidades de Lucas do Rio Verde e Sorriso lançaram sobre a frágil figura do jovem nissei Munefume Matsubara.
O destempero verbal contra ele – claro que a distância ou pelas costas – ficava por conta de sua ousadia em desafiar o cerrado com o cultivo de soja abaixo do Paralelo 13 em Mato Grosso.
Matsubara, empresário paulista nascido em Vera Cruz e com experiências agrícolas naquele município e no Paraná, era um caso raro no Nortão, onde se situam Lucas e Sorriso: tinha dinheiro pra investir em seu sonho de plantar soja. No período de 1972 – quando a BR-163 foi aberta naquela região – até o começo de 1978, seus bolsos sangraram em US$ 1 milhão pra bancar pesquisas agronômicas e lavouras da leguminosa de origem chinesa, que é o principal pilar da economia mato-grossense.
O cultivo mesmo sendo experimental ocupava parte da fazenda Progresso, de 10 mil hectares (ha) de Matsubara em Sorriso, mas bem próxima a Lucas. Nessa área ele plantou mais que a cultivar UFV-1: semeou o sonho de transformar aquela região num celeiro mundial de grãos e fibras.
Técnicos do governo e contratados por Matsubara transformaram a fazenda Progresso num grande laboratório. Sua primeira safra, em 1977-78, com a UFV-1, numa área de 3.600 ha, teve baixíssima produtividade se comparada ao rendimento atual: não passou de 15 sacas/ha. A melhor tecnologia da época foi empregada, não faltou dedicação nem dinheiro, mas tratava-se de experimento que somente poderia apresentar resultado no médio prazo.
O solo vermelho de Sorriso mesmo produzindo pouco sinalizava para Matsubara que em breve poderia se abrir em generosas safras, bastando para tanto que a prática do dia a dia criasse condições agronômicas para tanto, porque topografia, regularidade climática e luminosidade não faltavam.
Os recursos financeiros de Matsubara se exauriram. Ou melhor, foram exauridos por sua pesquisa, mas sua loucura e falta de juízo saltaram suas cercas e se espalharam pela região, que se transformou e foi além do grande celeiro por ele sonhado. Agora, o Nortão é um dos maiores leques do agronegócio mundial tanto nas lavouras quanto na transformação de proteína vegetal em proteína animal, na agroindústria, na armazenagem, na aviação agrícola, na revenda de máquinas e insumos, e o que mais se possa imaginar.
A pesquisa de Matsubara motivou ainda mais os pioneiros da soja naquela região e teve reflexos nas vilas à margem e no eixo da BR-163, que cresceram e viraram importantes cidades a exemplo de Lucas, Sorriso, Sinop, Tapurah, Nova Mutum e outras.
Matsubara nunca guardou o arado, nunca desligou o trator agrícola nem a colheitadeira. Vive sempre enfrentando desafios em Sinop, para onde se transferiu, e no Pará, onde tem investimentos. Melhor: nunca perdeu a capacidade de sonhar e nem pode fazê-lo, porque na condição de pai da soja abaixo do Paralelo 13 tem mais é que ficar atento e com o olho vivo participando e acompanhando o desenvolvimento econômico e das transformações sociais que tiveram raízes na fazenda Progresso, onde tudo começou.
EDUARDO GOMES/blogdoeduardogomes
Foto:GERALDO TAVARES
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