Garcia Neto, o nordestino que governou Mato Grosso

Engenheiro civil recém-formado pela Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, o jovem José Garcia Neto desembarca em Cuiabá em meados dos anos 1940. Na bagagem, o sonho de progredir e de encontrar a oportunidade de um lugar ao sol, que não teve em sua terra, Rosário do Catete, em Sergipe. A cidade experimentava um período de importantes obras públicas para ela canalizada pelo líder mato-grossense Filinto Müller. Era o palco ideal para quem atuava na área profissional dele, e que gostasse de política, como era seu caso.
Pouco antes da chegada de Garcia Neto, o presidente Getúlio Vargas veio a Cuiabá. Foi o primeiro presidente que o fez. Com o pouso de seu avião, em 6 de agosto de 1941, Getúlio inaugurou o aeroporto da cidade, no local onde mais tarde se instalou o Clube Círculo Militar.
Garcia entrou em cena profissionalmente. Ajudado pelo professor Aecim Tocantins, ganhou o contrato para construir a Escola Santa Claudina, em Mimoso, município de Santo Antônio de Leverger. Claudina é o nome da mãe do herói Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, que bancou a obra. Mimo é a terra de Rondon. Aecim era amigo do grande militar.
Em Cuiabá Garcia mistura engenharia com política. Tanto assim, que em 1954 elegeu-se prefeito pela UDN. Seis anos depois, venceu a eleição para vice-governador. À época a votação era direta para os dois cargos – não havia chapa. Fernando Corrêa da Costa foi vitorioso para o governo, e Garcia, para vice.
O gosto pela política aos poucos engoliu a profissão de Garcia. Em 1966 e 1970 elegeu-se deputado federal pela Aliança Renovadora Nacional (Arena), que substituiu a UDN quando do bipartidarismo criado por Golbery do Couto e Silva.
Em 1974, quando eleição ao governo, e os municípios das capitais, faixa de fronteira e considerados de Segurança Nacional, era indireta, foi contemplado com o cargo de governador. Por seu bom trânsito em Brasília e perfil de direita, os militares o indicaram ao governo. Seu vice foi Cássio Leite de Barros. O Conselho de Segurança Nacional sempre compunha as chapas de seus escolhidos, observando critérios regionais. Garcia era de Cuiabá, e Cássio, da região ao Sul, que queria se separar de Mato Grosso.
No poder, Garcia adotou o slogan Mato Grosso Estado Solução. Em seu governo o presidente Ernesto Geisel dividiu Mato Grosso criando Mato Grosso do Sul, em 11 de outubro de 1977. À princípio o governador foi contrário, mas, com o passar do tempo cedeu. Numa entrevista noturna no Aeroporto Marechal Rondon, quando desembarcava de um voo procedente de Brasília, um repórter lhe perguntou: Governador, o presidente vestiu a camisa da divisão, e o senhor como fica? Acuado, sem saída, disse que também a vestiria.

Governador, Garcia pavimentou a Rodovia José Salmen Hanze – Zé Turquinho (MT-270) entre Rondonópolis e Guiratinga, numa extensão de 110 quilômetros, Convidado por Geisel, em 20 de outubro de 1976 participou da inauguração da BR-163, na localidade de Cachoeira do Curuá, no Pará; também presentes: os ministros Sílvio Frota, do Exército, e Dirceu Nogueira, dos Transportes; e o governador paraense Aloísio da Costa Chaves.
O mandato de Garcia coincidiu com a expansão da lavoura de soja e o surgimento de garimpos no chamado Ciclo do Ouro, no Nortão. Sobre a leguminosa, o governador criou um programa social dirigido por sua mulher, Lígia de Borges Garcia, que produzia leite a partir da soja, num processo feito por vaca mecânica.
Garcia deixou o governo ao vice Cássio Leite, para disputar o Senado, mas foi derrotado por José Benedito Canellas, ambos da Arena. Sua derrota em parte pode ser debita à divisão de Mato Grosso, fato que desagradou cuiabanos. Na campanha sofreu ataques apócrifos, onde era chamado de Don Ratão, representado por um gigantesco rato com o formato de seu rosto.
Em 1982 Garcia novamente disputou o Senado, dessa vez pelo PMDB, que incorporou seu antigo partido , o PP, mas foi derrotado por Roberto Campos, que fez uma campanha milionária.
FAMÍLIA – Quando governador Garcia nomeou seu genro Rodrigues Palma prefeito de Cuiabá, Palma realizou grandes obras. Seu neto Fábio Garcia foi secretário municipal em Cuiabá e deputado federal – é presidente regional do DEM e primeiro suplente do senador democrata Jayme Campos.
ADEUS -Na sexta-feira, 20 de agosto de 2009, aos 87 anos, Garcia não resistiu a um acidente vascular cerebral (AVC). Seu corpo foi sepultado em Cuiabá. O governador Blairo Maggi; o prefeito de Cuiabá, Wilson Santos; e o prefeito de Rondonópolis, Zé Carlos do Pátio, decretaram luto oficial por três dias.
Garcia escreveu importante página política em Mato Grosso. Creio que se ele pudesse escolher algum de seus feitos na vida pública para levar, escolheria um episódio ocorrido em 1937, quando tinha 15 anos e militava na União Democrática Estudantil. À véspera do Estado Novo ele e alguns colegas foram mantidos presos por seis dias, porque faziam oposição a Getúlio Vargas, ““Talvez eu tenha sido o preso político mais jovem do Brasil”, disse numa entrevista que me concedeu em seu escritório.
Eduardo Gomes – blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – Governo de Mato Grosso
2 – Acervo 9º Batalhão de Engenharia de Construção
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