ESPECIAL: O lendário Nhonhô Tamarineiro (2º capítulo sobre o grande coronel)
Segundo dos três capítulos sobre Nhonhô Tamarineiro, no livro “Dois dedos de prosa em silêncio – pra rir, refletir e arguir“, escrito e publicado em 2015 pelo jornalista Eduardo Gomes de Andrade, sem apoio das leis de incentivos culturais, com ilustração de Generino e capa de Édson Xavier.
O primeiro capítulo sobre Nhonhô Tamarineiro foi postado ontem, sábado, com o título: Filinto tentou e não conseguiu. O derradeiro será postado amanhã, segunda-feira.
Capítulo
Livramento, seu novo endereço
Nas veias de Nhonhô Tamarineiro corria uma mistura de sangue que não poderia mesmo resultar em alguém que não fosse bom comerciante e político habilidoso. Afinal, ele é filho de sírio com uma Campos, de Várzea Grande.
Do pai, Salim Homs, herdou a arte da venda. Salim trocou o deserto da cidade de Homs pelo centro da América do Sul. Desembarcou de um vapor em Cuiabá para trabalhar de caixeiro-viajante e morreu jovem quando o filho Osvaldo ainda era bebê.
Se Nhonhô Tamarinheiro não enveredasse pelas sendas que escolheu estaria negando o melhor do inventário dos Campos, de Várzea Grande: a política. Daí que herdou da mãe, Aurélia, o gosto pela coisa. Gosto, não, cachaça mesmo.
A vida do menino Osvaldo, o Nhonhô, não foi moleza e ele deu murros em ponta de faca. Adolescente, comprou uma carroça e ganhava o pão de cada dia fazendo fretes em Várzea Grande. Aos 19 anos vendeu a carroça e investiu um conto de réis num bolicho do cunhado Sebastião Ramos de Almeida, naquela cidade. Tornou-se sócio minoritário no negócio. O salto para a fortuna não foi acidental: o tio e padrinho Miguel Gatass, homem rico e dono de vapores que faziam linha de Cuiabá a Corumbá, decidiu ajudá-lo.
Gatass investiu em nome de Nhonhô no capital do bolicho, mas o olho gordo de Sebastião botou o cunhado para escanteio.
Em 1943, escorraçado pelo cunhado, Nhonhô saiu da sociedade e novamente comprou uma carroça. O tio não o queria carroceiro e mandou que ele montasse um comércio onde julgasse ideal. Ainda naquele ano, abriu as portas no município de Nossa Senhora do Livramento, mas o negócio não prosperou.
Nhonhô não deixou Livramento e naquele ano achou um canto bonito, ideal para o estabelecimento comercial. Ali, ocupou a área devoluta da fazenda Tamarineiro, perto do córrego Espinheiro e o nome dessa propriedade incorporou-se ao dele transformando-o para sempre em Nhonhô Tamarineiro. Comprou terras dos vizinhos e formou uma gleba de 11.800 hectares. Assim surgia a figura lendária de Nhonhô Tamarineiro.
Ninguém tinha topete para enfrentar Nhonhô Tamarineiro no voto. Mas um sitiante vizinho abriu um bolicho e declarou guerra verbal contra o dono do Tamarineiro. “Dizem que ele era criminoso e valentão”, revelou-me numa entrevista o coronel, já aposentado.
Escuta uma coisa dali, outra daqui, Nhonhô Tamarineiro pensou com os botões: “Vou mandar essa sujeito ‘viajar’ pra sempre”. Antes de tocar adiante o pensamento, o coronel recuou por entender que o atrevido não passava de um borra-botas.
Sorte teve o sitiante. Nhonhô Tamarineiro comprou o sítio, ele viajou com as próprias pernas e nunca mais apareceu por lá.
Missa na Fazenda Tamarineiro era motivo de festa. O padre celebrava uma a cada ano. Aproveitando a presença do sacerdote, as famílias batizavam a filharada. Nhonhô Tamarineiro e a eterna namorada, dona Elina, foram padrinhos de “uns 500”.
Tantos batizados assim só reforçam a tese da fertilidade que paira no ar na região do Tamarineiro. Nhonhô Tamarineiro e dona Elina não ficaram para trás e deram exemplo aos vizinhos que família tem que ser numerosa.
O casal Elina e Nhonhô Tamarineiro gerou 11 filhos no Tamarineiro: Venceslau (o primogênito), Nereu, Salim, Hermes, Pedro Paulo, Mariana, Elizete, Eleninha, Ivete, Maria Auxiliadora e Elina que herdou o nome da mãe.
Cargo eletivo ele nunca disputou, mas uma vez caiu em tentação e aceitou que o governador Fernando Corrêa da Costa o nomeasse subdelegado de Polícia em Livramento. Não gostou da atividade e indicou outro para substituí-lo.
Em 1945 foi um dos fundadores da União Democrática Nacional (UDN) em Mato Grosso juntamente com Joaquim Nunes Rocha (Rochinha), Garcia Neto, Fernando Corrêa da Costa e outros nomes de destaque na política regional. Ao longo da militância política que se estendeu à Arena, esteve com os presidentes Getúlio Vargas, Eurico Gaspar Dutra, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros, Jango Goulart, Castelo Branco, Costa e Silva, Emílio Médici e Ernesto Geisel.
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