RONDONÓPOLIS 64 ANOS – Barreto e a chave do mundo
Aos sábados, domingos e feriados nacionais CURTAS é substituída por capítulos do livro “Dois dedos de prosa em silêncio – pra rir, refletir e arguir“, escrito e publicado em 2015 pelo jornalista Eduardo Gomes de Andrade, sem apoio das leis de incentivos culturais. A obra foi ilustrada por Generino. Capa: Édson Xavier.
Capítulo:
Barreto e a chave do mundo
No começo de 1971, o narrador de futebol e âncora de jornal na Rádio Branife, de Rondonópolis, Hermínio Barreto, o Jota Barreto, militava no grupo político liderado pelo deputado estadual Afro Stefanini.
Afro era um dos principais caciques políticos de Mato Grosso. Habilidoso e tinhoso, mandava e desmandava na Assembleia Legislativa e no governo. Barreto sabia o poder que seu líder tinha nas mãos; por isso e também por amizade, nunca lhe dizia um “não” sequer.
Numa tarde, Barreto recebeu um telefonema na rádio pedindo cobertura jornalística. Afro queria que ele fosse à residência de William Moraes, onde acontecia uma importante reunião com a participação do deputado Emanuel Pinheiro, prefeito Zanete Cardinal e vereadores.
Mal desligou o telefone, Barreto apanhou o gravador e saiu disposto a caminhar até a casa de William, em Vila Aurora. O sol era um convite a não botar os pés na rua. A temperatura à sombra oscilava pela casa de 45º C. Mas o pedido de Afro tinha que ser atendido.
Barreto ensaiou os primeiros passos. Não foi além disso porque o jornalista e radialista Sebastião Carlos Daltro de Carvalho, dono do jornal Correio do Leste, estacionou seu Fusquinha na calçada da emissora.
Antes que Daltro descesse do carro, Barreto pediu-lhe uma carona. O colega disse que não poderia sair naquele momento, mas em contrapartida lhe emprestou o Fusquinha.
Assim que atravessou a ponte de madeira sobre o rio Arareau, na Rua Major Otávio Pitaluga, Barreto bate num poste de energia e danifica seriamente o Fusquinha de Daltro.
Desconsolado, segue a pé. Chega desapontado. Afro quer saber o que aconteceu.
– Ooooh, que pena! – disseram Pinheiro e os outros, na mais fingida solidariedade política.
Afro viu a situação por outro ângulo. Cacique, resolveu tudo coronelescamente com meia dúzia de palavras:
– Não se preocupe, Barreto. O carro do Daltro a gente manda consertar via (Pedro) Pedrossian (o governador). E a partir de agora você está nomeado agente fiscal de arrecadação da
Secretaria de Fazenda de Mato Grosso. Vai ter salário pra comprar seu próprio Fusquinha.
Mais que um emprego, Afro deu a Barreto a chave para abrir a porta do mundo político, no qual foi vereador e prefeito em Rondonópolis, e deputado estadual em cinco legislaturas.
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