Se os 24 deputados estaduais mato-grossenses pusessem a mão na massa 24 horas por dia, todos os dias, ainda assim não conseguiriam zerar as demandas de nossa terra, tamanha a omissão da Assembleia Legislativa nas últimas décadas – o que contribuiu para tanto. Mas, se ao menos trabalhassem, ainda que pouco, contribuiriam para a solução de parte do problema. Sob esse ponto de vista analiso o espalhafato dos deputados Sílvio Fávero e Delegado Claudinei, ambos correligionários do presidente Jair Bolsonaro no PSL, nesta quarta-feira verde dedicada ao meio ambiente.
Com tristeza e desencanto vi Fávero e Delegado Claudinei em clima de esquenta de bloco de carnaval entregando o Título de Cidadão Mato-grossense ao presidente, numa solenidade em Aragarças (GO) na conurbação com Pontal do Araguaia e Barra do Garças.
Não analiso o aspecto da extraterritorialidade do ato em solo goiano. Isso ganha contornos secundários diante do fato que motiva este texto.
O primeiro presidente veio a Mato Grosso em 6 de agosto de 1941, quando o estadista Filinto Müller trouxe Getúlio Vargas para inaugurar um pacote de obras em Cuiabá, que foi executado pelo governo federal graças a articulação política do mesmo Filinto. Não houve salamaleques com Vargas. Objetivo, o idealizador das obras e também responsável pela presença do líder nacional, não perdeu tempo, pois sabia que sua cidade desesperadamente precisava e merecia aquilo que Vargas lhe deu.
Alguns outros presidentes também estiveram em Mato Grosso.
Bolsonaro desembarcou em Barra do Garças para ir a Aragarças, onde não há aeroporto que opere jato. Sua presença foi para lançar um programa de revitalização do Araguaia, mas não havia nenhuma agenda mato-grossense específica. Seu principal anfitrião foi o democrata governador goiano Ronaldo Caiado e a camisa-marketing para popularizá-lo foi a do Goiás – o time de maior torcida no Estado que lhe empresta o nome.
A visita tinha agenda manga curta, mas teria tempo suficiente para a Assembleia Legislativa exibir ao presidente um vídeo de 5 minutos apresentando o Araguaia Mato-grossense e cobrando atuação da União na solução de graves problemas daquela região. Isso, seguido da entrega de cópia do vídeo e de um calhamaço expondo a situação – e exigindo resposta.
A Cidadania Mato-grossense é honrosa. Avalio que Bolsonaro a mereça por algumas razões e, dentre elas, pelo estancamento da corrupção que correu solta nos anteriores governos do PT e MDB – mas não agora. O meu voto se juntou ao de milhões de brasileiros pela eleição do Capitão, mas discordo da forma e da precocidade como a Cidadania lhe foi concedida e entregue.
A entrega foi pirotécnica. Bolsonaro poderia receber a Cidadania, mas após atender algumas demandas mato-grossenses – nada a ver com a Oração de São Francisco, mas num ato de postura parlamentar que reconhecesse algo feito pelo presidente em prol da abençoada e ensolarada Terra de Rondon. Assim, o ilustre Mato-grossense de Direito faria jus a honraria somando o mérito na contenção da corrupção e o algo.
Insisto que o ato foi pirotécnico e custeado por dinheiro público.
Volto ao vídeo.
A Assembleia tem um turbilhão de assessores, aspones, asmones, consultores etc. Essa legião deveria ter oferecido aos deputados a relação das principais demandas afetas ao poder da União, naquela região. A Assembleia – não somente Fávero e Delegado Claudinei – deveria apresentar o citado vídeo, que – permitam-me a sugestão – poderia ser recheado com as seguintes demandas ao presidente:
1 – Regularização fundiária rural e urbana. O Araguaia em parte é tremenda balbúrdia agrária e o Incra é mestre em criar dificuldades para vender facilidades.
2 – Pavimentação da BR-080 entre Ribeirão Cascalheira e Luiz Alves, no município de São Miguel do Araguaia, cruzando os rios Araguaia e das Mortes, e as cidades de Bom Jesus do Araguaia, Serra Nova Dourada e Novo Santo Antônio.
3 – Pavimentação da BR-158 ao Norte de Alô Brasil no trecho de 140 quilômetros coincidente com a recém-instalada terra indígena Marãiwatsédé, dos índios xavantes. Uma vez executada essa obra, sairiam do isolamento e se integrariam à malha rodoviária pavimentada as cidades de Querência, Alto Boa Vista, Luciara, São Félix do Araguaia, Canabrava do Norte, Porte Alegre do Norte, Confresa, Vila Rica, Santa Terezinha, São José do Xingu e Santa Cruz do Xingu.
4 – Construção de 1.600 quilômetros da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO), entre Campinorte (GO) e Vilhena (RO) cruzando o Vale do Araguaia, Nortão e Chapadão do Parecis e, desse modo, interligando Rondônia e Mato Grosso à Ferrovia Norte-Sul.
5 – Estimular a política mineral na região, principalmente com a explotação do minério de ferro em Cocalinho, que poderia ser escoado pela FICO.
6 – Criar estrutura para a viabilização de um Corredor Leste-Oeste ligando Maranhão, outros estados nordestinos e Tocantins, com o Oeste paraense. A espinha dorsal dessa rota é o antigo trecho da BR-080 que foi estadualizado em 270 quilômetros entre São José do Xingu e Matupá (margem da BR-163 no Nortão) e que recebeu a nomenclatura de MT-322 . Essa rodovia cruza o rio Xingu num travessia feita por balsa operada por índios.
7 – Criação de um programa para a recuperação de pastagens degradadas.
8 – Retomada no mais amplo sentido possível de estudos e a execução de obras para a viabilização da navegação comercial na Hidrovia Mortes-Araguaia-Tocantins com porto mais ao Norte no município de Nova Nazaré.
9 – Incremento de política de Saúde Pública para reverter a alta taxa de prevalência da hanseníase em alguns pontos da região, sobretudo em Porto Alegre do Norte.
10 – Desenvolvimento de uma política de saneamento emergencial, pois todas as cidades da região enfrentam o grave problema da falta de coleta e tratamento de esgoto.
Delegado Claudinei e Fávero tiveram cinco minutos de fama. Com esse mesmo tempo poderia se fazer a defesa dos reais interesses do Vale do Araguaia. O cavalo passou arreado e a Assembleia como um todo não soube montá-lo, navegou na maionese. A instituição parlamentar fica chamuscada com o fogo da vaidade. O ato legislativo que cortejou Bolsonaro foi extemporâneo, extraterritorial. Em alguns momentos, iguais a esse do Xomano Djhair Borsonaro lanço mão das minhas mais fortes convicções democráticas para não fazer coro com o líder líbio Muammar Kadafi, que em seu Livro Verde disse que Parlamento é a ausência do povo.
A coragem e o conhecimento sempre ao lado do Araguaia. Parabéns Brigadeiro você enche o Mato Grosso de esperança
Cesar Teixeira – Barra do Garças