Ao longo dos anos, verifica-se o estrangulamento do trânsito e da mobilidade urbana em Cuiabá, que pode ser percebida, entre outros aspectos, pela supremacia dos veículos motorizados na utilização do espaço público e pela incapacidade das vias no escoamento do tráfego, principalmente nos horários de pico, cujo quadro se agravou com as obras, mal dimensionadas e/ou inacabadas, para a Copa do Mundo de 2014.
A prevalência dos veículos automotores é traduzida pelo aumento vertiginoso da frota veicular, com destaque para os veículos de duas rodas, decorrente, principalmente, dos equívocos e da omissão do governo federal na elaboração de políticas públicas que, ao invés de privilegiarem o investimento no transporte público de qualidade no Brasil, concede incentivos à indústria automobilística, fomentando a utilização de motocicletas e similares, sem considerar a fragilidade/insegurança que lhes é inerente por suas próprias especificações estruturais. Soma-se a isso, a liberação da circulação desses veículos nos corredores entre os carros, o que potencializa a ocorrência dos “acidentes” de trânsito (Vasconcellos, 2013).
Com, praticamente, a mesma estrutura viária de décadas atrás, os conflitos são recorrentes: é a disputa (e não a convivência) que rege a utilização do espaço público. Esse cenário, somado ao individualismo presente na sociedade atual, à ausência da cidadania e da civilidade e à insuficiência da fiscalização, tem produzido caos, violência e um número cada vez maior de mortos e sequelados no trânsito.
Especialista em saúde e violência, Minayo (2004), é enfática ao afirmar que os acidentes de transporte, no Brasil, matam mais que os homicídios, suicídios e a maioria das doenças, atingindo, em grande parte, a população jovem, que morre ou fica inválida. Entretanto, destaca a especialista, “enquanto os homicídios e os suicídios provocam grande comoção social, os óbitos e as lesões no trânsito ocupam um espaço obscuro de leniência e permissividade”.
A proximidade das comemorações dos 300 anos de nossa querida capital nos convida a refletir sobre a Cuiabá que queremos para os próximos cem anos. É preciso pensar em alternativas viáveis e sustentáveis para a melhoria da mobilidade urbana, capaz de contribuir para a evolução da qualidade de vida da população, a preservação da vida e a garantia do direito ao trânsito seguro.
Nesse sentido, um dos caminhos possíveis é a aproximação e a articulação do poder público com as instituições de ensino superior, utilizando-se da pesquisa científica como princípio indutor do desenvolvimento na área de trânsito e mobilidade, capaz de subsidiar a elaboração de políticas públicas, a utilização racional de recursos e a atuação de agentes públicos. A esse respeito, temos a experiência do passado como referência, quando a Universidade Federal de Mato Grosso, conhecida e reconhecida nacional e internacionalmente como “Uniselva”, participou ativamente do desenvolvimento regional de Mato Grosso nas décadas de 70 e 80.
Que possamos, então, com as demandas que o momento atual nos apresenta e aproveitando as experiências exitosas do passado, prospectar o futuro e construir uma Cuiabá melhor para todos nós!
Renata Neves T. de Barros Freitas é especialista em Gestão da Educação no Trânsito e analista do Serviço de Trânsito do Detran
nevesre.freitas@gmail.com