O Brasil é democracia consolidada e não tem espaço para retrocesso político. Porém, em 1969 os ares eram outros e quatro deputados mato-grossenses foram cassados pelo AI-5.
Mato Grosso foi atingido pelo AI-5 logo no começo de sua vigência. Dentre os políticos cassados o mais conhecidos foi o deputado estadual Augusto Mário Vieira, da Aliança Renovadora Nacional (Arena), o partido dos militares no poder.
Esses fatos ocorridos há mais de 49 anos ainda mexem com o imaginário político mato-grossense.
Ninguém jamais saberá sobre os bastidores da cassação de Augusto Mário, que perdeu o mandato e os direitos políticos por 10 anos na tarde de 14 de fevereiro de 1969, por força de um Ato Institucional 5 (AI-5) aplicado pelo Conselho de Segurança Nacional (CSN) com o jamegão do presidente da República, marechal Artur da Costa e Silva.
Os militares não revelavam o motivo para a cassação, mas no caso de Augusto Mário ficou implícito que seria por corrupção. A sessão que o condenou também cassou dois prefeitos e 91 deputados estaduais por subversão ao regime; além dele, em Mato Grosso foram atingidos pela mesma medida de exceção os deputados estaduais Ney Ângelo, João Chama e Sebastião Nunes da Cunha.
No dia 15 de fevereiro de 1969 a mesa diretora da Assembleia, eleita na véspera, foi comunicada e recebeu ordem para proibir a entrada dos cassados no prédio onde funcionava. O presidente era Renê Barbour (Arena) e o primeiro-secretário Cleómenes Nunes da Cunha (MDB).
Bem antes da cassação Augusto Mário fazia dura oposição ao governador Pedro Pedrossian e tentava cassar seu mandato democraticamente em plenário, acusando-o de corrupção. Além da rivalidade política dos dois havia ranço regional entre ambos: o deputado era oriundo da União Democrática Nacional (UDN), que se abrigou na Arena; Pedrossian tinha berço no PSD (que foi parcialmente engolido pela Arena). Augusto Mário era cacerense e empunhava a bandeira da cuiabania contra o governador, que tinha domicílio em Campo Grande e que à época, ensaiava os primeiros passos para o desmembramento territorial mato-grossense, o que acabou acontecendo em 11 de outubro de 1977.
Diamante
Pedrossian se sentia acuado em Cuiabá. Políticos da época revelam que o governador foi a Brasília no dia 4 de fevereiro e levou duas relíquias na mala. Uma era um dossiê contra o deputado e outra um anel de diamante.
A papelada contra o parlamentar o acusava de ser procurador de quase 600 professoras fantasmas da rede pública estadual que lecionariam em escolas existentes e inexistentes. À época, apesar da insegurança jurídica com a quebra da institucionalidade, os militares diziam que sentiam urticária quando desconfiavam que algum político estivesse lesando os cofres públicos.
A jóia teria sido comprada em Poxoréu e seria um diamante muito valioso, capaz de virar a cabeça de toda mulher, principalmente da primeira-dama do Brasil, dona Iolanda Costa e Silva, que era citada enquanto madame que convivia em rodas de intelectuais, artistas e milionários.
Pedrossian teria botado o anel no dedo de dona Iolanda e a papelada em sua bolsa de grife. O resto ela se arranjaria com o “Artur” e arranjou mesmo.
A cassação de Augusto Mário o pegou de surpresa. Ele sabia que não conseguiria cassar o governador em plenário, mas imaginava que Pedrossian seria cassado pelos militares, pois contra ele também pesavam graves denúncias de maracutaias.
O que o deputado sequer imaginava é que a mulher do Artur estava fascinada com o diamante mais bonito que foi pego pras bandas da Raizinha, em Poxoréu.
Augusto Mário ficou fora da vida pública impedido de votar e ser votado.
Com a anistia Augusto Mário voltou ao cenário político. Tentou retornar ao parlamento em 1982, pelo PMDB (que havia incorporado o PP, ao qual se filiou), mas não conseguiu. Quatro anos depois reconquistou a cadeira da qual foi afastado pela força do arbítrio, mas morreu no começo da legislatura.
A cadeira de Augusto Mário foi ocupada pelo advogado e atual defensor público Moacir Gonçalves de Araújo, que era vereador por Rondonópolis e primeiro suplente de deputado peemedebista.
Em 26 de novembro de 2007, Renê Barbour, 82 anos, morreu em Cuiabá, vítima de câncer. O plenário da Assembleia Legislativa leva seu nome.
Renê Barbour foi deputado em cinco mandatos, era usineiro e pecuarista.
Eduardo Gomes – blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – Acervo do Instituto Memória do Poder Legislativo
2 – Biblioteca Nacional