O treinador Aírton Moreira, que não é aquele famoso Aírton Moreira, irmão dos também famosos Zezé Moreira e Aimoré Moreira e que fez tanto sucesso no futebol brasileiro, dirigindo o timaço do Cruzeiro dos tempos de Tostão, Natal, Zé Carlos, Wilson Piazza, Dirceu Lopes e tantos outros – fazia umas preleções esquisitas para explicar aos jogadores o que ele queria que cada um fizesse em campo na hora do vamos ver.
Uma vez, Aírton Moreira, que era técnico do Palmeiras, do Porto, ao fazer uma preleção para um jogo contra o Mixto, em 1971, chamou a atenção dos dois médios volantes do time para suas ordens: “Vocês têm que fazer como o limpador de pára-brisa de carro e rabo de vaca: não parar nunca dentro do campo, combinado?…”
De outra feita, Aírton Moreira deixou os dois ponteiros do time meio encabulados, ao dizer-lhes que queria que eles jogassem como ponteiros de relógio marcando 15 minutos para as 3 horas. Isto é: tinham que jogar abertos mesmo, nada de avançar para o meio do campo…
Mas a mais folclórica preleção do treinador foi antes de um coletivo às vésperas de mais um jogo oficial, quando Aírton Moreira, dirigindo-se ao ponteiro direito Sabarazinho, deu-lhe a seguinte instrução: “Você vai jogar bem recuado, ajudando a defesa. Quando pegar a bola em nosso campo, você parte para cima do ponteiro esquerdo deles, dribla em seguida os dois médios volantes, passa pelo quarto-zagueiro, finta o lateral esquerdo, vai na linha de fundo e centra a bola na cabeça do Carlos Macaco para ele cabecear para o gol, entendeu?”
– Seu Aírton, entender o que eu devo fazer, eu entendi direitinho, não tenho a menor dúvida. Mas o senhor já combinou com eles para deixarem eu fazer tudo o que o senhor quer que eu faça…?
Aírton Moreira teve uma passagem relativamente curta pelo Palmeiras. Em 1971, o Palmeiras jogava com o Comercial, em Campo Grande, pelo Campeonato Estadual. Um jogo muito difícil para o alviverde, que ainda no primeiro tempo ficou com 10 jogadores em campo, com a expulsão de Totó.
Terminada a primeira fase, Aírton Moreira ficou um bom tempo em campo, dando entrevistas para jornalistas e radialistas. Quando o treinador ia entrar no vestiário, acompanhado de Totó, encontrou a porta fechada. Aírton Moreira bateu tanto na porta que quase a derrubou, mas nada de alguém abri¬-la.
A porta só se abriu quando o Palmeiras saiu do vestiário para disputar o segundo tempo, já sob o comando de Juan Rollon, um técnico argentino que andava tentando arrumar uma boquinha no futebol brasileiro.
Enquanto concedia entrevistas no intervalo do jogo, Aírton Moreira era demitido pelo presidente do Palmeiras, Délio de Oliveira…
Sob o comando de Aírton Vaca Braba, o Mixto foi a Porto Velho disputar quatro jogos contra os principais clubes da capital de Rondônia.
No jogo contra o Ipiranga, campeão porto-velhense, num certo momento o lateral esquerdo Laércio perdeu a bola para o ponteiro direito do adversário. Por pouco não sai o gol do Ipiranga.
Do banco de reservas, ecoou no estádio o grito de Aírton Vaca Braba: “Vai de bico, Lércio” – ele não conseguia pronunciar o nome de Laércio. “Vai de bico… vai de… veado!…”
Foi uma gargalhada só…
Nessa excursão a Porto Velho, que durou uma semana, o Mixto ganhou do Moto Clube (7×1), do Flamengo (1×0), do Ferroviário (5×2) e do Ipiranga (2×0). O primeiro jogo foi no sábado e no domingo o jornal Alto Madeira estampou uma manchete ironizando o Moto Clube pela goleada, mas reconhecendo que o Mixto tinha dado um show de bola.
Depois do último jogo, dirigentes da Liga de Futebol de Porto Velho procuraram o Mixto para propor mais uma exibição do alvinegro contra uma seleção dos quatro clubes, que pagariam quatro vezes mais do que o Tigre tinha recebido por apresentação. O professor Ranulpho Paes de Barros recusou a proposta, alegando que o plantel estava muito cansado…
Antes da estreia do Mixto na competição, o presidente da Liga Corumbaense de Futebol, Floriano Flores, foi apresentado ao plantel mixtense. Coube ao treinador do alvinegro saudar o desportista corumbaense.
Ele fez pose e começou: “Excelentíssimo senhor Floriano Rosas…”
A saudação acabou ali mesmo, com muitos sorrisos…
PS – Reproduzido do livro Casos de todos os tempos Folclore do futebol de Mato Grosso, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino