Sem bandeiras vermelhas, nenhum adesivo partidário, sem oportunistas políticos. Sem charanga. Assim uma carreata com cerca de 160 caminhões e automóveis, e com 30 tratores pequenos e médios percorreu Jarudore de ponta a ponta na tarde deste domingo, 21 de julho. Foi um manifesto pacífico na tentativa de sacudir autoridades em defesa da população urbana e rural que mora naquele distrito de Poxoréu.
As casas vazias, com seus moradores nas calçadas ou participando da carreata, testemunharam a passagem dos carros e tratores, alguns buzinando, como se o som das buzinas fosse um canto de esperança. Sob aplausos o manifesto cruzou Jarudore levantando a poeira vermelha característica dessa época do ano.
Não havia música alegre na carreata. Em cada rosto a marca da dor, da preocupação a um passo do desespero. Porém, em cada olhar, uma chama de esperança. Sob tensão os tratores e carros avançaram. De um e outro lado, nas calçadas, vozes gritavam, “Jarudore é nossa!”. Velhos, donas de casa, estudantes, professores, peões, sitiantes de mãos calejadas, comerciantes, motoristas, servidores públicos, líderes religiosos, enfim, o povo do distrito e de Poxoréu, que é a sede do município, numa corrente de pensamento positivo estava nas ruas buscando reconhecimento, respeito e apoio do governo.
Carlos Antônio do Carmo, o Mineiro, líder dos moradores de Jarudore, estava na carreata, que contou com a participação do prefeito do município Nelson Paim (PDT) e outras autoridades municipais. Sereno, Mineiro pedia que todos orassem a Deus e que mantivessem a calma. Paim colocou a prefeitura em defesa da causa de seu distrito. Trata-se de uma luta que começou em 2006, quando um pequeno grupo de índios bororos aldeados na terra indígena Sangradouro/Volta Grande e liderados pela cacique Maria Aparecida Tore Ekureudo invadiu um sítio temporariamente vazio. Desde então, a população sofre muitos tipos de pressão.
A carreata foi um ato em defesa da cidadania, do direito à vida da população que ali reside mansa e pacificamente desde 1945, quando aquele lugar era uma embrionária vila que se formava ao lado de uma estação telegráfica construída em 1926 pelo herói Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon em sua política de integração nacional. Em 26 de junho de 1947 o governador Arnaldo Estevão de Figueiredo criou a Escola Estadual Franklin Cassiano da Silva, como parte da política de instalação de escolas em pontos estratégicos na região de Rondonópolis, para assegurar educação aos filhos dos colonos pioneiros que ocupavam o vazio demográfico nas calhas dos rios São Lourenço e Vermelho. Essa escola é uma das referências do lugar.
A carreata também tinha o objetivo de chamar a atenção para o prazo de desintrusão de praticamente toda a área de Jarudore, de 4.706 hectares, concedido em 28 de junho pelo juiz Victor de Carvalho Saboya Albuquerque, da 1ª Vara Federal em Rondonópolis. O juiz estipulou prazos de 45 e 90 dias para que os moradores deixem suas casas. O calendário avança e as famílias tentam reversão judicial.
A carreata passou. Os veículos foram estacionados. As pessoas se reuniram. Não havia muito pra dizer. A comunicação ficava praticamente por conta do olhar interrogativo e agora?
Um a um os moradores voltaram para o refugio de seus lares, que somente Deus sabe até quando será seus. Amanhã será mais um dia de agonia, mas sem perder a esperança para os 1.650 moradores de uma das mais antigas comunidades mato-grossenses, formada há 74 anos no entorno de uma estação telegráfica à margem do rio Vermelho, num ponto equidistante entre Rondonópolis e Poxoréu.
Eduardo Gomes de Andrade – blogdoeduardogomes
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