Somos tomados de muitas cores, de muitos jeitos, de muitos sentimentos. Somos é muito misturados, mesmo com a nossa vocação de classificar, categorizar, relacionar, catalogar, dividir, rotular e separar.
A mim parece não haver uma separação estanque, isolada, barrada entre pigmentações, jeitos e sentimentos. Não há pastos demarcados na seara humana.
Meus olhos coloridos me lembram que somos brotados de pessoinhas, habitados por trejeitos, movimentos variados, sentimentos desalinhados, baralhados… Não há em mim e em você, leitor atento, pureza; não há apenas candura e castidade. Não somos transparentes, não alterados pela presença de elementos estranhos. E como disse a menina de quatro anos: não temos uma só cor!!!
Só existe uma raça: a humana. Somos todos pessoas, gentes!! Nós permanecemos feitos da mesma matéria. A divisão dos seres humanos em raças resulta, como já foi dito por todos, de um processo de conteúdo político-social, originado da intolerância dos homens.
Se nos detivermos em nossa imagem é fácil ver, o preconceito é subjetivo, interior; a discriminação é a exteriorização desse medo, dessa culpa, dessa angustia por meio da prática de atos vazios.
A consciência negra, à primeira vista, em um dia para pensar nisso, é uma expressão que designa a percepção histórica e cultural que os negros têm de si e em nossa sociedade. Entretanto, em cada cor diferente que venha nos misturar, devemos recordar – do latim re-cordis, tornar a passar pelo coração – e admitir a percepção de que eu, você, como todo brasileiro, somos brotados de pessoas: pretos, amarelos, pardos, indígenas, brancos … muita gente.
Em 1976, o IBGE fez uma pesquisa no país, sem categorias predefinidas, foram coletadas 136 cores diferentes, autodeclaradas pela população.
As contribuições de todas as culturas para a construção da personalidade brasileira são inegáveis. Elas estão em toda parte; em todos nós. Assimilemos tudo isso.
Não somos apenas o que pensamos ser. “Dizemos que somos tolerantes com as diferenças. Mas ser-se tolerante é ainda insuficiente. É preciso aceitar que a maior parte das diferenças foi inventada e que o Outro (o outro sexo, a outra raça, a outra etnia) existe sempre dentro de nós”, escreveu Mia couto, e é o que encerra esses dizeres nesse pequeno dia de consciência que tive.
Emanuel Filartiga Escalante Ribeiro é promotor de Justiça em Mato Grosso