Primeiro o patrimônio; depois, se possível, novas conquistas

Mato Grosso enfrenta período turvo sob vários aspectos. Categorias que vivem em redomas, distantes da realidade social, e formadores de opinião em redes sociais, que conhecem problemas até a profundidade de um pires tentam prevalecer sobre o conjunto populacional.

Preocupante sob todos os aspectos é a revelação da existência de estudos – longe do cidadão – para se avaliar a possibilidade ou não da desativação de 14 das 79 comarcas de Mato Grosso. Além disso, o governo anuncia o fechamento de 16 delegacias da Polícia Civil em pequenos e médios municípios.

Estamos num estranho ciclo de pardalização – a concentração do Estado nas maiores cidades e sua ausência absoluta, ou quase isso, nas pequenas localidades.

O encolhimento do Estado é justificado por seus defensores sob o argumento da falta de recursos para mantê-lo cumprindo deu dever constitucional.

Pois bem! Em meio a esse Estado que se prepara para ser ausente nas pequenas cidades, o Ministério Público anuncia a criação de quatro unidades descentralizadas do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), em Barra do Garças, Cáceres, Rondonópolis e Sorriso, que são polos regionais geograficamente bem distribuídos.

Meu Deus! Se faltam recursos para o MP continuar atuando nas 79 comarcas, como sobram fundos para a criação dos Gaecos regionais? Como se explica isso, na prática, fora da redoma, uma vez que toda estrutura pública é mantida pelo contribuinte, independentemente dos rótulos ou rubricas que se queiram dar às fontes de receitas?

O recém-empossado chefe do MP, José Antônio Borges, não deveria tomar uma decisão de tamanha magnitude sem antes ouvir Mato Grosso. Não parece prudente optar por quatro unidades regionais de Gaeco numa terra onde a melhor bandeira para o MP seria a continuidade do funcionamento das 14 comarcas ameaçadas.

Alguém pode argumentar: mesmo que o MP não queira, o Judiciário pode decretar a suspensão das 14 comarcas. Esse argumento seria bom estímulo para se pressionar o TJ a rever seu posicionamento.

Gaeco é desdobramento do MP. Em toda comarca o bom promotor personifica o Gaeco. Claro que precisamos do máximo de desempenho investigativo por parte dos promotores e da estrutura do Estado nessa esfera, mas, no momento, o mais importante é a continuidade do funcionamento das 14 comarcas, que infelizmente são vistas como meros números ou negativos ou próximos disso quando o assunto é produtividade forense.

Que o MP saia da redoma (e o Judiciário também) e que veja a pequena comarca como sentinela do Estado em defesa do cidadão, da ordem pública, do meio ambiente e de todos os direitos individuais, coletivos e difusos. Que essa visão nunca seja distorcida a tal ponto de priorizar os recursos públicos em detrimento do ser humano.

Mais que o Gaeco é o Ministério Público. Mais que o MP é o Estado. Mais que o Estado é o cidadão. Que esse entendimento seja adotado por procuradores e promotores de Justiça. Que eles entrem em cena pelas 14 comarcas ameaçadas de extinção e que pressionem José Antônio Borges por prudência, coerência e praticidade. Não podemos avalizar a aventura da criação de ilhas de excelências investigativas paralelamente ao abandono do arquipélago do vácuo do Estado, no mar da incapacidade administrativa criado na redoma nessa terra onde quase todos garantem o pão de cada dia com seus parcos lucros ou salários que nem de longe lembram os penduricalhos que engordam de tal modo salários dos poderosos a ponto de transformar o teto salarial constitucional em algo abstrato.

Preservemos nosso patrimônio e, se possível, façamos novas conquistas

Eduardo Gomes – editor de boamdia

FOTO: Ilustrativa

 

 

 

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