Minas é maior que sua dor

A tragédia em Brumadinho
Recentemente, em Mato Grosso, o ex-prefeito de Juína, Hermes Bergamin, morreu soterrado num garimpo

Dizem que aquele Estado tem um coração de ouro num peito de ferro. Até essa definição nascida da sabedoria popular identifica as Alterosas pelo seu verdadeiro DNA: o garimpo e a mineração. Um lugar assim, transbordando de minérios não poderia mesmo ter outro nome senão Minas Gerais. 

O ouro, esse metal cobiçado mundo afora desde o começo da civilização, foi quem motivou a Inconfidência Mineira, que brotou como grito silencioso entre quatro paredes contra a ameaça da retomada da Derrama, que sugava os garimpeiros e levava para a Coroa Portuguesa, pela Estrada Real, 20% do que extraíam. A Inconfidência foi sufocada. Dela ganhamos o Protomártir Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes – símbolo da brasilidade.

No alvorecer da República, em 1902, Minas nos deu Juscelino Kubitschek e Carlos Drummond de Andrade. Ambos nascidos em municípios ligados aos minerais. O estadista, em Diamantina. O Poeta em Itabira.

Não somente os municípios de Juscelino e Drummond receberam seus nomes por sua ligação com o mundo mineral. O mesmo aconteceu com Pedra Dourada, Pedralva, Rubim, Grão Mogol, Pedra do Anta, Pedra do Indaiá, Itabirito, Cristais, Esmeraldas, Ouro Fino, Ouro Preto, Berilo, Grupiara, Serra do Salitre, Crisolita, São José da Safira, Rubelita, Pedras de Maria da Cruz, Malacacheta, Cascalho Rico, Ouro Verde de Minas, Pedra Azul, Pedra Bonita, Prata, Pratápolis, Pratinha,  Turmalina e outros, além de distritos, a exemplo de Topázio, em Teófilo Otoni.

Minas nasceu do garimpo. Sua economia diversificou-se, mas nem por isso descartou o setor mineral quer seja direta ou indiretamente. O que é a Usiminas?  A Acesita, que virou Aperam South America? A BelgoMineira Bekaert Artefatos de Arame? E a Fiat, que se instalou em Betim por sua proximidade com o aço que abastece sua linha de montagem? E os grandes reflorestamentos em eucaliptos?

Enfim, o que é o Vale do Aço? E a geração de centenas de milhares e milhares de empregos diretos e indiretos na cadeia mineral. da mina ao transporte culminando com a industrialização que resulta no ferro, no aço e tantos outros produtos? E a Estrada de Ferro Vitória a Minas, que em descomunais composições escoa para o Espírito Santo o minério de ferro para as siderúrgicas do Japão e outros cantos do mundo?

Minas é a soma de lavra com parque sídero-metalúrgico onde vive o povo mais politizado do Brasil. É também a terra que começa a sofrer tragédias provocada por negligência humana, irresponsabilidade governamental, ausência de fiscalização e fatalidade.

Primeiro choramos a tragédia de Bento Rodrigues, na histórica Mariana, no Vale do Rio Doce, cujas águas chegam ao Atlântico pelo Espírito Santo, num curso paralelo ao da Estrada de Ferro Vitória a Minas.

Agora, com o olhar voltado para Brumadinho ainda contamos mortos, vivemos a angústia por centenas de desaparecidos, com o coração na mão acompanhamos os trabalhos de resgate dos bravos Bombeiros, policiais, militares, socorristas e voluntários.

Duas tragédias e uma gigante mundial da mineração, a Vale, entrelaçadas.

No primeiro caso, a barragem de rejeitos do Fundão rompeu-se em 5 de novembro de 2015 soterrando a sede do distrito de Bento Rodrigues. O saldo: 18 mortos e um desaparecido. Essa barragem é da Samarco Mineração, da Vale e a anglo-australiana BHP Billiton.

Agora, em 25 deste janeiro, em Brumadinho, na Grande BH, rompe-se a barragem de conteção de rejeitos da mina Córrego do Feijão, no córrego do mesmo nome.  A  barragem foi construída em 1976 e desativada em 2014.  Sua proprietária, a Vale. O número de desaparecidos e mortos ainda não pode ser quantificado, mas estima-se que mais de 300 funcionários da mineradora e pessoas que se encontravam fora da área de mineração tenham sido levados pela enxurrada de água e lama.

Mineração e garimpo são atividades de risco no mundo inteiro. Em Mato Grosso, aos 54 anos, Hermes Bergamin morreu em 14 de novembro de 2018, soterrado num de seus garimpos de diamante na localidade de Terra Roxa, município de Juína. Seu corpo foi velado e sepultado naquela cidade. Empresário rural, minerador e político, Bergamin foi prefeito de Juína de 2013 a 2016.

Notícias de soterramento de mineiros são corriqueiras. Porém, uma tragédia da dimensão de Brumadinho  é excepcionalidade. Pior: Minas com suas barragens e extração subterrânea  fica em permanente estado de risco.

Que a mão de Deus continue sobre Minas. Que a mineração e o garimpo continuem, não somente por tradição mineira, mas por seu resultado para a economia e a melhora das condições sociais de milhares de famílias. Porém, que os exemplos – tristes casos – de Bento Rodrigues e Brumadinho façam surgir novo modelo de licenciamento (inclusive de sua renovação) e fiscalização em defesa dos conterrâneos e coestaduanos de Tiradentes, Juscelino e Drummond. Mas, que isso aconteça de modo restrito aos meios republicanos, com acompanhamento pela população, mas sem ingerência das ONGs abutres que já começam a explorar a dor de Minas fazendo da mesma uma pegajosa bandeira.

O momento é de chorar os mineiros tombados na mineração, mas a vida continua porque Minas é maior que sua dor.

Eduardo Gomes de Andrade – blogdoeduardogomes

FOTO: Washington Alves – Reuters

 

 

 

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Comentários (1)
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  • Maura Lima

    Sr. Eduardo o texto do senhor prende a leitura e é muito emocionante