Numa delação costurada com paciência, quando estava preso em Cuiabá, o ex-governador Silval Barbosa denunciou em agosto de 2017 à procuradora da República Vanessa Christina Marconi Zago Ribeiro Scarmagnani que deputados estaduais, suplentes de deputados estaduais ex-deputados recebiam mensalinho. A delação foi homologada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, que a chamou de “monstruosa”.
Além dos depoimentos, apresentação de documentos e supostas provas, Silval exibiu vídeos de parlamentares e ex-parlamentares recebendo dinheiro ou supostamente negociando liberação de propinas com seu ex-chefe de Gabinete, Sílvio Corrêa.
O ex-governador disse mais.
Citou que tal prática é do conhecimento dele desde 1999, quando foi deputado estadual, e que eleição da mesa diretora da Assembleia é verdadeiro balcão de negócios com candidatos comprando e deputados vendendo votos.
Também revelou que cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE) teriam recebido R$ 53 milhões em propinas para aprovarem suas contas relativas ao projeto da Copa do Mundo de 2014 e ao projeto Mato Grosso Integrado, Sustentável e Competitivo (MT Integrado). Além disso Silval citou que seu antecessor, o agora ex-senador licenciado e ex-ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PP) teria tentado obstruir a justiça pagando ao ex-secretário de Fazenda Eder Moraes, para que ele mudasse um depoimento sobre a compra de vaga do conselheiro Alencar Soares, no TCE, para o conselheiro Sérgio Ricardo.
A lista de Silval é extensa.
Dela resultou uma operação da Polícia Federal, em 15 de setembro de 2017, que cumpriu mandados de busca e apreensão na Assembleia, no TCE e em residências de delatados em Cuiabá,Rondonópolis, Juara e Brasília.
Atendendo ao Ministério Público Federal (MPF) Fux afastou os conselheiros Antônio Joaquim, José Carlos Novelli, Waldir Teis, Valter Albano e Sérgio Ricardo.
Como seu desdobramento, o MPF pediu a prisão preventiva do então vice-presidente da Assembleia, Gilmar Fabris (PSD) por crime de obstrução da justiça.
O motivo da prisão foi que Fabris deixou seu apartamento em Cuiabá, pela manhã, trajando pijama, momentos antes da chegada da Polícia Federal que ali cumpriria mandados na operação que investiga o caso.
O deputado levou consigo uma pasta onde poderiam estar documentos de interesse da investigação.
A prisão de Fabris foi pedida pelo MPF e ele se apresentou na Superintendência da PF onde foi autuado e permaneceu preso em Cuiabá por 40 dias, até que a Assembleia decidisse em votação, por unanimidade, sua soltura.
Fabris atualmente não tem mandato. Em 2018 ele concorreu à reeleição, sub judice, teve votação suficiente para se reeleger, mas a Justiça Eleitoral não validou o registro de sua candidatura pelo fato de o mesmo ter sido alcançado pela Lei Ficha Limpa.
Com o impedimento de Fabris, a cadeira que seria dele foi ocupada por Allan Kardec (PDT), que concorreu pela coligação que incluía o PSD.
A delação de Silval é ampla, mas não abalou os meios políticos mato-grossenses, onde o que não falta é escândalo.
Apesar do envolvimento de grande número de deputados e ex-deputados, a Assembleia nunca se pronunciou sobre o caso.
Segundo Silval, entre 2011 e 2014 os deputados recebiam mensalinho.
Em 2009 quando essa prática teria começado, o pagamento mensal seria de R$ 3 mil, mas aos poucos foi subindo.
Em 2014 cada um dos envolvidos embolsaria R$ 50 mil mensais o que resultava em R$ 600 mil anualmente, com direito a 13º no montante de R$ 100 mil.
Uma corrente na Assembleia com apoio de jornalistas tenta desqualificar a delação de Silval.
Alexandre é procurador do Estado e desempenha sua função normalmente.
A delação de Silval é rebatida e até os vídeos gravados com entrega dinheiro a acusados são rebatidos. As imagens mostram José Domingos Fraga, Alexandre Cesar, Luciane Bezerra, Hermínio Barreto, Ezequiel Fonseca, Emanuel Pinheiro, Antônio Azambuja e Airton Português embolsando maços de cédulas. Fabris e Baiano Filho aparecem nas imagens discutindo sobre recursos financeiros.
Luciane foi prefeita de Juara pelo PSB, mas perdeu o mandato sob a acusação de improbidade administrativa.
Barreto era suplente de deputado federal pelo PR e morreu num acidente na BR-364 nas proximidades de Jaciara.
Ezequiel Fonseca foi deputado federal pelo PP, tentou a reeeleição, mas ficou pelo caminho.
José Domingos (PSD), Baiano (PSDB) e Fabris (PSDD) eram deputados estaduais. José Domingos e Baiano não disputaram as eleições em 2018.
Emanuel é prefeito de Cuiabá pelo MDB.
Azambuja e Português não exercem mandato; o primeiro é médico.
No recebimento do dinheiro aconteceram cenas grotescas.
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara de Cuiabá (CPI) foi instalada para apurar o caso, mas a mesma foi abafada, volatilizada e caiu na galeria do esquecimento. A Câmara mantém uma relação de quase absoluta subserviência com Emanuel e o blinda de todas as maneiras. Essa blindagem é feita pela maioria dos vereadores, todos contentes com o polpudo e generoso duodécimo daquele Legislativo, de R$ 57 milhões, que o prefeito lhe transfere sem sequer pestanejar.
Luciane pediu que lhe fosse dado o que seria o mensalinho do deputado José Riva.
Português foi ajudado no recebimento por sua irmã e ex-secretária de Turismo de Mato Grosso Vanice Marques.
José Domingos, demonstrando desenvoltura, ensinou Ezequiel a camuflar o dinheiro para deixar o recinto.
Todos os filmados recebendo dinheiro juram absoluta e cândida inocência.
OPERAÇÃO – Para levantar o mensalinho Silval pedia propina de 3% a 4% a construtoras de obras, principalmente rodoviárias. Segundo ele, a dinheirama era repassada pelas empresas Guaxe e Encomind, 3 Irmãos Engenharia, Centro-Oeste Construtora, Dínamo Construtora, Rio Tocantins, Destesa Engenharia e Construção, OK Construtora e Serviços, JM Terraplanagem e Construção, Francisco Marino, Camargo Campos, H.L. Construtora, Agrimat Engenharia e Empreendimentos, Campesato, Apuí Construtora e Base Dupla.
Figuras subalternas e ligadas a Silval tratavam do recolhimento da propina. O ex-governador explicou que pedia propina ao empresariado justificando que se tratava de dinheiro para pagamento de campanhas políticas – esse chavão é marca registrada em delações dessa natureza.
Lista dos citados enquanto mensaleiros
Deputado estadual Dilmar Dal’Bosco (DEM)
Ex-deputado estadual Wagner Ramos (PSDB)
Ex-deputado federal Ezequiel Fonseca (PP)
Ex-deputado estadual Antônio Azambuja
Ex-deputado estadual José Domingos Fraga (PSD)
Prefeito de Cuiabá Emanuel Pinheiro (PMDB)
Ex-deputado estadual Ademir Brunetto (PT)
Ex-deputado estadual José Riva (sem partido)
Ex-deputado estadual João Malheiros (PR)
Ex-deputado estadual Pedro Satélite (PSD)
Ex-deputado estadual Airton Português (PSD)
Ex-prefeita de Juara Luciane Bezerra (PSB)
Deputado estadual Sebastião Rezende (PSC)
Ex-deputado estadual Mauro Savi (PSB)
Ex-deputado estadual Guilherme Maluf (PSDB) e agora conselheiro do TCE
Ex-deputado estadual Walter Rabello (falecido)
Ex-deputado estadual Baiano Filho (PSDB)
Ex-suplente de deputado federal Hermínio Barreto (PR), falecido.
Ex-deputada estadual Teté Bezerra (PMDB)
Ex-deputado estadual Luiz Marinho (PTB)
Ex-deputado estadual Alexandre Cesar (PT), que é procurador do Estado.
Deputado estadual Romoaldo Júnior (PMDB)
Deputado estadual Ondanir Bortolini, o Nininho (PSD)
Ex-deputado estadual Gilmar Fabris (PSD)
SACO SEM FUNDO
Não apenas Silval delatou. Foram quatro delações individuais, mas na esfera familiar do ex-governador: de sua mulher e ex-secretária de Trabalho e Assistência Social, Roseli Barbosa; seu filho e médico Rodrigo Barbosa; e seu irmão o pecuarista Antonio Barbosa, o Toninho.
Rodrigo delatou que após seu pai deixar o governo e quando o mesmo se encontrava preso, teria sido procurado por Romoaldo em busca de dinheiro para aprovar as contas do governo relativas ao anos de 2014. Romoaldo agiria como se fosse lobista de Wagner, que era o relator da prestação de contas.
O relato de Rodrigo é detalhado e fortalecido por uma gravação supostamente feita em 16 de dezembro de 2015 por Toninho. Nela, o filho do ex-governador e Romoaldo negociam valores da propina. Em suma Wagner teria embolsado R$ 250 mil; e o à epoca deputdo estadual Silvano Amaral (MDB) e José Domingos,R$ 200 mil cada. Silvano teria botado a mão na dinheirama, porque Rodrigo teria descoberto que ele faria estardalhaço na Assembleia sobre as contas.
Silvano não disputou a reeleição e ficou pelo caminho, com 18.068 votos. Como prêmio de consolação, o governador e seu aliado político Mauro Mendes (DEM) o nomeou secretário de Estado de Agricultura Familiar.
Todos os delatados e citados negam. Nenhum assume envolvimento com Silval. Todos distribuíram notas onde se justificam.
Eduardo Gomes – blogdoeduardogomes
FOTOS:
! – Secretaria de Comunicação do Governo
2 a 6, 8 e 9- Secretaria de Comunicação da Assembleia
7 – Sobre imagem da TV Globo