Uma boa notícia e um grande susto. No dia 9, um levantamento da Conab mostrou que Mato Grosso responderá por 28,1% da produção nacional de cereais, leguminosas e oleaginosas. Seis dias depois, em Pyongyang, a Coreia do Norte celebrava o Dia do Sol – data em que no ano de 1912 nasceu seu líder e fundador daquele estado comunista, Kim Il-sung, mas o ditador Kim Jong-un, netinho do endeusado politicamente pai do país, não compareceu à festividade. Sobre o Doril do mandachuva, nem uma nota sequer na KCNA, a agência de notícia do regime sanguinário, fechado e isolado do mundo. Dias depois a mídia internacional noticia que o netinho teria se submetido a uma cirurgia cardíaca e que seu quadro de saúde não seria bom.
O que tem a ver o afastamento ou até mesmo eventual morte do netinho e herdeiro da Coreia do Norte com a economia mato-grossense, se a distância em linha reta entre Pyongyang e Cuiabá é de 17.400 quilômetros, e aquele país não importa um grão de soja ou caroço de milho ou de arroz produzido na Terra de Rondon?
– É uma encruzilhada. se o netinho se recuperar, o poder continua em suas mãos e nada muda. Porém, se ele partir dessa pra melhor, o cenário em boa parte da Ásia será o mais dramático possível para milhares, e quem sabe, milhões de cidadãos. Longe de teoria apocalíptica, mas ninguém pode sonhar com transição pacífica do poder em Pyongyang. Sem Kim Jong-un, o generalato e a cúpula comunista travarão verdadeira guerra de foice no escuro. O poder real é do netinho. Em termos institucionais abstratos há duas figuras não na linha sucessória direta, mas na importância da hierarquia do Partido Comunista: Choe Ryong-hae, presidente da Suprema Assembleia Popular; e Kim Jae-ryong, o chanceler.
Naturalmente alguém assumirá a chefia do Estado, e para se consolidar terá que levantar o nacionalismo – e nada melhor do que uma guerra para tanto.
– Guerra? Isso mesmo. Num primeiro momento pode se pensar num confronto Norte-Sul, com envolvimento do Japão e Estados Unidos. Num outro cenário, com a China e a Rússia invadindo a vizinha Coreia do Norte.
No primeiro cenário o mercado asiático importador de commodities agrícolas mato-grossenses entraria em colapso total. Não vejo a questão primordialmente pelo aspecto econômico. Primeiro temo pelas vidas que estarão à mercê das armas, inclusive atômicas. Porém, não se pode desconsiderar que no momento em que a China sai fortalecida da pandemia do novo coronavírus, com perspectiva de aumentar sua importação agropecuária, a Península Coreana poderá botar tudo a perder pra Mato Grosso.
Caso surja convulsão interna norte-coreana e ela se avoluma, a China e a Rússia tratarão de ocuparem fatias ao Norte, expulsando seus moradores para a Coreia do Sul. Tudo isso num cenário macabro de fazer o horror em Hirohima e Nagasaki virar briguinha de rua.
A Coreia do Norte tem um dos maiores exércitos do mundo e seu arsenal atômico teria entre 50 e 60 ogivas, segundo analistas militares. O vizinho ao Sul é armado convencionalmente até os dentes e ao seu lado, as aliadas bases dos Estados Unidos na região e o parceiro Japão.
A proximidade dessa área com A China, Rússia, Vietnam, Singapura, Hong Kong, Malásia, Tailândia, Indonésia e outros grandes importadores mato-grossenses amplia o quadro da clientela que deverá sair da balança comercial por um bom período. Mato Grosso tem perfil exportador e produz em escala para tanto. Quando os agricultores colherem a safrinha e revisarem seu maquinário no Nortão, Chapadão do Parecis, Araguaia, faixa de fronteira e no polo de Rondonópolis para a semeadura da soja, após as primeiras chuvas, a realidade sobre o netinho estará estampada. Se ele estiver no cargo, com seu sorriso cínico e maléfico, nossos produtores rurais poderão cultivar em paz e na quantidade que estima a Conab; em caso contrário, não. E somente Deus sabe o que será da nossa economia, que no ano passado exportou US$ 16,6 bilhões (FOB);
O sorriso do netinho é uma de suas marcas – as outras são uisque e cigarro – e não se apagou nem mesmo em dois momentos de extrema violência familiar: em 12 de dezembro de 2013, quando executou com um disparo de canhão, seu tio, o general Jang Song-thaek, de 67 anos, que era considerado o número 2 no poder e seu mentor. E em 13 de fevereiro de 2017, quando sua Inteligência assassinou seu meio-irmão Kim Jong Nam, no aeroporto em Kuala Lumpur, na Malásia, ao atingir seu rosto com o letal agente nervoso VX. Se ele continuar sorrindo, ouviremos de guerra e rumores de guerra, como nos diz a Bíblia. Em caso contrário, não veremos mais, nem mesmo sua bela e jovem irmã, Kim Yo-Jong, que exerce influente papel no regime familiar em Pyongyang.
A misteriosa Coreia do Norte, que não importa de Mato Grosso e que sequer sabe de sua existência pode dar um tiro de letargia temporal na sua saudável economia, caso o coração do netinho pare de bater e ele se junte ao vovô e ao papai Kim Jong-il, que foi o segundo da família a ser dono do país.
Ameaça real
O cenário na Península Coreana é altamente precupante com Kim Jong-un vivo. A qualquer momento pode ser retomada a guerra técnicamente em curso entre as duas Coreia. Sem ele, além de um leque de possibilidade de conflitos de grandes proporções ainda há outro risco, esse que deixa Donald Trump com os cabelos de milho em pé, e que nem mesmo Ian Fleming seria capaz de imaginar: sem o netinho e com o poder esfacelado, militares poderiam vender bombas atômicas pra terroristas do fundamentalismo islâmico, que nadam em dinheiro, e dinheiro é sonho de consumo de 11 entre 10 norte-coreanos.
A possibilidade que tal aconteça faz da Península Coreana uma verdadeira casa de espiões do Mossad. Benjamin Netanyahu não hesitaria um segundo sequer em atacar vendedores e compradores, pra tanto lançando mão de seu arsenal nuclear com mais de 200 ogivas permanentemente apontadas para o Irã, mas que podem ser direcionadas a outro alvo em qualquer canto do mundo, o que também não seria nada bom pra nenhum grão de soja, caroço de milho, pluma de algodão, carne bovina e suína, frango e óleo de soja made in Mato Grosso.,
Eduardo Gomes é jornalista é estudioso sobre a Península Coreana
FOTOS:
!, 3 e 4 – KCNA
2 – Arquivo blogdoeduardogomes em Sorriso
5 – BBC News Brasil em arquivo