Este é o 21º e último capítulo da série UM NOME AO SENADO, que focaliza os pré-candidatos ao Senado para preenchimento da vaga aberta com a cassação da senadora Selma Arruda (PODE), pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 10 de dezembro do ano passado, por crimes de abuso de poder econômico e caixa 2. Juntamente com a senadora foram cassados seus suplentes Beto Possamai e Clerie Fabiana (ambos do PSL).
Neurilan Fraga, engenheiro agrônomo e presidente da AMM é pré-candidato pelo PL do senador Wellington Fagundes.
Neurilan é cuiabano nascido no Hospital Geral Universitário, filho do goiano José Domingos Fraga com a cearense dona Andrelina. Sua família residia em Nortelândia, mas ele veio para Cuiabá em busca de estudo. Foi aluno da Escola Nilo Póvoas e do Colégio São Gonçalo. Aos 16 anos uma leucemia levou seu pai e ele se tornou arrimo de família cuidando de uma perradinha de cinco irmãos. Pobre, de família pobre, conseguiu emprego para trabalhar na limpeza de uma agência do Bradesco. e mais tarde foi pesquisador do IBGE. Aprovado no vestibular de Agronomia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) conciliava o curso com seu novo emprego: professor no São Gonçalo e em cursinho pré-vestibular. Também deu duro no Instituto de Geografia do Estado, na Comissão Estadual de Planejamento da Agricultura e no Programa Polonoroeste.
Com a vida menos brava após o diploma de agrônomo, fez especialização em Desenvolvimento Regional, pelo Programa das Nações Unidas para o Deenvolvimento (PNUD), em Salvador (BA) , e em Comercialização de Commodities, pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), em Piracicaba (SP). É mestre em Economia Rural pela Universidade Federal da Paraíba, campus de Campina Grande.
Blairo Maggi se elegeu governador em 2002 e Neurilan integrou sua equipe de governo na Secretaria de Projetos Estratégicos, da qual foi secretário-adjunto; o secretário era Clóvis Vettorato. Neurilan criou o projeto dos Consórcios Intermunicipais de Desenvolvimento Regional.
Em busca do poder
Em 2004, com o currículo debaixo do braço, apoiado pelo irmão José Domingos Fraga Filho e com as bençãos de Blairo e um empurrão do Grupo Camargo Corrêa – maior agropecuária do município – Neurilan (PFL) saiu candidato a prefeito de Nortelândia. Saiu e perdeu para Vilson Ascari (PP). A derrota foi apertada, apenas 63 votos, mas o suficiente para adiar em quatro anos seu projeto de poder.
O irmão, José Domingos, era prefeito de Sorisso e tinha apoio de grandes produtores rurais daquele município. O mano não economizava na campanha de Neurilan, que contou inclusive com show de Milionário & José Rico, mas não adiantou.
José Domingos foi vereador e prefeito em três mandatos em Sorriso. Mas tarde, em 2006 se elegeu deputado estadual e se reelegeu em 2010 e 2014. Além disso, foi secretário estadual de Agricultura. O irmão de Neurilan estava cotado para ser nomeado conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), quando a TV Globo em 2017 exibiu vídeos de deputados estaduais recebendo pacotes de dinheiro de Sílvio Corrêa, então chefe de Gabinete do à época governador Silval Barbosa. José Domingos foi um dos felizardos e protagonizou uma cena terrível: com a ajuda de Sílvio colocou a dinheirama numa caixa de papelão sob o olhar de felicidade do também deputado Ezequiel Fonseca a quem se destinava parte dos pacotes de reais. Realmente um papelão.
Em delação homologada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, Silval informou que o dinheiro recebido pelos deputados seria propina. José Domingos nega, mas o vídeo lhe causou duas derrotas: saiu do páreo na indicação ao TCE e não disputou novo mandato.
Agora vai!
Em 2008, novamente apoiado pelo mano José Domingos, Neurilan disputou a prefeitura de Nortelândia. Disputou e venceu. Ao seu lado, também estava o bom e fiel Grupo Camargo Corrêa. Não tinha como não dar certo, pois além a estrutura sua filiação era a mesma de Blairo – PR. Seu vice foi o tucano Antônio Meira. Sua coligação, “Para desenvolver Nortelândia” era verdadeira sopa de siglas: PR, PSDB, DEM, PMDB, PPS, PTB, PSB e PHS. O placar foi confortável: Neurilan 3.569 votos e Rodomildo Rodrigues (PP), 1.297. De quebra o prefeito elegeu sete dos nove vereadores do município. Com o resultado fogos inundaram a noite em Sorriso e em Nortelândia incluindo os 50% da zona rural que pertencem ao generoso Grupo Camargo Corrêa.
DE NOVO – Em 2012, quando o mano José Domingos cumpria o segundo mandato consecutivo de deputado estadual, Neurilan se reelegeu prefeito pelo PSD tendo em sua chapa o vice Valter Dada (DEM) pela coligação “Nortelândia cada vez melhor” formada pelo PSD, DEM, PP, PDT, PMDB e PRP. O resultado o manteve no cargo. Recebeu 2.509 votos, e seu adversário Gervázio Quinteiro (PSB) 1.745. O vice de Quinteiro foi Luiz Fernando Falcão, o Nando (PR).
Muito prazer, Neurilan!
Oficialmente foi assim: político de expressão municipal na pequena Nortelândia, Neurilan (PSD) se apresentou a Mato Grosso em 18 de dezembro de 2014 ao ser eleito presidente da AMM para substituir seu correligionário Valdecir Luiz Colle, o Chiquinho do Posto. Mas, nos bastidores, onde quase tudo acontece no mundo político, a verdade é bem outra. Leiam no rodapé um capítulo do livro “O ciclo de fogo – biografia não autorizada de Riva“, publicado em 2016, que mergulha na eleição de Neurilan pra presidente da AMM em 2014.
GHOST – Neurilan chegou ao poder na AMM cercado pela admiração de colegas prefeitos. Afinal, ele derrotou ninguém menos do que Taques. A admiração também tinha outra vertente – essa, muito importante. Riva era cadáver político no velório e seus seguidores ainda não sentiam sua ausência nem duvidavam de sua força pra tudo. Insepulto e no post mortem o mandachuva continuava irradiando liderança sobre o chamado grupo das Viúvas de Riva. Neurilan andava nas nuvens, paparicado por prefeitos.
Nada nem ninguém foi tão nocivo a Mato Grosso quanto Taques. Seu governo caloteiro atrasava os repasses constitucionais aos municípios, levava o transporte escolar ao estrangulamento, feria de morte os programas de saúde. Com fama de durão e vingativo, Taques não enfrentava resistência por parte dos prefeitos. Neurilan viu nisso a possibilidade de conquistar espaço político. Não deu outra! O presidente da AMM questionava o governador, fazia barulho, mas nao era louco pra judicializar a relação município-governo. Assim nasceu um circo. Isso mesmo! O circo da AMM. Prefeitos amedrontados procuravam seu líder. Neurilan concedia entrevistas ao lado dos assustados associados de sua entidade. Estava montado o cenário para perpetuá-lo na AMM>
Mandato de presidente da AMM é manga curta, dois anos. O de Neurilan se encerraria juntamente com o de prefeito de Nortelândia. Nenhum prefeito estava disposto a botar a cabeça à prêmio enfrentando Taques.
Resumo: prefeitos decidiram modificar o estatuto da entidade de modo a permitir eleição de ex-prefeito. Neurilan deitou e nadou de braçadas.
Em 5 de janeiro de 2017, em chapa única, Neurilan foi reeleito por aclamação por 106 votos à frente da chapa “AMM em defesa do municipalismo“.
O discurso nos 141 municípios era o mesmo: Neurilan não tem mandato e, por isso, pode trombar com Taques.
Com enfrentamentos dosados, o presidente da associação dos prefeitos, que não era (nem é prefeito) tocou o barco.
Mais ghost. Neurilan pegou gosto pela presidência da AMM. Em 7 de dezembro de 2018 foi eleito para o terceiro mandato consecutivo, dos quais, dois sem ser prefeito. Neurilan encabeçou a chapa “Municípios unidos, AMM forte“, que recebeu 82 votos. Em oposição a ele, o prefeito de Araguainha, Sílvio José de Morais Filho, o Silvinho (DEM) recebeu 30 votos.
Ligado ao deputado estadual Nininho (PSD), Neurilan o incluiu à sua chapa enquanto presidente de Honra.
SUCESSÃO – Com a degola política de Riva, o PSD passou para o comando do então vice-governador Carlos Fávaro, numa engenharia política capaz de fazer o general Golbery se revirar no túmulo.
Observem: Taques era algoz de Riva, enquanto seu vice Fávaro administrava o espólio do ex-mandachuva na Assembleia.
Mato Grosso tem coisas que somente existem em Mato Grosso. Taques governador, algoz de Riva. Fávaro, vice-governador, liderando as Viúvas de Riva. Uma linha real, embora invisível, estabelecia limites entre o governante e as Viúvas. Fávaro fazia vaivém pra lá e pra cá sobre ela. O tempo avançava, Taques fingia que governava e Neurilan vendia a imagem do enfrentamento. Regras do jogo. Até hoje, prefeitos ainda não receberam repasses da Saúde escamoteados por Taques. Mauro Mendes (DEM), que sucedeu Taques, cuida de cumprir seus repasses. O passivo do calote da Saúde é órfão – filho feio não tem pai.
Meu pirão primeiro
Fávaro pensa no poder 25 horas por dia. Em 2018 disputou o Senado pelo seu PSD ficando em terceiro lugar na luta por duas cadeiras, que foram conquistadas por Selma Arruda (PSL) e Jayme Campos (DEM). Fávaro; o ex-candidato ao cargo, Sebastião Carlos (REDE) e o Ministério Público questionaram a lisura da eleição da senadora. Em Mato Grosso o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) cassou sua chapa, por unanimidade. Em Brasília, o TSE deu o tiro de misercórdia. A ação contra Selma Arruda começou antes da eleição. Neurilan, que sonha com mais poder, acendeu o alerta da lógica: poderia haver eleição suplementar, e se ele permanecesse filiado ao PSD, não teria legenda para disputar o cargo que seria aberto. Enquanto a ação tramitava Neurilan planejava para onde ir.
Em 18 de outubro do ano passado, antes da cassação de Selma Arruda pelo TSE, e após a decisão do TRE (em 10 de abril), Neurilan assinou ficha de filiação ao PL do senador Wellington Fagundes. Ele sabia (e sabe) que o PSD tem dono e que esse é Fávaro.
A filiação de Neurilan levantou dúvidas. Oposicionistas com certidão do TSE em mãos mostram que Neurilan não é filiado ao PL e, portanto, não pode se candidatar. No entanto, sua elegibilidade está garantida. Explico: duas vezes ao ano, em abril e outubro, os partidos enviam a relação dos filiados à Justiça Eleitoral. Em outubro de 2019 o PL cumpriu essa exigência, mas o fez antes da filiação do presidente da AMM no dia 18 daquele mês.
Filiação é ato interno do partido, mas passa pelo crivo do TSE. Filiado em 18 de outubro Neurilan tem o tempo mínimo exigido de filiação – seis meses – para postular candidatura. Tanto ele quanto o PL sustentam que comunicaram à Justiça Eleitoral o ato de sua entrada na sigla.
Para se candidatar Neurilan precisará se licenciar da presidência da AMM em 13 de março. Caso não se eleja poderá reassumir a função. Seu sucessor é o prefeito de Marcelândia, Arnóbio Andrade (PSD) e o segundo nome na linha sucessória é o da prefeita de São Félix do Araguaia, Janailza Taveira (SD).
Pé na estrada
Pré-candidato Neurilan está na estrada. Percorre Mato Grosso, se reúne com prefeitos e ex-prefeitos, com vereadores e ex-vereadores.
Alguns prefeitos declaram abertamente apoio à sua eventual candidatura ao Senado. Neurilan fala que mais de 100 filiados à AMM abraçaram sua bandeira, mas entre eles, ao menos um o denunciou a um influente jornal cuiabano por suposto abuso de poder. Neurilan nega que esteja se valendo da estrutura da AMM pra suas peregrinações. Sustenta que viaja com recursos pessoais, e que durante a recente semana em que cumpriu um longo roteiro pelo Nortão e no Vale do Araguaia se licenciou da entidade.
Wellington Fagundes é o principal fiador de Neurilan, que também conta com apoio do presidente da União das Câmaras Municipais (UCMMAT), vereador por Vila Bela da Santíssima Trindade, Edcley Coelho (PSD). Neurilan vê seu projeto político além de sua filiação, “´Sou filiado ao PL, mas o projeto (eleição ao Senado) é suprapartidário, em defesa do municipalismo, por isso recebe apoio de prefeitos e outros líderes de diversos partidos”, comemora.
Para viabilizar sua candidatura Neurilan percorre municípios, onde se reúne com lideranças regionais. Um desses encontros aconteceu na Câmara Municipal de Mirassol D’Oeste, na faixa de fronteira com a Bolívia. O pré-candidato sustenta que o resultado das andanças “é excelente“.
Política não é ciência exata. O adversário de hoje pode se tornar companheiro no amanhã, e o mesmo é passível de acontecer a companheiros, que podem mudar de lado. Analistdas avaliam a AMM como instituição complexa pela pluralidade partidária de sua composição. Nessa linha de pensamento, acreditam que prefeitos poderão optar por candidatos de seus partidos, e que o objetivo da disputa tem uma dimensão incalculável, que poderá mexer com a cabeça de muitos políticos – em razão dos entre aspas entendimentos na penumbra.
Neurilan se diz firme no propósito de disputar o Senado. Firme também ele estava no começo de 2018, quando seu nome era cogitado para deputado federal pelo PSD, e recebia sinais positivos das Viúvas de Riva, mas ele recuou sem razão aparente.
O que é a AMM?
Ninguém melhor do que os prefeitos e ex-prefeitos para avaliarem a entidade que representa os municípios mato-grossenses. Nunca a AMM conseguiu reunir todos os municípios. Sua média histórica de filiação é de 134 prefeituras num universo de 141. Dentre os grandes municípios, Sorriso, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum não participam da AMM.
Há tempos na presidência da AMM, Neurilan bota seu nome à apreciação de seus ex-colegas de prefeitura. O desenrolar da campanha será o verdadeiro termômetro sobre essa situação.
Independentemente da avaliação de prefeitos e ex-prefeitos a AMM é vista com ressalvas por congressistas e deputados estaduais, que preferem eles próprios – é claro – defenderem causas dos municípios. Em meio a isso Neurilan passa boa parte dos dias em Brasília – onde a AMM tem instalações – em nome da política municipalista. Nacionalmente seu nome é um dos mais conhecidos entre os dirigentes de entidades semelhantes.
Os nomes ao Senado ainda não foram definidos, mas os pré-candidatos são conhecidos; alguns são do Congresso e outros da Assembleia. Passada a eleição suplementar, se Neurilan não se eleger e independentemente de quem vença o pleito, pode ser que ele sofra retaliações por parte desses parlamenares e seus aliados, o que não seria de se estranhar. Em isso acontecendo o resultado as urnas em 26 de abril poderá matá-lo duplamente: enquanto candidato ao Senado e na sua condição de líder municipalista.
Maksuês, o delator
No final de 2012, quando a legislatura da Câmara Municipal de Cuiabá chegava ao fim, Maksuês conseguiu uma proeza. O presidente daquele Legislativo, Júlio Pinheiro (PTB) e a Propel fizeram um termo de adesão de R$ 1.650.000 para a elaboração de materiais gráficos. O termo não foi levado adiante por Júlio Pinheiro, por duas razões, segundo Maksuês: o mandato do vereador na presidência estava em contagem regressiva e não haveria lastro financeiro para tanto.
Em 2013 João Emanuel (PSD) assumiu a presidência da Câmara e levou adiante o termo de adesão, que esmiuçado era a contratação de serviços gráficos para elaborar 150 mil livros contando a história do Legislativo Cuiabano, cinco mil exemplares da Constituição de Cuiabá, crachás e outros itens de menor relevância.
Maksuês e João Emanuel tentaram levar adiante um plano mafioso. O primeiro, mesmo sem capacidade operacional para tanto, deveria imprimir dezenas de milhares de livros. O outro, ainda que os recebesse, não teria público alvo para distribui-los, pois à época a população cuiabana não ia além de 569.830 habitantes incluindo bebês, crianças e analfabetos.
A impressão dos livros era algo mirabolante. Se efetivamente fossem impressos a Câmara teria condições de doar um para cada quatro habitantes da cidade.
O estranho negócio, segundo Maksuês, na verdade seria pano de fundo para encobrir um rombo nas finanças da Câmara. A gráfica fingiria que imprimiu e o cliente João Emanuel juraria que recebeu a encomenda contratada. Essa esbórnia com o dinheiro público ficou bem evidenciada num vídeo que vazou no desenrolar da Operação Aprendiz, desencadeada pelo Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público (MP). Aprendiz desmontou o esquema e seus desdobramentos resultaram no afastamento e posterior cassação de João Emanuel.
O esquema de Maksuês e João Emanuel era verdadeira engrenagem criminosa. Cada um dos dentes tinha função especifica na sua operacionalização. O braço direito de Maksuês era seu sócio na gráfica, Gleisy Ferreira de Souza. O vereador era secundado por servidores da Câmara: o secretário-geral, Aparecido Alves da Silva, o Cido; o chefe do setor Jurídico, advogado Rodrigo Terra Cyrineu; e pelo chefe do Almoxarifado, Renan Moreno Lins Figueiredo. Cido atestava a necessidade da aquisição, Ciryneu fundamentava a legalidade da transação e Figueiredo chancelava os recebimentos do material gráfico.
Pego com a mão na botija Maksuês aceitou colaborar com o MP por meio de delação premiada. Oficialmente sua versão é a seguinte: do montante dos pagamentos pelos serviços contratados João Emanuel ficaria com 75%. Os 25% restante teriam três destinações: 13% para recolhimento dos impostos sobre as operações e 12% para serem divididos em partes iguais entre ele e seu sócio Gleisy, também alcançado pela investigação. O desdobramento da delação chegou a um acordo de Maksuês com a Justiça, pelo qual desde maio de 2015 ele devolve R$ 400 mil aos cofres públicos em 24 parcelas mensais.
A delação de Maksuês, como se comenta nos bastidores, não foi mero gesto de boa vontade nem indício de arrependimento. Ele teria cedido diante de forte pressão sofrida no Gaeco, que o teria alertado sobre a possibilidade de pedir a prisão de sua mulher, Mara Rúbia, por seu suposto envolvimento no escândalo com a Câmara. Para proteger a família, Maksuês disparou para todos os lados.
Para reforçar sua condição de delator Maksuês acusou praticamente todo o empresariado cuiabano do ramo gráfico de praticar negócios ilícitos com o governo e a Assembleia Legislativa. Daí surgiu à versão de que as compras de produtos gráficos pelos dois poderes seria nos mesmos moldes da transação com João Emanuel: 75% e 25%. Nesse cenário a Delegacia Especializada em Crimes Fazendários e Contra a Administração Pública (Defaz) iniciou investigação para tentar descobrir possíveis fraudes nas licitações do governo e Assembleia Legislativa com as gráficas.
O escândalo envolvendo Maksuês chamuscou o então presidente da Assembleia, José Riva (PSD) por duas razões. Primeiro: Maksuês foi deputado na legislatura de 2007/10 pelo PP, partido liderado por Riva, que controlava a Mesa Diretora da Assembleia. Depois Riva migraria para o PSD, que foi reconhecido pelo Tribunal Superior Eleitoral em 27 de setembro de 2011. Riva foi um dos seus principais fundadores no Brasil, pelo volume de filiações por ele canalizado, conforme reconheceu o líder nacional da legenda, Gilberto Kassab. Segundo: à época João Emanuel era casado com a agora deputada estadual Janayna Riva, filha de Riva.
Em outubro de 2014 o senador pedetista Pedro Taques se elegeu governador em primeiro turno. Ao longo da campanha Taques anunciava que botaria os corruptos na cadeia e não escondia animosidade com Riva e o então governador Silval Barbosa (PMDB). No período entre a eleição e posse a Defaz montou a Operação Edição Extra. No grupo de Taques a meta era fazer um verdadeiro strike político para tirar Silval, Riva e o primeiro-secretário da Assembleia, Mauro Savi (PR), do caminho do governador eleito, lançando mão de tudo que se possa imaginar. Edição Extra, nesse caso, seria verdadeiro mamão com açúcar. Sem Silval, Riva e Savi, o novo governador chegaria ao poder com a oposição engessada.
Para fazer o strike político era preciso atingir também empresários do ramo gráfico, prestadores de serviço ao governo e a Assembleia. Gaeco, Polícia Federal, Polícia Militar, Polícia Rodoviária Federal, Receita Federal, Procuradoria Geral da República e Polícia Civil sempre escolhem nomes sugestivos para suas operações e que têm a ver com os fatos em apuração. Edição Extra não se identifica com gráficas. Quem lida com edição extra é jornal. Melhor esclarecendo: lidava, quando os matutinos imprimiam uma nova edição no mesmo dia, para cobertura de fato muito relevante. Atualmente, com a instantaneidade da internet, as mídias eletrônicas se encarregam dos furos deixando aos jornais a cobertura conceitual para o dia seguinte. Mesmo assim, a denominação foi mantida, porque na verdade, como se ouvia com frequência nos bastidores, ela visava atingir em cheio o empresário João Dorileo Leal, proprietário e diretor do Jornal A Gazeta, que integra o Grupo Gazeta de Comunicação.
Estranhamente o nome de Dorileo foi excluído de Edição Extra permanecendo o foco da investigação e da ação policial voltados contra empresários do setor gráfico, um vendedor da Gráfica Printt e servidores do segundo escalão do governo.
Taques ainda não havia assumido o governo, mas a máquina governamental se reportava a ele. Daí o desencadeamento da operação em 18 de dezembro, data estratégica, escolhida a dedo. No círculo de Taques a operação era esperada como meio de se extrair grave denúncia contra Silval, Riva e Savi – com base em delação premiada – num ambiente recheado pelas prisões de servidores do governo e empresários do segmento gráfico. Sites e plantões de jornalismo na TV e no rádio foram mobilizados para um noticiário pirotécnico, que tinha uma finalidade criminosa: influenciar na votação para a diretoria da Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM).
O governador eleito defendia com unhas e dentes a candidatura do prefeito de Lucas do Rio Verde e então seu correligionário no PDT, Otaviano Pivetta, para presidente da AMM. Pivetta foi coordenador e doador na campanha de Taques ao governo. Hoje Taques é filiado ao PSDB. Pivetta disputava o cargo contra Neurilan Fraga (PSD), prefeito de Nortelândia, que era liderado de Riva e se amparava no prestígio político daquele deputado.
No estratégico dia 18 de dezembro de 2014, com Taques diplomado governador, a Defaz desencadeou Edição Extra. Naquela data, no final da manhã, a AMM iniciaria o processo de votação para a escolha de seu novo presidente e da diretoria da entidade.
As eminências pardas do poder imaginavam que uma denúncia consistente contra Silval, Riva e Savi levaria Pivetta a vencer a eleição. Nos hotéis onde se hospedavam, os prefeitos que se encontravam em Cuiabá para a votação assistiram no café da manhã, os jornais da televisão informando que a polícia prendera secretários de Silval, que policiais lacraram as portas da Secretaria de Comunicação do Estado, que ninguém tinha acesso àquele órgão e que os empresários do setor gráfico e irmãos Fábio e Dalmi Defanti (Gráfica Printt) e Jorge Defanti (Gráfica Defanti) estavam sendo caçados por agentes. Paralelamente a isso, sites se desdobravam em manchetes que falavam num escândalo que teria causado um rombo de R$ 40 milhões ao governo. Posteriormente os Defanti se apresentaram à polícia, que cumpriu os mandados de prisão contra os três, expedidos pelo juiz plantonista Jamilson Haddad Campos
A maturidade política dos prefeitos não permitiu que a pirotecnia interferisse no resultado das urnas. Neurilan, apoiado por Riva foi eleito com 59 votos. Adair Moreira (PMDB), de Alto Paraguai, que disputou sem apadrinhamento, como franco-atirador, ficou em segundo, com 32 votos. Pivetta foi o lanterna, com 30 votos, apesar do circo armado por Taques. Com a vitória Neurilan sucederia Valdecir Luiz Colle, o Chiquinho do Posto (PSD), prefeito de Juscimeira e também liderado e apoiado por Riva.
Não se questiona a lisura das investigações feitas pela Defaz, nem o profissionalismo de seus delegados e agentes. O quê da questão é a coincidência de data da operação com a eleição na AMM e a mobilização de boa parte da mídia na madrugada para produzir o material que poderia pulverizar a candidatura de Neurilan e beneficiar Pivetta, mas esse tiro saiu pela culatra.
O resultado da eleição na AMM foi a última vitória de Riva e a primeira derrota de Taques. Naquela disputa, pela primeira vez, o governador eleito foi derrotado em seu projeto de expansão do poder político. O vencedor era Riva, deputado em final de mandato, considerado à época o maior ficha suja do Brasil e que mais tarde, por diversas vezes foi preso sob a acusação de prática de improbidade administrativa.
PS – Esse é o vigésimo primeiro e último capítulo da série UM NOME AO SENADO.
Leiam os anteriores:
1 – UM NOME AO SENADO: Sirlei Theis
2 – UM NOME AO SENADO: Waldir Caldas
3 – UM NOME AO SENADO – Neri Geller
4 – UM NOME AO SENADO – Nilson Leitão
5 – UM NOME AO SENADO – José Medeiros
6 – UM NOME AO SENADO – Maria Lúcia
7 – UM NOME AO SENADO – Carlos Fávaro
8 – UM NOME AO SENADO – Gisela Simona
9 – UM NOME AO SENADO – Max Russi
10 – UM NOME AO SENADO – Adilton Sachetti
11 – UM NOME AO SENADO – Carlos Bezerra
12 – UM NOME DO SENADO – Procurador Mauro – PSOL
13 – UM NOME AO SENADO – Blairo Maggi
14 – UM NOME AO SENADO – Carlos Abicalil
15 – UM NOME AO SENADO – Dr. Leonardo
16 – UM NOME AO SENADO – Otaviano Pivetta
17 – UM NOME AO SENADO – (Alguém do Partido Verde?)
18 – UM NOME AO SENADO – Júlio Campos
19 – UM NOME AO SENADO – Dilmar Dal’Bosco
20 – UM NOME AO SENADO – Pedro Taques
Eduardo Gomes de Andrade – Editor de blogdoeduardogomes
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11 – Arte: Édson Xavier
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