Boa Midia

O Ninho do Urubu

Este estranho nome tem um indicativo de tragédia, pois o urubu é uma ave de mau agouro. E uma delas aconteceu neste local, no Centro de Treinamento do Flamengo, na cidade do Rio de Janeiro, ceifando a vida de vários adolescentes.

Tal tragédia é o retrato deste Brasil do descaso e da irresponsabilidade. O Centro de Treinamento não podia funcionar, pois a sua construção foi condenada, por dezenas de vezes, pela Prefeitura, pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro e pelo Corpo de Bombeiros. E mesmo assim, a revelia de todas estas desaprovações, ele funcionava para abrigar incautos e inocentes adolescentes que acalentavam sonhos de destaque e glória, vendo, no prestigiado time de futebol, o passaporte para sair de uma vida de provações. Afinal para estas crianças/adolescente as chances de subirem na vida, neste inóspito torrão, são quase nulas. Sonhos e planos foram roubados criminosamente pela incúria e pelo descaso que os levaram deliberadamente ao cadafalso.

O Ninho do Urubu é a síntese deste Brasil, onde nada ou quase nada funciona. É a mesma causa de recente tragédia: falta de fiscalização que quando existe não resulta em nada e as tragédias se repetem sem apelo e sem perdão. Fica uma inquietante pergunta: quantos ninhos e quantas outras obras aguardam um desfecho trágico por este Brasil afora?

O Brasil é o paraíso para se levar vantagem em tudo. Tudo é negociado. O lobista infame e a autoridade corrupta; a institucionalizada arte de tirar direito de quem tem e dá para quem não tem; a advocacia movida a grana e a poderosos lobbys; o engenheiro a serviço das firmas de materiais de construção; o médico refém dos laboratórios, planos de saúde e fabricantes de remédio; o guarda subornado; as obras bichadas; o funcionário público movido à propina; as construtoras e OSCIPs a serviço dos políticos; as multas inúteis; os impostos escorchantes; as grandes empresas que não pagam impostos; incentivos fiscais indiscriminados; os empréstimos camaradas e a distância abissal entre o maior e o menor salário. E por ai vão os mal feitos e desatinos de toda ordem. A corrupção permeia a sociedade de cima a baixo, nas mais comezinhas atividades. Ela somente é condenada quando não favorece quem fala mal dela.

É por estas e outras que uma dúvida me persegue: quantos são os canalhas e cafajestes, e quantas são as pessoas de bem?

Enfim, o fiel otimismo que sempre me acompanhou me abandonou. E este perverso pessimismo me segreda: EXISTE SAÍDA?

Renato Gomes Nery – advogado e ex-presidente da OAB de Mato Grosso
rgnery@terra.com.br

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