Boa Midia

A criatura Mauro engole o criador Jayme

Eduardo Gomes

andrade@eduardogomes

eduardogomes.ega@gmail.com

Bons tempos aqueles

A criatura contra o criador ou ainda a criatura come o criador povoam a literatura, a telona e a TV. Na prática, sobretudo em política, isso é comum. Tão comum que em Mato Grosso o governador Mauro Mendes engoliu o senador Jayme Campos. Mauro era filiado ao PSB e Jayme o levou para o Democratas (DEM), que virou União Brasil e agora juntou-se ao PP formando a Federação União Progressista Brasileira (UPB). Numa visão ampliada, não há nenhuma atipicidade na disputa entre Mauro e Jayme, que resulta na vitória do primeiro. Afinal, nenhum cenário é mais apropriado para debate político do que partido. Porém, para que o texto não se resuma no desfecho e os meandros não sejam mostrados ao cidadão, eis os fatos:

Em 2018, Mauro se elegeu governador e Jayme senador. Assim, surgiu uma aliança unindo o tradicional com o novo. O calendário do político é aquele que lhe interessa: as datas das eleições. Seria natural que ambos pensassem assim: “eu me reelejo no Paiaguás e depois vou para o Senado” e “eu cumpro os oito anos no Senado e depois vou para o Paiaguás”. Esse conceito do “eu” é um pé na bunda do eleitor. Além desse pensamento – lógico na visão do carreirismo – havia um componente desequilibrador: Otaviano Pivetta (Republicanos), vice de Mauro em 2018 e 2022, seu amigo, avalista eleitoral junto ao agronegócio e financiador das campanhas. Mauro abraçou o plano de Pivetta de ser governador.

O tempo é implacável e Jayme não se reciclou. Permaneceu durão e cumprindo um mandato de maratonismo financeiro na área de liberação de emendas para prefeitos aliados ou cortejados politicamente. Mauro é objetivo, de poucos amigos, centralizador e estrategista; à frente de um Estado com mais orçamento do que demanda, realiza uma administração que disparadamente, no campo das obras, é a melhor de Mato Grosso. O estrategismo de Mauro o levou a preparar a candidatura de sua mulher, Virgínia Mendes, para deputada federal; a mídia em peso abriu espaço para Virgínia, que opina sobre tudo e todos, e que percorre os municípios em aviões do governo, com segurança e assessoria bancadas pelos cofres públicos, sem que ninguém jamais contestasse esse estado de coisas – ao contrário, não foram poucas as vezes que Jayme elogiou a primeira-dama.

No Senado Jayme não tem nem lampejos em defesa de Mato Grosso no âmbito federativo, é conciliador, gosta de Bolsonaro e acende vela para Lula, enquanto suas emendas fazem a alegria dos grupos do poder nos municípios.

Com um olho na administração e outro nas urnas, Mauro arrastou para seu grupo prefeitos de todos os cantos, vereadores aos montes e as chamadas lideranças municipais, também. Além disso, mandou seu braço direito Mauro Carvalho assumir o PRD, pois à época não era possível imaginar que ele engoliria Jayme facilmente; porém tudo concorreu para que o partido de Mauro Carvalho tornasse-se dispensável.

Em público o clima entre Mauro e Jayme é harmonioso. Nos bastidores a cuíca já estaria roncando. Um comensal do Paiaguás em conversa reservada comigo, disse que ‘por enquanto’ não haverá quebra-pau para o governador comparar administrativamente Pivetta e Jayme, e observou que ambos foram prefeitos em três mandatos em seus municípios – Jayme em Várzea Grande, e Pivetta em Lucas do Rio Verde – e que a primeira enfrenta uma crise crônica de desabastecimento de água e não tem regularização fundiária, enquanto Lucas esbanja modernidade administrativa e qualidade de vida.

Jayme tem uma relevante folha de serviços prestados a Alta Floresta, tanto no governo (de 1991 a 1994) quanto no Senado, mas o queridinho naquela cidade fundada por Ariosto da Riva é Mauro. O prefeito de Alta Floresta é Chico Gamba, correligionário de ambos, mas que pende para o governador e não é para menos: o Hospital Regional de Alta Floresta está em fase final de construção, e Mauro implanta um corredor Leste-Oeste ligando Colniza a Guarantã do Norte, via Alta Floresta, e para tanto construiu e constrói grandes pontes, inclusive uma sobre o Juruena, com 1.360 metros – a maior de Mato Grosso.

Jayme não tem como levar Chico Gamba para seu grupo. Pois Mauro o cercou por todos os lados. Vejamos: o prefeito apoia o deputado estadual Nininho, que até recentemente era filiado ao PSD, mas correu para o Republicanos de Pivetta.


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Jayme, com todo seu histórico político e sendo reconhecido entre as principais lideranças políticas mato-grossenses foi atropelado internamente. Mauro é Pivetta, que deverá contar em sua chapa com a vereadora e primeira-dama de Cuiabá, Samantha Iris; e para o Senado o governador fará dobradinha com o bolsonarista deputado federal José Medeiros.

Jayme esperneia e tenta manter a postura de que tudo está bem. Mesmo assim, já admitiu que o senador e ministro Carlos Fávaro (PSD) o convidou para seu partido. Jayme no PSD seria uma espécie de bolada nos Países Baixos – como se diz no futebol. Aliado de Lula, o PSD apoiará a médica Natasha Slhessarenko (PSB) ao governo, com Fávaro à reeleição e outra vaga para o Senado em aberto. Nesse caso Jayme entraria para compor o quadro das candidaturas de centro-esquerda.

O cenário para Jayme não é bom nem na federação onde ainda está nem junto a Fávaro. Raposa, Jayme poderia buscar um partido sem congestionamento de caciques, para dar sobrevida ao seu grupo ou ao que restar dele. Poderia, mas se o fizer mostrará que sua liderança foi esvaziada, pois da bancada estadual somente levará consigo seu irmão mais velho, Júlio Campos, uma vez que Dilmar Dal Bosco é Mauro desde criancinha; Sebastião Rezende permanecerá com o governador, por ser porta-voz e representante da Assembleia de Deus, sempre governista; e Eduardo Botelho estará sob forte crise existencial por seus laços empresariais com os dois. Quanto aos prefeitos que formam a base montada por Mauro, boa parte bate palmas para Jayme, mas todos – ou quase todos – sequer piscam contra quem tem a chave do cofre do Paiaguás. Jayme não dá murro em ponta de faca e nesse contexto, volta para casa.

RESUMO – Mauro venceu Jayme e irá às urnas com Pivetta para enfrentar Natasha, num pleito polarizado, pois o senador Wellington Fagundes (PL) e Jayme sequer terão legendas para sua disputa.

Desse modo, 2026 marcará o começo da renovação política, pois estarão fora da disputa Blairo Maggi (por vontade própria); Silval Barbosa e José Riva (ambos corruptos confessos em delação premiada); Wellington Fagundes, por falta de espaço partidário; Carlos Bezerra, aposentado; e Jayme Campos, que sua queda arrastará o mano Júlio Campos, vice-presidente da Assembleia e ex-governador e senador.

Pivetta certamente terá o apoio do presidente da Assembleia, Max Russi (PSB e a um passo do Podemos), que sonha em ser governador e sabe bem que Pivetta não poderia disputar a reeleição. Mauro deverá ser o mais votado ao Senado, mas dificilmente sua aliança conquistará as duas cadeiras, pois o PT sempre recebe em torno de 25% da votação, e essa será canalizada para Fávaro, que o representará na disputa. José Medeiros e a deputada estadual Janaína Riva (MDB) deverão brigar pela terceira colocação, que nesse caso representa tanto quanto zero.

Foto: Divulgação/DEM

4 Comentários
  1. Marcio Maia Diz

    Bela análise e ótimo texto
    Jornalista Márcio Maia Eça – Cuiabá

  2. Dalva Peres Diz

    Acredito que Janaína terá bem mais votos que Fávaro!
    Vereadora Dalva Peres MDB) – Cocalinho

  3. Marcia do Manoel da Prelazia Diz

    Nossa, que histórico político de ambos

    Márcia do Manoel da Prelazia – Secretária Municipal de Esporte e Lazer – São Félix do Araguaia

  4. Lucia Kanno Diz

    Será governador com ou sem apoio do Mauro Mendes

    Lúcia Kanno (PRD) – Presidente da Câmara Municipal de Carlinda

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