Boa Midia

Coração dividido

A inauguração do Dutrinha, em 1952, com capacidade para mais de 15 mil pessoas, permitiu aos clubes de Cuiabá, além do Operário, promover grandes espetáculos esportivos, trazendo para se apresentar na capital mato-grossense clubes de renome do futebol brasileiro. O Dutrinha marcou também o início da evasão de rendas no futebol cuiabano…

Primeiro, os torcedores descobriram que era só encostar a bicicleta no muro pelo lado de fora, ficar em pé no cano superior do esquadro ou na garupeira e assistir ao jogo na maior tranquilidade…

Depois veio a fase da torcida subir nas árvores das calçadas ou no telhado das casas das imediações para ver o jogo sem pagar ingresso. “Em jogos importantes, as árvores mais pareciam ninhais de tantas pessoas em cima delas…” – recorda o coronel aposentado da PM Vandir Metello.

Houve ainda o golpe do Hino Nacional. Faz muitos anos que a execução do Hino Nacional tornou-se obrigatória em eventos em recintos fecha-dos ou abertos que reúnam grande público.

E quando começava a sua execução era um tal de torcedor pular o muro do Dutrinha que não acabava mais. É que com a execução do Hino Nacional os soldados da PM que faziam policiamento no estádio eram obrigados a bater continência e não podiam sair da posição de sentido para correr atrás de torcedores que estavam pulando o muro…

Tinha torcedor mais abusado que ainda fazia gracejo quando passa¬va diante dos soldados. Depois era só se misturar entre a torcida e estava salvo o dinheiro do ingresso…

Para poder se aproximar dos grandes ídolos do futebol de sua época de menino – Fulepa, Uir de Castilho, Leônidas, Batista Jaudy, Chupapaia, Benedito Gonçalves – Vandir Metello foi marcador de placar, gandula, vendedor de laranja, refresco e refrigerante no Dutrinha e nos vestiários.

E recorda que o Atlético Mato-grossense não dava nem laranja, nem refresco para seus jogadores: era refrigerante mesmo. “Era um time muito bem organizado…” – lembra Metello.

Desse tempo, outra recordação: os carreirões que o zelador do Dutrinha, seu Barbino, dava nos garotos que pegavam o pagamento adiantado para trabalhar como gandulas e depois sumiam na multidão. Para a torcida era uma grande farra ver o zelador correndo atrás dos meninos e xingando feito um louco…

A aproximação do futebol desde menino levou Vandir Metello a se tornar também um jogador de futebol. Foram seis anos, a partir de 1970, jogando no Palmeiras, do Porto.

Atuando na ponta esquerda, porém mais recuado, no time titular ou no reserva, Vandir entrava em conflito íntimo toda vez que o alviverde enfrentava o Mixto. Motivo: ele era torcedor fanático do Mixto, mas como morador do Porto, por uma questão de moral, tinha que jogar no Palmeiras. A paixão pelo alvinegro nasceu da grande admiração que Metello tinha pelo eterno dirigente mixtense Ranulpho Paes de Barros.

Naqueles idos de 70, para os habitantes do lendário bairro do Porto jogar ou torcer pelo Palmeiras, mais do que uma preferência por clube, era uma questão de religiosidade – afirma Vandir Metello.

PS – Reproduzido do livro Casos de todos os tempos Folclore do futebol de Mato Grosso, do jornalista e professor de Educação Física Nelson Severino

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