Mato Grosso e o coronavírus na terra sem saúde pública

Mato Grosso ao fio da navalha na saúde pública
Com 903 mil km² de superfície Mato Grosso tem 141 municípios, que em sua maioria formam pequenas comunidades, sendo que em apenas cinco a população supera 100 mil residentes. A densidade demográfica é de 3,66 moradores por km². Os 3.484.466 habitantes não conseguem ocupar os vazios demográficos aptos para a habitação – além disso, há enormes claros populacionais na imensidão alagável do Pantanal, áreas de floresta e cerrado preservadas por reservas legais e territórios indígenas. Esse mosaico social serve como exemplo comparativo pra se avaliar a extensão da pandemia do coronavírus no país. Figuradamente o número dos mortos pela doença supera isoladamente ao de habitantes de 120 municípios mato-grossenses. O Estado não tem estrutura hospitalar sequer para períodos ditos de normalidade, quanto mais pra esse ciclo pandêmico. Residir na quase continental Terra de Rondon é viver ao fio da navalha.

A doença atinge grupos de risco formados por idosos, portadores de diabetes, cardíacos e obesos, mas contamina indistintamente.

No domingo, 10 de maio, o ex-prefeito de Ponte Branca, Sandoval Nogueira de Moraes, o seo Sandu, de 82 anos, morreu numa unidade de terapia intensiva em um hospital em Barra do Garças.
Déficit de UTI

Mesmo nos polos de saúde a limitação hospitalar é fator complicador. Primavera do Leste tem 10 UTIs para atender uma população de 165.842 habitantes naquele e nos vizinhos municípios de Santo Antônio do Leste, Campo Verde, Paranatinga, Poxoréu, Dom Aquino e Gaúcha do Norte. Ou seja: em caso de agravamento da incidência da doença, o estrangulamento será inevitável. Primavera tem 153 casos, Dom Aquino (63), Dom Aquino (cinco) e Poxoréu, Paranatinga e Santo Antônio do Leste (dois cada).
Hospitais de referência em vários municípios estão em precárias condições. Não há política de expansão e capilarização da rede hospitalar. Recursos são improvisados via emendas parlamentares federais e estaduais. Prefeitos correm o pires em Brasília em busca de socorro. Instituições filantrópicas enfrentam dificuldades para o custeio de seus hospitais.
A pandemia assusta, mas a demanda por saúde pública vai além dela. Cirurgias eletivas foram desmarcadas, ambulatórios e clínicas praticamente baixaram as portas. Quando o coronavírus for triste lembrança haverá uma procura muito grande pelo atendimento ora reprimido – resta saber qual será a capacidade de pronta resposta, e pior, quantos doentes ficaram pelo caminho enquanto aguardavam pela mão salvadora do médico.

Em maio o governo estadual inaugurou a ampliação do Hospital Estadual Lousite Ferreira da Silva ou simplesmente Hospital Metropolitano, de Várzea Grande, que tinha 28 leitos de enfermaria 10 UTIs e ganhou 180 leitos de enfermaria e 30 UTIs. Esse hospital é exclusivo para atendimento a pacientes com coronavírus, e sua obra, sem incluir equipamentos hospitalares, custou R$ 15 milhões, sem licitação, e foi bancada com R$ 10 milhões da gordura do duodécimo da Assembleia Legislativa e R$ 5 milhões desembolsado pelo governo.

O Estado não tem estrutura hospitalar nem pessoal quantitativo para eventual agravamento do cenário. Saúde aqui é tratada como jogo: ou se perde ou se ganha, sem sequer direito ao empate. E nessa disputa a sexta-feira, 5, começa com duas tristes notícias, para Mato Grosso: mais um óbito, em Sinop, que agora acumula quatro mortes, e outro, em Cuiabá, que salta para 14 mortos pela doença.

Enquanto isso, Mato Grosso convive com denúncias de superfaturamento em aquisições sem licitação para o enfrentamento da pandemia. Investigações apuram compras irregulares de produtos de limpeza e respiradores pela prefeitura de Rondonópolis, que é administrada pelo prefeito Zé Carlos do Pátio (SD); em nome da pandemia, a prefeitura inclusive comprou poltronas para acompanhantes de vítimas do coronavírus. Em Cuiabá também há suspeitas e o Ministério Público Estadual apura a locação de drones para desinfectar praças e terrenos, pelo polêmico prefeito Emanuel Pinheiro (MDB), que se tornou conhecido nacionalmente pelo lamentável episódio do paletó, em que ele deixa cair dinheiro do bolso abarrotado de seu paletó – a dinheirama lhe foi entregue por Sílvio Corrêa, então chefe de gabinete do à época governador Silval Barbosa. Silval e Sílvio em delação premiada ao Ministério Público Federal e homologada pelo Supremo Tribunal Federal disseram que se tratava de propina para Emanuel (então deputado estadual) fazer vistas grossas aos esquemas que haviam no governo.
Comparativo

Em Mato Grosso, isoladamente somente 21 municípios têm mais habitantes do que o número de mortos pela pandemia no Brasil: 34.023. A quantidade de infectados no país, 614.941, supera a população de Cuiabá, 612.547 habitantes.
Outros 120 municípios, isoladamente não têm tantos habitantes quanto o número de mortos pelo coronavírus no Brasil.
Redação blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – Edevison Arneiro – Prefeitura de Barra do Garças
2 – Facebook de Alessandra Bárbara
3 – Álbum de Família
4 – Karen Malagoli – Site público da Assembleia Legislativa de Mato Grosso
5 – Site público do Governo de Mato Grosso
6 – Assessoria da Unemat
7 – Sobre imagem da TV Globo
8 – Valmir Faria – Prefeitura de Campo Verde
Comentários estão fechados.