Boa Midia

UM NOME AO SENADO – Carlos Abicalil

Trânsito calmo. O motorista com as mãos firmes no volante do Passat cacareco, mas absorto em pensamento, voa com sua imaginação que o leva ao centro do poder nacional, em Brasília. Sua sucata avança pela rua Tenente Eulálio Guerra e invade o cruzamento com a preferencial Desembargador José de Mesquita, no bairro Araés, em Cuiabá. Feliz, o condutor da sucata não vê a colisão. somente escuta o barulho das ferragens do seu e de outro carro. Sereno, sem demonstrar contrariedade com o acidente, consegue abrir a emperrada porta de seu veículo. Desce, sorri ao condutor que teve o carro atingido. Felizmente não houve vítimas e tudo acabou com um forte abraço, sem indenização pelos danos materiais, pois o causador daquela situação explicou que era professor da rede estadual e que não tinha dinheiro, mas que em três meses  teria em abundância. Estranhamente, dois anos depois, Carlos Abicalil (PT), o homem de bolsos vazios e causador daquele acidente, era sócio de um avião Corisco, que caiu em Aripuanã.

 

Abicalil foi professor pobre
Abicalil foi professor pobre

O acidente no Araés aconteceu em novembro de 2002, às vesperas da diplomação dos eleitos em outubro daquele ano em Mato Grosso. O professor que dirigia o Passat cacareco era o então deputado federal eleito Carlos Abicalil (PT), que é professor da rede estadual – e ele não brincou quando disse que três meses depois  teria dinheiro  Mesmo sem bola de cristal Abicalil sabia o que lhe esperava. Prova que não blefava foi dada num triste episódio que resultou em sete mortes num acidente aéreo.

Em dezembro de 2002 Abicalil não tinha dinheiro para pagar a funilaria do carro atingido por seu cacareco. Na tarde do domingo, 7 de novembro de 2004, o monomotor Corisco de prefixo PT-NYS caiu logo após decolar da pista da fazenda Modelo, em Aripuanã, quando retornava para Juína, de onde decolara na manhã daquele dia. O piloto e os seis passageiros sendo duas crianças de 7 e 2 anos, morreram no local. Em respeito à memória dos mortos a série não cita seus nomes. A aeronave era de propriedade de Abicalil e do deputado estadual e seu correligionário Ságuas Moraes. Abicalil e Ságuas a compraram três meses antes daquela fatídica data.

Em pouco tempo o professor que se elegeu deutado federal virou dono de avião.

Mato Grosso era pequeno pra ele

 

Carlos Augusto Abicalil nasceu em Nova Friburgo, região Serrana do Rio. Formado em Filosofia com especialização em História Contemporânea, Abicalil ainda carrega  um incompleto mestrado em Educação. Professor por formação, mas sindicalista por opção e coração, iniciou sua carreira na Secretaria de Educação de Mato Grosso. Lotado em Barra do Garças, assumiu a diretoria da Escola Estadual Antônio Cristino Cortes, naquela cidade permanecendo na função entre 1988 e 91.

Mais sindicalista do que professor ou diretor, Abicalil militava no sindicalismo de sua categoria em Barra, mas nem o modelo federativo o impedia de cruzar o rio Araguaia para se reunir na vizinha goiana Aragarças, com o sindicalismo daquele município.

O sindicalismo o arrastou para Cuiabá, Brasília e o exterior.

De Barra, Abicalil veio para Cuiabá onde costurou apoio sindical e abriu espaço político no PT.

De 1995 a 2001 presidiu a Confederação Nacional de Trabahadores na Educação (CNTE); antes da presidência exerceu outros cargos naquela entidade.

O Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep) foi presidido por Abicalil entre 1994 e 98. Em algumas situações o presidente deu o pulo do gato pra ao mesmo tempo estar em Brasília e Cuiabá atuando em organização de greves, em defesa de aumento salarial, redução de carga horária e, claro, promovendo o Partido dos Trabalhadores, ao qual as duas entidades são umbilicalmente atreladas.

A militância sindical o levou a ser membro da Comissão Executiva Mundial da Internacional de Educação, em Bruxelas, na Bélgica; e a compor a Comissão Executiva Regional da Internacional de Educação para a América Latina, em San José, na Costa Rica.

Enquanto educador foi membro do Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso, de 1999 a 2003.

E dá-lhe poder!

 

Lula se elegeu presidente em 2002. No mesmo ano Abicalil recebeu 118.120 votos para deputado federal – foi o segundo mais votado ao cargo em Mato Grosso cravando 118.200 votos – atrás de Pedro Henry (PPB), com 120.846. Quatro anos depois, nadando de braçadas no poder em Brasília, Abicalil foi reeleito e campeão de votos: 128.851 deixando Homero Pereira/PPS  (100.114) em segundo lugar.

Seu sucesso nas urnas estava atrelado ao crescimento nacional do PT. Quando seu partido tentava conquistar a Presidência, ele também lutava por aqui, pelo governo. Em 1998 os companheiros o lançaram candidato a governador numa chapa com o vice José Afonso Botura Portocarrero, numa coligação com o PCdoB.

O resultado para o governo foi pífio. Abicalil recebeu 64.619 votos ficando em terceiro na disputa vencida em primeiro turno  pela dobradinha tucana Dante de Oliveira e Rogério Salles, com 472.409 votos (53,95%) tendo Júlio Campos/PFL com Rodrigues Palmas/PTB de vice, com 332.023 votos (37,90%).

Mesmo derrotado ao governo Abicalil abriu espaço junto  a Lula, e em 22002, quando o PT venceu o pleito nacional, ele chegou à Câmara.

Era uma vez a senadora Serys

 

Abicalil e Serys morreram abraçados

Abicalil dominava as entranhas do poder e queria aumentar ainda mais sua participação da política nacional petista. Se lançou pré-candidato ao Senado em 2010, quando o PT tinha uma candidatura nata, da senadora Serys Slhessarenko. Pra consumar sua candidatura o deputado assumiu o controle absoluto do Diretório Regional de seu partido e jogou Serys pra escanteio.

Primeira mulher eleita ao Senado por Mato Grosso, Serys também carregava uma proeza nas urnas: pra se eleger em 2002  ela derrotou dois dos principais políticos mato-grossenses: o então senador Carlos Bezerra (PMDB) e o ex-governador e Homem das Diretas, Dante de Oliveira (PSDB). Nada disso adiantou.

Nas urnas Abicalil e Serys morreram abraçados. O grupo ligado a Abicalil votou em Ságuas Moraes para deputado federal. A recíproca da senadora foi verdadeiira e seu pessoal votou em Blairo Maggi (PR) e Pedro Taques (PDT) ao Senado.

Naquele pleito Abicalil não teve uma causa mortis eleitoral. Foram duas. Primeiro, morreu nos braços de Serys. Depois, o grupo de Blairo também o assassinou nas urnas.

Entendam:

Blairo foi governador em dois mandatos e apoiou Lula no segundo turno em 2006. Foi o primeiro governador da direita a abraçar sua candidatura e o fez também na condição de liderança nacional do agronegócio. Mesmo assim, Geraldo Alckmin recebeu 50,31% dos votos e Lula 49,69%.

Agradecido a Blairo tanto pelo apoio eleitoral quanto pelos mimos de campanha, Lula lhe deu um baita presente: O Dnit. Isso mesmo! o chamado Trator de Blairo, Luiz Antônio Pagot foi nomeado presidente do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), em outubro de 2007, após o Senado homologar seu nome em sessão secreta, por 42 a 24 votos com duas abstenções.

Em lua de mel política com Lula, Blairo tocou seu segundo governo iniciado em janeiro de 2007. Presidente e governador viraram carne e unha. Lula passou a visitar o amigo na fazenda Tucunaré, em Sapezal, onde chamava alguns funcionários pelo nome.

Em Mato Grosso, na eleição de 2010 o PR de Blairo se coligou ao PT de Lula e ao  PMDB de Carlos Bezerra e do governador Silval Barbosa. Petistas e peemedebistas disputavam a Presidência com Dilma Rousseff e Michel Temer. Ao governo a coligação lançou Lúdio Cabral (PT) governador e Teté Bezerra (PMDB) de vice.

Campanha ao governo em 2010 – Abicalil ao lado do contrito Silval, com Lúdio sorrindo enquanto Carlos Bezerra fala – bons companheiros

Tem um ditado que diz: se Blairo pular da janela de um prédio, pule atrás, porque no solo tem dinheiro. Pois bem! Blairo sentiu que Abicalil seria eleito senador, e avaliou que essa eleição minaria sua força junto ao PT nacional.  Daí, não é difícil entender: o grupo ligado a Blairo deixou de lado Abicalil e vestiu a camisa de Taques.

Blairo com Taques, não há Abicalil que resista

Não há Abicalil que resista!  Alfinetado por Serys e apunhalado por Blairo, Abicalil ficou pelo caminho, ma mesmo assim, se não fosse a estranha – botem estranha nisso – lentidão do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso (TRE), o ex-professor pobre teria assumido o Senado juntamente com seus suplentes Altevir Magalhães (PMDB) e João Bosco (PT).

Uma hibernação do TRE durante oito anos impediu que Abicalil fosse senador. Na convenção em 2010 houve uma grotesca fraude na ata que registrou a composição da chapa de Taques ao Senado. Abicalil, o Ministério Público Eleitoral e Paulo Fiúza/PV – um dos suplentes de Taques – denunciaram tal fato, mas somente em 31 de julho de 2018 o TRE cassou o mandato de José Medeiros (Pode) e o tornou inelegível por oito anos. Medeiros era suplente de Taques e o substituiu em dezembro de 2014, por conta de sua eleição ao governo naquele ano. Medeiros recorreu, concluiu o mandato, se candidatou e venceu a eleição para deputado federal. A ação tramita. Esse é o Brasil do Judiciário que precisa passar por urgente e profunda reforma.

Pobre ex-professor pobre, que foi alfinetado por Serys, apunhalado por Blairo e deixado na galeria do esquecimento pelo TRE.

 

Uma boquinha em Brasília

 

Petista que é petista de proa, das três uma: ou tem mandato eletivo, ou é sindicalista, ou ocupa algum cargo comissionado. Fora disso, nem pensar.

Derrotado em 2010 Abicalil foi contemplado por Dilma Rousseff com o importante cargo de secretário-executivo do Ministério da Educação. Sua homologação recebeu apoio oficial da bancada federal mato-grossense e do governador e seu aliado Silval Barbosa.

 

Aloprado, segundo Lula

 

Lula, “Coisa de aloprados”

O apelido Aloprado é uma pecha humilhante, mas Abicalil a carrega sem poder questioná-la. Afinal, quem o rotulou assim foi ninguém menos do que o presidente Lula.

A pecha se deve a isso:

Em 15 de setembro de 2006 a Polícia Federal prendeu alguns integrantes do PT acusados da compra de um falso dossiê, de Luiz Antônio Trevisan Vedoin, dono da Planam, Esse dossiê acusaria o então candidato ao governo de São Paulo e ex-ministro da Saúde, José Serra (PSDB) de ter relação com o escândalo Sanguessuga ou Máfia das Ambulâncias.

A meta com o falso dossiê seria prejudicar Serra e consequentemente beneficiar Aloizio Mercadante (PT) que disputava a eleição com ele. De quebra sobrariam farpas contra o tucano Geraldo Alckmin, que concorria à Presidência. Os depoimento dos que foram presos demonstraram que o dossiê era falso.

Ao tomar conhecimento da trama, que teria sido arquitetada por Abicalil, Lula chamou de aloprados os participantes daquele esquema.

Entedem o esquema da Máfia das Ambulâncias

Até a Planam foi usada no esquema do Dossiê dos Aloprados

O escândalo Sanguessugas ou Máfia das Ambulâncias ganhou as manchetes  nacionais em 2006 envolvendo mais de 70 prefeitos mato-grossenses e boa parte da bancada federal. 

Sanguessugas foi como se tornou conhecido o esquema que envolvia congressistas e prefeitos com a empresa Planam  Indústria, Comércio e Representação, do empresário  Darci José Vedoin Trevisan e seu filho Luiz Antônio Trevisan Vedoin, que estranhamente montava ambulâncias e unidades móveis de saúde em Cuiabá. Parlamentares destinavam emendas para a compra desses veículos, um mafioso mecanismo dirigia a compra para a Planam, que emitia nota fiscal de venda superfaturada. O excedente seria rateado entre o autor da emenda e o prefeito – ficando um naco para a generosa empresa.

A engrenagem criminosa permanece impune, apesar de ter orquestrado o maior crime contra a Saúde Pública mato-grossense de todos os tempos e apesar de incontáveis inquéritos instaurados pela Polícia Federal e de dezenas de indiciamentos. As investigações apontaram que os à época deputados federais Lino Rossi e Ricarte de Freitas seriam os cabeças do esquema, que passaria por outros parlamentares, e que teria a mão invisível da Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), então presidida pelo à época prefeito de Nova Marilândia, Cidinho dos Santos (depois seria suplente do senador Blairo Maggi) – Wagner dos Santos, irmão de Cidinho foi preso temporariamente por seu suposto envolvimento enquano lobista.

Com o escândalo a Planam baixou as portas. Todos os envolvidos juram a mais cândida inocência,

Celso Banazesky um dos sanguessugas

No escândalo Sanguessuga além de Leitão, também foram denunciados os prefeitos  e ex-prefeitos Celso Banazeski (Colíder);  Romoaldo Júnior (Alta Floresta) e agora deputado estadual; Jesur Cassol (Campo Novo do Parecis); Ezequiel Fonseca (Reserva do Cabaçal), ex-deputado federal; Maria José Borges (Dom Aquino); Aloir José Luke (Nova Guarita); Cidinho dos Santos (Nova Marilândia) ex-suplente do então senador Blairo MaggiFrancelino Pedro da Silva Filho, o Francinha (Guiratinga), já falecido; Padre Antonino Cândido da Paixão (São José do Povo); Roberto Carlos Barbosa (Glória D’Oeste); Lourival Carrasco (Mirassol D’Oeste); Reinaldo Tirloni (Tapurah), já falecido; Nelson de Moraes (Pedra Preta); Ismael dos Santos (Planalto da Serra); José Bauer (Nova Ubiratã); Onéscimo Prati (Campo Verde), já falecido; Giovane Marchetto (Marcelândia), já falecido; Olídio Pedro Bortolas (Santa Carmem); Denir Perin (Querência); Valdizete Nogueira (Jaciara); Marcelo Alonso (Nova Maringá); Antonio Domingos Debastiani (Feliz Natal); João Batista de Sá (Torixoréu);  Antônio Rodrigues da Silva, o Tonho de Menino Velho (Poxoréu), agora eminência parda do prefeito Zé Carlos do Pátio, de Rondonópolis; Marco Aurélio Fullin (Bom Jesus do Araguaia), já falecido: Joaquim Matias Valadão, o Bananeiro (Campinápolis); Hélio José do Carmo (São José do Xingu), já falecido; Gilberto Siebert (Cotriguaçu); Devair Valim (Nobres); Revelino Trevizan (Porto dos Gaúchos), Érico Piana (Primavera do Leste); Priminho Riva (Juara); Lutero Siqueira (Guarantã do Norte); Jayme Campos (Várzea Grande); Luiz Cândido de Oliveira (Terra Nova do Norte);  Pedro Alcântara (Paranaíta), já falecido; Isolete Corrêa (Brasnorte); Silda Kochemborger (Apiacás); Ilson Matinscke (Santa Rita do Trivelato), já falecido; José Miguel (Rio Branco); Roque Carrara (Nova Santa Helena); Antonio Gonçalo Della Rosa  (Nova Bandeirantes e muitos outros.

 

Resumo

 

Abicalil é o nome mais em evidência no PT para disputar a eleição suplementar ao Senado. Isso, por conta da desistência dos outros dois companheiros, que também poderiam concorrer: Ságuas Moraes e Lúdio Cabral. Ságuas foi prefeito de Juína, deputado estadual, secretário de Estado de Educação e deputado federal; deixou a política para se dedicar à medicina. Lúdio foi vereador por Cuiabá, disputou o governo, é deputado estadual, mas estaria se preservando por acreditar que tem chances de vencer a eleição para prefeito da capital, em outubro.

No PT há outro nome, a deputada federal Rosa Neide, que foi vereadora por Diamantino e secretária de Educação do governador Silval Barbosa. Rosa Neide recentemente esteve  no centro de um escândalo sobre supostos crimes de colarinho branco na Secretaria de Estado de Educação, mas em setembro do ano passado, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu um mandado de busca e apreensão em sua casa e travou o inquérito da Delegacia Fazendária de Mato Grosso (Defaz), contra a deputada, que era investigada pela Operação Fake Delivery.

O Supremo Tribunal Federal (STF) acatou o pedido da mesa diretora da Câmara Federal e suspendeu a ordem de busca e apreensão da Delegacia Fazendária de Mato Grosso (Defaz) contra a deputada federal Rosa Neide (PT), no bojo da Fake Delivery, realizada em 19 de agosto.

 

PS – Esse é o décimo quarto capítulo da série U

M NOME AO SENADO. Leiam os anteriores:

1 – UM NOME AO SENADO: Sirlei Theis

2 – UM NOME AO SENADO: Waldir Caldas

3 – UM NOME AO SENADO – Neri Geller

4 – UM NOME AO SENADO – Nilson Leitão

5 – UM NOME AO SENADO – José Medeiros

6 – UM NOME AO SENADO – Maria Lúcia

7 – UM NOME AO SENADO – Carlos Fávaro

8 – UM NOME AO SENADO – Gisela Simona

9 – UM NOME AO SENADO – Max Russi

10 – UM NOME AO SENADO – Adilton Sachetti

11 – UM NOME AO SENADO – Carlos Bezerra

12 – UM NOME DO SENADO – Procurador Mauro – PSOL

13 – UM NOME AO SENADO – Blairo Maggi

Continuem acompanhando a série – única postagem que focaliza os virtuais candidatos ao Senado na eleição suplementar em abril.

Eduardo Gomes de Andrade – Editor de blogdoeduardogomes

FOTOS:

1 – Agência Senado

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