Água Velva
Roberto Campos afirmou que a velhice é uma lanterna na poupa que ilumina para trás. Quando se é jovem não se tem a dimensão da velhice, até por que os jovens acham que não ficarão velhos com todos os seus percalços e suas limitações. E aqui me valho do nosso maior escritor, Machado de Assis, que afirmou no seu romance Memorial de Aires – “A vida, mormente para os velhos, é ofício penoso”. Entretanto, é preciso achar alguma graça na velhice que não sejam os clichês surrados, louvando-a, como se ela tivesse muita serventia. Uma das suas utilidades dos velhos é dar conselhos que ninguém quer ouvir e cultuar o passado. E lá vai mais uma história!… E no meu tempo….
Não se envelhece impunemente. O passado persegue os velhos que não têm mais e melhores perspectivavas de futuro. E isso, com certeza, prosseguirá nos jovens que também ficarão velhos. Deixe estar, meus caros: a batata de vocês está assando! Fiquemos com os velhos, com suas poucas alegrias, dores, seu desamparo, seu abandono e sua inutilidade. E vamos recordar, por que recordar é viver. Um amigo outro dia me perguntou se eu me lembrava de Água Velva. Eu me lembrei do meu pai. Eu achava delicioso quando ele, após barbear-se e cauterizar a barba com Água Velva, saía pela casa, exalando a fragrância refrescante de tal pós-barba.
São dessa época os aromas intensos dos sabonetes Gessy, Lifeboy, Phebo e Vale Quanto Pesa. E dos perfumes Lancaster e Rastro que vinha com uma rolha. E das Lavandas e das suaves Águas de Colônia, e talcos usados como desodorante. Do leite de rosas e do leite de colônia de uma embalagem verde. Um dos talcos e a água de colônia eram emblemáticos: Cashimere Bouquet…. O pó de arroz….. Neutrox…. Trin….Pomada Minancora… E da inefável Brilhantina Glostora que modelavam e deixavam os cabelos brilhantes. Enfim, um mundo de suaves e inesquecíveis fragrâncias que até hoje povoam a minha mente e estão impregnados nas memórias de todos os meus contemporâneos.
Quantas gratas lembranças que me dão um nó na garganta! A passagem inexorável do tempo liquida infelizmente com tudo. O que fomos, somos e recordamos vão conosco para o túmulo. De nós restará apenas uma tênue lembrança, enquanto viverem alguns dos nossos contemporâneos. Entretanto, chega de saudades e de piegas louvações! Vou encerrar este texto, com um poema original, em tributo aos jovens que são o futuro do mundo. Para tanto, presto uma homenagem a Lupicínio Rodrigues, cuja genialidade concebeu essa pérola, onde informa aos moços que o amor nem a tudo conduz:
Esses moços (Pobres moços)
Esses moços Saibam que deixam o céu por ser
Pobres moços escuro
Ah! Se soubessem o que eu sei E vão ao inferno a procura de luz
Não amavam, Eu também tive os meus belos dias
Não passavam, Essa mania que muito me custou
Aquilo que eu já passei, Pois só as mágoas que trago hoje em
Por meus olhos, por meus sonhos, dia
Por meu sangue, tudo enfim, Essas rugas que o amor me deixou
É que eu peço, …………………………………………………
A esses moços, Por meu sangue, tudo enfim
Que acreditem em mim. É que eu peço
Se eles julgam A esses moços
Que há um lindo futuro Que acreditem em mim,
Só o amor nesta vida conduz,
Renato Gomes Nery – advogado em Cuiabá e ex-presidente da OAB/MT
rgnery@terra.com.br
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