Série TRANSPARÊNCIA (07) – O dedo de Kassab
Diante do espelho Carlos Fávaro via refletida a fisionomia de Pedro Taques e vice-versa. Em três anos e três meses de governo os dois se completaram, se fundiram e se confundiram. Porém, pelas linhas tortas da política cada um tomou seu rumo e eles poderão subir em palanques opostos – pode até ser que isso aconteça, mas nem assim estarão afastados um do outro, pois há algo em comum, muito forte, que os move e que não pode ser desconsiderado enquanto capital eleitoral: as viúvas políticas de Riva, que se dividem no grupo liderado por Fávaro e a situação chefiada por Taques. Portanto, coligação à parte, a imagem refletida será sempre a mesma, ainda que quebrem o espelho. Isso, levando-se em conta o cenário de momento, pois para Fávaro tudo pode virar de cabeça para baixo se Gilberto Kassab ao menos imaginar que seu projeto de poder corre risco no abençoado e ensolarado Mato Grosso.
Fávaro é estreante em política. Em 2014 compôs a chapa de Taques (PDT) ao governo enquanto candidato a vice-governador pelo PP. Analistas entendem que seu nome nada somou à vitória do governador. É como diz o ditado popular, “vice não precisa somar; basta não atrapalhar” e Fávaro não atrapalhou, pois nem conhecido em Mato Grosso afora era. Quem votou em Taques levou seu companheiro de lambuja.
Com discurso sempre afiado em defesa de Taques, Fávaro permaneceu no governo e durante 19 meses foi secretário de Meio Ambiente na polêmica Sema. De repetente renunciou ao cargo e foi o primeiro vice-governador brasileiro a fazê-lo. A justificativa? A razão apresentada foi descontentamento com o modo de governar e isso ele quis mostrar a Mato Grosso ao assinar e divulgar em 24 de abril deste ano a Carta de Cuiabá, de ex-apoiadores de Taques, na qual assumiu seu lado de opositor democrático. Taques perdeu o vice, que desde 28 de setembro de 2015 estava no PDS e o presidindo a convite do ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab, seu líder nacional.
O partido de Fávaro reúne o núcleo duro do ex-deputado estadual José Riva, que durante 20 anos controlou a Assembleia e deu as cartas no governo. Sua presidência no PSD acaba de ser ratificada em candidatura única e por unanimidade para novo mandato na Executiva Provisória Estadual. Kassab encontrou em Fávaro a figura indicada para presidir o PSD em Mato Grosso, uma vez que Riva caiu em desgraça e recebeu condenações em primeira instância. Riva, seu benemérito no Estado, foi decisivo na sua fundação nacional, pela quantidade de filiação que lhe assegurou, mas à época o presidente era o então vice-governador Chico Daltro. Antes, Fávaro estava no PP, partido insosso. O ministro viu nele uma liderança emergente, pelo mandato de vice-governador que começava a cumprir, por sua juventude e a necessidade que os deputados, prefeitos e vereadores que gravitavam na sombra de Riva tinham para encontrem alguém que passasse a lidera-los.
Abençoado por Kassab, Fávaro ficou à frente de uma sigla com expressiva bancada estadual, mas que deixou de contar com a deputada estadual Janaína Riva, filha de Riva; Janaína assinou ficha de filiação ao MDB do cacique Carlos Bezerra. Mesmo carne e unha com Taques, Fávaro não confiaria nele e a recíproca seria verdadeira – espelho à parte, fontes seguras garantem isso – e não poderia deixar de ser, porque confiar não é verbo conjugado pelo governador. Fávaro sabia que Taques não queria repetir a chapa de 2014 e seu sonho era – continua sendo – o mandato de senador. Acontece que a candidatura ao governo exige um leque de entendimento com os partidos coligados. Taques tinha – continua assim – os olhos voltados para o deputado federal tucano Nilson Leitão, de Sinop, e o líder do DEM, Jayme Campos, de Várzea Grande, para montar as duas cabeças de chapa ao Senado. Quanto ao nome para vice, uma possibilidade é que ele seja Neuma Moraes, mulher do prefeito de Rondonópolis, Zé Carlos do Pátio (Solidariedade).Continuando vice-governador Fávaro estaria com o bota-fora armado por Taques e ele precisava se enquadrar à exigência da legislação eleitoral. Numa rasteira política Taques poderia sair do Brasil e ele automaticamente seria governador, e caso isso acontecesse no período em que o exercício de tal cargo derrubasse sua elegibilidade ao Senado, a vaca iria para o brejo. Por isso, e antes que ficasse exposto ao fogo amigo de Taques, jogou a toalha. Dentro do calendário eleitoral e sem o peso da vice-governadoria Fávaro entrou na lista dos pré-candidatos ao Senado acenando para o senador republicano Wellington Fagundes, virtual candidato a governador pelo PR coligado com o MDB, PTB, PCdoB, PSD e outros partidos. Junto a Taques a chance de sua candidatura seria zero. Sonhar com a possibilidade de coligação com o PDT de Otaviano Pivetta não passaria de pesadelo. Afinal, os dois não dividem o mesmo espaço, por razão política em Lucas do Rio Verde, onde residem. O quê da questão na alternativa que resta a Fávaro: Wellington tem uma demanda para senador maior que o número possível de vagas de candidaturas: a ex-reitora da UFMT Maria Lúcia (PCdoB), a empresária Margareth Buzetti (PP) e Fávaro. Seu futuro político está muito nebuloso.Caso seja candidato na coligação com Wellington, Fávaro terá pela frente a força parlamentar estadual do PSD, pois os deputados Gilmar Fabris, Nininho, Pedro Satélite e Wagner Ramos rezam pela cartilha de Taques e não se desgrudam de sua base de sustentação na Assembleia – basicamente a mesma que sustentou o ex-governador Silval Barbosa; esse quarteto tem ascendência sobre a maioria dos 188 vereadores do partido, pulverizados nos municípios e que coabitam seus gabinetes em busca de favores, de reivindicações as mais diversas e até mesmo em defesa de cargos de parentes e protegidos no governo. Na Assembleia seu único apoio partidário poderá ser o de José Domingos Fraga, que desistiu de disputar mandato depois que um vídeo exibido na TV Globo mostrou uma cena deplorável com ele – e outros deputados – recebendo dinheiro, que Silval e seu então chefe de Gabinete, Sílvio Corrêa afirmaram em delação premiada homologada pelo ministro do Supremo, Luiz Fux, que se tratava de mensalinho. Vale observar que os cinco deputados do PSD atravessam momento de desgaste político. Todos respondem ou a ações judiciais, ou inquéritos, ou sofrem algum tipo de denúncia por improbidade administrativa. Recentemente Gilmar Fabris foi preso por obstrução de justiça. A Operação Bereré do Detran, o último escândalo que abalou a Assembleia, não excluiu integrantes da bancada do PSD, pois Nininho e José Domingos estão entre os acusados. Sival relacionou Wagner Ramos e José Domingos entre os parlamentares da legislatura anterior, que teriam recebido mensalinho para fazerem vistas grossas ao seu governo. Em outro suposto mensalinho, esse pago por Riva entre 2005 e 2009, estão os nomes de José Domingos, Wagner Ramos, Gilmar Fabris e Pedro Satélite – Nininho, o único ausente da lista, à época não era deputado.Mesmo sem os deputados, Fávaro tem força no PSD, pois a maioria dos seus 25 prefeitos e dos 18 vice-prefeitos acompanha orientação do presidente da associação dos prefeitos (AMM), Neurilan Fraga, que sente urticária ao ouvir o nome do governador.
Produtor rural, Carlos Henrique Baqueta Fávaro, 48 anos, nasceu no Paraná e tem domicílio em Lucas do Rio Verde. Sua escolha para compor a chapa de Taques em 2014 colheu Mato Grosso de surpresa, pois até então era conhecido apenas nos meios classistas da cadeia da soja, já que presidia a Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja) regional. Seu nome teria sido sugerido pelo empresário Eraí Maggi, que recebeu convite para disputar o cargo, mas o recusou.
A liderança de Fávaro junto ao setor onde milita empresarialmente foi testada após sua chegada ao poder juntamente com Taques. Em 09 de novembro de 2015, tanto ele quanto o governador abraçaram a candidatura de Vanderley Reck Júnior para a presidência da Aprosoja em substituição a Ricardo Tomczyk, e Reck Júnior foi vencido por Endrigo Dalcin, por 1.531 votos a 885. Em baixa junto aos associados da Aprosoja, com as viúvas políticas de Riva divididas e concorrendo contra o grupo de Taques, ao qual integrou e serviu com o mais largo sorriso de realização, Fávaro não tem candidatura ao Senado assegurada e sua situação poderá se complicar dependendo da evolução do quadro, com Kassab entrando em cena. Caso a consiga precisará de muita habilidade e jogo de cintura para explicar sua demora em descobrir em Taques os defeitos que o levaram ao rompimento. Ou como diriam os ambientalistas – fazendo trocadilho com o cargo de secretário de Fávaro na Sema – ele terá que passar o correntão na memória coletiva.
O dedo de Kassab
Política não é ciência exata e Kassab sabe muito bem disso. A ele pouco interessa o resultado das eleições ao governo e Assembleia em Mato Grosso. Tudo que quer é força no Congresso. Seu primeiro projeto estava voltado para a tentativa de se eleger Neurilan Fraga deputado federal, mas Neurilan recuou optando por permanecer na presidência da AMM. Sem Neurilan, Kassab passou a apostar em Carlos Fávaro, mas o ministro não é bobo nem nada e tem a frieza de jogador de pôquer. Fávaro disputando o Senado com Jayme Campos (DEM), Nilson Leitão (PSDB), Selma Rosane (PSL) e José Medeiros (Podemos) – avaliam analistas – teria pouca chance de vitória. Nesse quadro, resta a Kassab botar lenha na fogueira dos deputados estaduais para que esses fechem questão com o empresário Roberto Dorner e vistam sua camisa para deputado federal. Assim, o PSD poderia entrar somente nas disputas proporcionais juntando a juventude do vice-prefeito de Cuiabá, Niuan Sobrinho, à sua bancada ora capenga perante a opinião pública, mas nem por isso desanimada de correr atrás de votos. Com Dorner reunindo chances de se eleger, Kassab não mudaria de cor para destituir Fávaro da presidência, recompor a Executiva Estadual do PSD, abrir mão da disputa ao Senado e jogar seu partido no colo de Taques. Isso não pode ser visto como utopia. Recentemente, Roberto Freire, o cacique nacional do PPS, decretou a dissolução de sua Comissão Provisória em Mato Grosso mandado para as favas o presidente Percival Muniz e entregando sua direção a Marco Marrafon, então secretário de Educação de Taques. Roberto Freire e Kassab quando se olham no espelho se deparam com dois irmãos gêmeos politicamente. Detalhe é que não há termos comparativo entre o histórico político de Percival e o de Fávaro.
O dedo de Kassab apontará o caminho para Fávaro.
Eduardo Gomes/blogdoeduardogomes
FOTOS:
1 – Arquivo/GCom
2 – Demóstenes Milhomem
SÉRIE
TRANSPARÊNCIA postou sete capítulos. Os seis anteriores podem ser acessados em:
1 – PPP Caipira nasce da ousadia de Pivetta
2 – Suplente de última hora chega ao Senado
3 – Riva mesmo caido derrota Taques
4 – Páginas da vida
5 – Leitão, o único preso entre os pré-candidatos ao Senado e governo
6 – Carona na Arca de Noé
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